quarta-feira, 16 de novembro de 2022

BAIXE O E-BOOK GRÁTIS: I TOMO DAS BRUXAS: DO VENTRE À VIDA

 


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Arte do card: Patrícia Cacau 


BAIXE O E-BOOK GRÁTIS: I TOMO DAS BRUXAS: DO VENTRE À VIDA

Por Marta Cortezão

O Projeto Enluaradas, neste dia festivo de 15 de novembro de 2022, congratula-se com todas as autoras poetas pela publicação da Coletânea Enluaradas III: I Tomo das Bruxas – do Ventre à Vida, em versão e-book, fechando assim esta trilogia iniciada com a Coletânea Enluaradas I: Se Essa Lua Fosse Nossa (Ser MulherArte Editorial, 2021) e seguida pela Coletânea II: uma Ciranda de Deusas (Sarasvati Editora, 2021). A versão do livro físico já foi encaminhada via correios a todas as autoras participantes. Temos os lançamentos presenciais confirmados na Bienal Internacional do Livro do Ceará, 18/NOV/2022, às 15h e no 5º Encontro Nacional do Mulherio das Letras – João Pessoa/PB, 25 de novembro, às 19h30, na Usina Cultural Energisa – Tenda 3.

 



DO PERCURSO RUMO A UMA LUA TODA NOSSA

A abertura do edital da Coletânea Enluaradas I: Se Essa Lua Fosse Nossa aconteceu em 01/01/2021. Naquele momento em que vivíamos uma assustadora pandemia, recebemos uma expressiva adesão de escritoras/poetas. Foram mais de 200 (duzentas) inscrições, das quais 168 (cento e sessenta e oito) foram selecionadas para compor o livro digital. O e-book possui temática livre, mas faz reverência à força da Deusa Selene, essa “lua toda nossa”, uma metáfora-lugar que desenhamos, juntamente com as autoras enluaradas, neste espaço poético-virtual que aninhou as angústias do nosso mundo real. Esta primeira coletânea teve lançamento virtual no dia 21/04, quarta-feira, via canal do YouTube Banzeiro Conexões, às 17h30m (BSB), com a participação de autoras via depoimentos gravados que foram ao ar, em transmissão ao vivo, com muita música e muita poesia:

Elizabete Nascimento: [...] A “Coletânea enluaradas” apresenta a escrita poética de várias mulheres escritoras de diversos países e, que, na maioria das vezes, não têm a oportunidade de publicação. Então, no meu olhar, o projeto se constitui como um exercício de travessia e tem como foco a efetiva ação, vamos dizer assim, implícita, do vocábulo sororidade. Então compreendo que, ao nos dá as mãos, especialmente no cenário contemporâneo, nós provocamos algumas rupturas no sistema, nos tornamos mais fortes e exercemos alguns princípios éticos e estéticos que fazem o ser e o estar no mundo com os outros ou com as outras coisas do mundo. E com isso, nos tornamos, de certa forma, juntas, a ponte, a água, a luz rumo a um mundo, a uma sociedade com equidade, porque “Juntas somos as Enluaradas”!

Eunice Tomé: [...] Uma lua jogou sua luz sobre minha cabeça/ em tempos que não julgávamos possível olhar para o céu e contemplar os astros. Uma mutação aconteceu e foi por esta inspiração que me fez escrever poesia e acreditar que a beleza não se esconde nas nuvens e vendavais por mais que estejamos cegos e descrentes. Na adesão de revisitar a lua, partindo de uma centena e mais de outras vozes femininas, o universo se abriu e deixou entrar uma força vulcânica em gritos de amor e de sublimação. Passei a contemplar a lua e suas estações em noites de insônia e aprender com ela os gestos divinos. Foi assim que surgiu em mim o “Projeto Enluaradas” e julgo que a forma livre e aberta de tantas vertentes literárias encontrou um espaço sem fim no céu com outras tantas estrelas de muita luz. Que venham outras coletâneas tão bem organizadas e coordenadas por suas idealizadoras. Juntas somos as Enluaradas!

Daiana Pasquim: [...] Estou me sentindo extremamente feliz porque a Coletânea Enluaradas me inaugurou no útero das poesias [...] Essa coletânea significa um entrelaçamento, um “congressamento” com as mulheres, as lobas, as inspiradas pela lua. São mulheres do mundo inteiro. Juntas Somos as Enluaradas!

Roberta Gasparotto: […] para mim, ter participado da Coletânea Enluaradas 2021, foi um respiro, um refresco em meio a tantas notícias tristes que a gente vem recebendo diariamente e, em meio a tanto sofrimento que o mundo, de uma maneira geral e o Brasil em particular, estão passando nesse momento. E até [...] pela temática da lua, pela magia da lua e, principalmente, pelo projeto de vanguarda que a Marta Cortezão e a Patrícia Cacau, que são as idealizadoras do projeto. Elas tiveram a sensibilidade de fazer um projeto que, além de uma coletânea de poemas de mulheres, que ficou lindo, a coletânea ficou maravilhosa! – elas também fizeram lives com cada uma das participantes que quiseram participar [...]. Então, assim, a Patrícia e a Marta, elas colocaram em prática uma palavra que hoje em dia é muito usada, mas que a gente não coloca tanto em prática quanto a gente usa essa palavra, que é sororidade. Então assim, é um projeto belíssimo, conheci mulheres maravilhosas, porque tive a grande alegria de além de participar da live enquanto escritora, participar também entrevistando essas mulheres maravilhosas. E estou muito feliz [...]. gratidão, Marta e Patrícia. Juntas somos as enluaradas!

Edna Almeida: [...] O projeto Enluaradas foi sedutor [...] foi inclusivo, foi libertador, foi verbalizar, um resgate da poesia feminina e o e-book ele vem assim num cenário literário contemporâneo com um grande presente pra humanidade, uma grande lição de amor e altruísmo, uma alavanca de leitura, onde o sexto sentido se multiplica. Estou ainda vivendo essa ciranda das enluaradas. Se, enquanto as bombas caiam, na 2ª guerra mundial, os franceses faziam amor; na pandemia, nós fazíamos lives poéticas. Juntas somos as Enluaradas!

Rita Queiroz: [...] Participar do Projeto Enluaradas “Se Essa Lua Fosse Nossa” foi um presente nos dado por Marta Cortezão e Patrícia Cacau. Eu já acompanho o projeto desde o final do ano passado, quando foi lançado no Facebook com aquelas lives das enluaradas, eu sempre acompanhei, sempre me deliciei muito com as lives. E quando a Marta e a Patrícia lançaram a coletânea, em janeiro, eu [...] já mandei mensagem no Instagram dizendo “eu quero participar” [...] porque é um projeto que agrega, que agregou e que vai agregar mais e mais. E um projeto que se diferencia dos outros projetos porque houve um entrelaçamento entre essas enluaradas. As enluaradas se conheceram, se integraram e, a partir desse projeto, outros projetos estão surgindo. Então foi uma grande satisfação participar desse projeto e apostar nesse projeto e acreditar no projeto e, querendo já o número 2, número 3, número 4, infinitamente porque Somos Enluaradas!

Tainá Oliveira: [...] Eu tenho muito orgulho de dizer que sou uma das 168 autoras que fazem parte da coletânea “Se Essa Lua Fosse Nossa”. Um projeto muito especial, um projeto que na minha vida em particular, foi um divisor de águas porque é a primeira vez que meus poemas saem lá da pastinha da criatividade e levantam voo e vão ganhar o mundo aí afora. Então eu tenho muito orgulho de fazer parte dessa Coletânea [...] Gosto de frisar que ela é um afago na nossa alma, em período ainda de pandemia, tão complexo, mas poder fazer conexão com outras escritoras, com outras mulheres que dividem o mesmo sonho [...] foi maravilhoso, foi uma experiência incrível. E creio que ele (o projeto) é um marco também para nossa literatura nacional porque está abrindo portas para novas escritoras, para novas obras. Então eu vejo muita importância nele, no cenário literário e é uma honra fazer parte disso tudo e poder dizer “Juntas somos as Enluaradas!”

Vânia Perciani: O que dizer sobre o Movimento Enluaradas? Vamos dar a palavra para as idealizadoras, as fomentadoras do projeto, desse processo de escrita feminina. Marta Cortezão, num comentário muito interessante “ser casulo para entender-se. Ser lagarta para saber-se [...] ser borboleta para voar livre”. E Patrícia Cacau complementa “Se meter no caminho incerto [...] a alma livre com botas novas, com coragem, com fé para criar um mundo novo”. Quais de nós, mulheres, poetas e escritoras, não temos essas vozes chacoalhando, gritando em nosso coração? Queremos espaços nas prateleiras das bibliotecas, queremos ser lidas, queremos ser ouvidas. Esse é o desafio e essa é a promessa que permeia a coletânea que nós fizemos. “Coletânea Enluaradas Se Essa Lua Fosse Nossa”, essa lua está se tornando nossa. Quando uma loba uiva para a lua, a alcateia responde a uma só voz: Juntas Somos as Enluaradas!

Rosangela Marquezi: [...] ter participado do Projeto Enluaradas, organizado pela Marta e pela Patrícia, as quais agradeço de coração, foi para mim uma mistura de emoções à flor da pele, de alegria de sentimento e coletividade, de luta por igualdade e, principalmente, oportunidade de soltar a minha própria voz. Vejo o “Projeto Enluaradas” como um fortalecimento coletivo de mulheres que precisam ser mais ouvidas, mais lidas e mais vistas. A poesia ela não se constrói somente a partir dos cânones, ela também se faz a partir de pequenas manifestações diárias poéticas em que muitas vozes se unem e se tornam potência. É isso: Juntas somos as Enluaradas!

Stéphanie Gomes: [...] Sou uma das 168 participantes da “Coletânea Enluaradas Se Essa Lua Fosse Nossa”, uma coletânea maravilhosa idealizada pela Marta Cortezão e pela Patrícia Cacau. Então assim, gente, me sinto muito lisonjeada por estar fazendo parte dessa Coletânea junto com todas essas mulheres aí, magníficas que também integram [...] esse elenco [...] Eu acredito que quando nós temos algo dentro de nós que é bom, nosso dever é partilhar, compartilhar com outras pessoas e eu acredito sim e espero que essa coletânea alcance muitas pessoas. Agora imagina aí você lê uma coletânea com 168 cabeças pensantes, diferentes; cada mulher dessa mostrando, através da poesia, as suas ideias, a sua visão (de mundo). Será que essa lua pode ser só minha? Ou pode ser só sua? Pode ser nossa, essa lua é nossa, até porque Somos todas Enluaradas!

Ale Heidenreich: Hoje eu estou aqui, nesse dia tão especial para nós, o encerramento da nossa “Coletânea Enluaradas” e quero aproveitar e falar da importância da nossa coletânea no cenário literário contemporâneo. A nossa coletânea, ela veio como um marco, ela chegou resgatando, auxiliando, dando apoio a muitas mulheres, resgatando suas identidades ou até talvez (revelando) uma identidade nova para muitas delas. Ela veio acolhendo mulheres de todas as classes de nossa sociedade, escritoras e não escritoras. Ela veio humana, ela veio inovadora, ela veio divertida e é isso que a gente deve levar. E vai ficar pra mim, pra minha vida. Tenho a influência de muitas de vocês. Nossa querida Frida Kahlo, ela diz “onde não puderes amar, não te demores”, eu quero ficar aqui, aqui está bom demais, infelizmente eu sei que não dá, mas a gente vai se encontrar em outras coletâneas, em outros projetos. Então fica aqui meu agradecimento, de todo o coração, Patrícia Cacau, Marta Cortezão e cada uma de vocês.

Missandra Almeida: [...] E a antologia Enluaradas, pra mim, é um ajuntamento de mulheres maravilhosas, de mulheres lusófonas (e brasileiras) espalhadas pelo mundo de mãos dadas buscando e mostrando a força da mulher e da sua poesia, o encanto e todas as possibilidades de potência e de existência. E também é a possibilidade de experimentar esse lugar de publicação. Que lugar é esse? [...] Um lugar de existência, um lugar de voz, de visibilidade, mas também de acesso à leitura. Sabendo da dificuldade que nosso país tem de ofertar acesso à leitura, de valorizar a criação e a leitura como prioridade para a educação. Sabendo disso e, nesse momento, eu estar participando de uma antologia que foi oferecida ao público gratuitamente, pra mim, é extremamente especial, é muito significativo.

Janete Manacá: [...] Participar do Projeto “Se Essa Lua Fosse Nossa” foi uma oportunidade única de poder estender as mãos a mulheres de diversos lugares do planeta e mover essa ciranda encantada com palavras sábias e letras mágicas. Essa coletânea, com certeza, é um legado de amor a gerações futuras. Salve, Marta! Salve, Cacau! Vida longa às Enluaradas! Tim-tim!

Antes do lançamento da Coletânea Enluaradas I: Se Essa Lua Fosse Nossa, no encontro Enluaradas: Dia Internacional da Mulher, realizada dia 08/03/2021, via canal do Youtube Banzeiro Conexões, a saudosa amiga Enluarada Vânia Alvarez, pesquisadora, pensadora moderna, escritora e poeta paraense, afirmou, em seu discurso emocionado A poética contemporânea das Enluaradas que as autoras participantes do Projeto Enluaradas estavam “construindo a chamada Arte Contemporânea” e ela assentava as primeiras colunas sólidas deste movimento que nascia, com seu olhar observador de quem enxerga do lado de fora e de dentro, explicando o seguinte:

Não basta uma escrita definir-se como feminina, é preciso designar a fala das mulheres. Colocar-se no lugar do feminino, requer uma posição que implica ver-se no outro. E esse “ver-se no outro” vai construir esse projeto de contemporaneidade, uma contemporaneidade ocidental, racional, evolutiva e disjuntiva. 

Para Vânia Alvarez, o Enluaradas se define como este coletivo de reflexo, não apenas o que se reflete a si mesmo, aquele eu solitário, mas o que em si vê a imagem da outra se refletindo e a que, olhando para a outra, vê o próprio reflexo de si. É a humana conjugação da ação de outrar-se. A alma de Vânia Alvarez, poeta humanamente visionária, enxergou a fina essência que fortalece este projeto – formado por mulheres de luta que resistem pela força da palavra –, afirmando que somos

poetas engajadas ao contemporâneo, que falam por si e que reinterpretam as muitas vozes [...] e a lua aparece influenciando o sentimental [...] Somos mulheres, somos enluaradas, somos um projeto contemporâneo vitorioso, porque “água mole em pedra dura tanto bate até que fura” e nós, mulheres, furamos o cerco [...] porque somos um coletivo, já não estamos sós e estamos apenas no começo.

(“A poética contemporânea das enluaradas”, 08/03/2021)

O curioso deste projeto foi que ele teve início como uma simples chamada para uma coletânea e, no decorrer do processo, se constituiu num movimento agregador, literário e poético denominado “Enluaradas”. Hoje, para além de continuarmos nos designando Projeto Enluaradas, somos um coletivo feminino que vem vingando por causa da participação e da interatividade das autoras que o integram. Somos uma rede de apoio que tem dado muitos frutos, resultando em parcerias entre as próprias autoras Enluaradas, que vêm revolucionando, de forma particular e poética, o mundo da escrita de cada umas das participantes através de parcerias, de participação em outras coletâneas, entrevistas e eventos literários e, principalmente, muitas autoras nos têm falado do quanto este movimento foi importante para estimular a escrita, que estava há bastante tempo estacionada. Conjugamos o verbo ESCUTAR em todas as suas modalidades de vida nas “Enluaradas Live” (ações da primeira coletânea) que realizamos, onde as participantes da coletânea contavam de seus projetos literários, enquanto uma ciranda de mulheres, nossa “egrégora lunar”, comentava, aplaudia e se via refletida de alguma maneira em cada discurso. E, naquele momento, passaram por lá (@enluaradas2022) cento e vinte (120) autoras falando sobre sua trajetória literária, de seus medos, de seus sonhos e da alegria de fazer parte do Projeto Enluaradas. Um espaço "lunar" que abraça, praticando a escuta e a sororidade.


DAS MÃOS QUE SE UNEM PARA UMA CIRANDA DE DEUSAS

Na Coletânea II: uma Ciranda de Deusas, cujo edital foi lançado dia 21/05, numa sexta-feira de muitas expectativas, iniciamos várias ações dentro do projeto, como: Ciranda de Deusas, que foram lives realizadas, em diferentes dias da semana, tanto pela plataforma do Instagram quanto pelo canal Youtube Banzeiro Conexões, e que consistia em leituras poéticas através das quais divulgamos a literatura lusófona de mulheres de estados brasileiros e países estrangeiros. No total, foram 26 (vinte e seis) encontros (Cirandas de Deusas) realizados: 14 (catorze) via plataforma Instagram, 04 deles, em parceria com o Mulherio das Letras, a convite de Silvia Schmidt, no perfil @livrariamulherio; 11 (onze) via canal Banzeiro Conexões. Tivemos também o quadro Nas Teias do Poema, com a realização de 14 (catorze) episódios, nos quais as autoras participantes da Coletânea Enluaradas II: uma Ciranda de Deusas apresentavam poemas de sua produção autoral para falar sobre o processo criativo literário e das “teias” que envolvem esse processo do “fazer poético”. Todos os episódios do “Nas Teias do Poema” eram acompanhados de uma publicação prévia para fomentar o pensamento sobre a práxis do fazer literário do poema que antecedia cada encontro. Relaciono os links dos episódios caso haja interesse para rememorar nossas leituras:

1º) Nas Teias do poema I: CARNE E TECIDO POÉTICOSAnna Liz, Artane Inarde e Maria Alice Bragança;

2º) Nas Teias do poema II: DAS ESCREVIVÊNCIAS QUE NOS HABITAM - Ale Heidenreich, Aline Galvão e Vania Clares;

3º) Nas Teias do poema III: O (IN)CORPÓREO DA PALAVRAAdriana Teixeira, Cris Mesquita e Janete Manacá;

4º) Nas Teias do poema IV: ENTRE FIOS E METÁFORASHeliene Rosa, Isa Corgosinho e Lucila Bonina;

5º) Nas Teias do poema V: NOS FIOS DA 'ALQUIMIA DO VERBO'Dani Espíndola, Elizabete Nascimento e Maria da Paz Farias;

6º) Nas Teias do poema VI: DOS MATIZES DA LINGUAGEMLindevania Martins, Malu Baumgarten e Raquel Basilone;

7º) Nas Teias do poema VII: TECENDO EPIFANIAS POÉTICASBelise Campos, Carolina Ferreira, Flavia Ferrari e Jéssica Iancoski;

8º) Nas Teias do poema VIII: ENTRE PERCEPÇAO E MEMÓRIAMaria do Carmo Silva, Marta Cortezão e Patrícia Cacau;

9º) Nas Teias do poema IX: NO MEIO DO POEMA, O(A) LEITOR(A)Margarida Montejano, Rita Queiroz e Rosangela Marquezi;

10º) Nas Teias do poema X: NÃO SOMOS AS MESMAS DE ONTEMElisa Lago, Hydelvídia Cavalcante e Tânia Alves;

11º) Nas Teias do poema XI: INDOMÁVEL E EFÊMERA CRIAÇÃO DO BICHO-POEMAAna Mendes, Cris Arantes e Heloisa Helena Garcia;

12º) Nas Teias do poema XII: UMA LITERATURA ENGAJADACátia Castilho Simon, Frahm Torres e Marina Marino;

13º) Nas Teias do poema XIII: DA FORÇA PERENE DA PALAVRAJoelma Queiroz, Glafira Menezes Corti e Valéria Pisauro;

14º) Nas Teias do poema XIV: ENLUARADAS E A POÉTICA DO ESPAÇOCarla Sà De Morais, Neli Germano e Patrícia Cacau.

Tanto as ações literárias Ciranda de Deusas quanto o Nas Teias do Poema foram divulgadas pelo blog Feminário Conexões através de textos e comentários que foram/vão construindo o itinerário literário e histórico do Projeto Enluaradas, que só tem razão de ser graças à participação de todas as poetas Enluaradas que somam conosco na realização e construção desta Literatura Contemporânea Enluaradas. Lembramos também dos artigos literários das autoras Isa Corgosinho, Carla De Sà MoraisElizabete Nascimento (texto 1 e texto 2) e Margarida Montejano sobre as ações do projeto também publicados neste blog. Outro evento significativo para o projeto foi o 1º FLENLUA (Festival Literário Enluaradas), realizado nos dias 03, 04 e 05 de dezembro, com a participação da maioria das 87 (oitenta e sete) autoras/poetas. Transcrevo aqui alguns fragmentos das falas que bem ilustram o primeiro festival literário e que vale muito a pena tê-los em conta:

“trazer cada vez mais mulheres para a escrita, para a publicação, segurar na mão, cirandar [...] é parte bastante importante da militância feminista que, para mim, é uma forma de estar no mundo [...] A nossa situação como mulheres é complexa (digamos assim, para não dizer triste), no mundo inteiro. Todo o espaço que a gente tem é um espaço ganho, é lutado, nada nos é dado e nada continua a não ser pela nossa luta. [...] Este é meu lugar de mulher, é o lugar de todas as mulheres. Quem não for feminista que não use calça comprida, que devolva o passaporte, que devolva a carteira de motorista, que não vote, porque tudo é fruto desta luta.”

{Maria Alice Bragança (RS), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“O que eu percebo nesse grande movimento, em que as mulheres, sobretudo nesse processo criativo da literatura, das artes, é essa necessidade de se colocar mesmo como protagonistas. Eu percebo neste projeto essas dimensões muito atadas, muito “dialogizadas”, que é a questão do estético, dessa procura do processo criativo, inovador, constitutivo e também a questão social, ética, moral, no momento de distopias, de isolamento, de pandemia, de refluxos, de bandeiras do social.”

{Isa Corgosinho (PB), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Estou aqui para falar com que força surgiu esse movimento, porque ele já nasceu empoderado e empoderando [...] E de poetas, num estalar de dedos, nós viramos deusas, as deusas da poesia. E isso mostra o quanto o Projeto Enluaradas veio para nos fortalecer nesse meio literário, para fortalecer a nossa escrita e a nossa poética.”

{Marina Marino (SP), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Talvez a gente nem tenha noção do que é que nós estamos fazendo dentro desse coletivo, agora uma coisa eu tenho certeza, ele veio para fazer a diferença, eu não estou falando de vaidade, eu estou falando de necessidade da gente buscar sim o arquétipo dessas deusas que há muito tempo adormeceu [...] (O Projeto Enluaradas) vem com afetos, as inclusões, os acolhimentos e traz à tona a poética que nos habita. É um trabalho bem socrático, a maiêutica que reconhece que você tem dentro de você o conhecimento, só precisa de alguém para ajudar nesse parto de luz.”

{Janete Manacá (MT), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Estou muito feliz por fazer parte deste movimento [...] (que) tem levado o trabalho de todas nós, conhecidas, desconhecidas, sem distinção. Isto é realmente o que eu chamo Literatura, que é dar oportunidade a todas, não só a uma parte, como se considera a elite,”

{Ana Mendes (Suíça), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Lembrei da menina mulher que fui e quanto faria a diferença se eu tivesse encontrado mãos acolhedoras e agregadoras como nós temos agora e, para mim, não foi só um livro a mais, eu recebi a certeza de que é possível um mundo novo onde cada mulher, assumidamente poeta, entende o que é entrar numa ciranda, dar as mãos [...] dividindo a força, e todas sem medo de expor sua fragilidade e grandeza nesse universo de poesia”

{Vania Clares (SP), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Eu sinto que eu pertenço à essa família, que eu encontrei o meu lugar, poeticamente falando, e isso é tão raro hoje em dia [...] não sei se elas (Marta e Cacau) têm a dimensão da história que elas estão fazendo na arte contemporânea, mas elas estão deixando um legado pós-moderno, reunindo o que há de melhor das escritoras que compõem esta coletânea.”

{Aline Galvão (AM), Mesa 1 do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“A luta só começou; a gente já consegue votar, já consegue dirigir, já consegue escrever com nosso próprio nome, mas ainda tem muito que se lutar, e os nossos espaços vão ser ocupados por nós e pela próxima geração porque uma hora nós também seremos legado da próxima geração. [...] Não quero a literatura só para mim, eu preciso de um coletivo, eu preciso de mulheres que girem comigo, eu preciso de mulheres que tenham esse sentimento de não querer a literatura só para si, as oportunidades só para si.”

{Patrícia Cacau, Mesa 2 do FLENLUA, 04/12/2021}

 

“Esse projeto [...] me diz muito, me diz demais. Eu também me confesso não feminista, no sentido mais ativo dessa palavra, mas porque eu acho que não me foi dada essa oportunidade que eu vim a ter quando conheci esse projeto. Isso para mim representa muito”

{Dalva Lobo, Mesa 2 do FLENLUA, 04/12/2021}

 

“A palavra Ciranda tem tantos significados, assim como passagem do tempo, aquilo que vai passando, o transcurso dos dias, na ciranda dos dias. E a primeira acepção da palavra, se você vai para o dicionário [...] ciranda é uma peneira grossa que serve para joeirar, separar os materiais, as impurezas [...] Eu acho que nesta Ciranda com tantos significados, nos faz tirar as impurezas da vida, aquilo que não serve mais [...] que caia por terra”

{Rosangela Marquezi (PR), Mesa 2 do FLENLUA, 04/12/2021}

 

“Nós sabemos que exclusão é uma questão de patriarcado, segregação é uma questão de patriarcado, concentração de riqueza é uma questão de patriarcado e nós precisamos, mulheres, todas nós somos maioria, ter consciência do nosso papel. É muito importante essa consciência começar a explodir dentro de nós e nos fazer realmente participativas e transformadoras [...] Que as mulheres pensem muito, repensem, estudem, participem de lives, penetrem mesmo na discussão política tão em voga e que veio à tona com uma força muito grande depois do golpe que vivemos, para que vocês votem certo, conheçam seus candidatos, se aprofundem na política. Tudo é também uma questão política [...] A poesia é uma ferramenta de transformação [...] é uma ferramenta política.”

{Teresa Bendini (SP), Mesa 4 do FLENLUA, 04/12/2021}

 

“Eu trabalho com a temática das mulheres há mais de 20 anos [...] e me encontrar com esse projeto (Enluaradas), para mim foi assim uma luz mesmo no meu caminhar, porque essas produções coletivas de mulheres, elas oportunizam um conjunto de vozes silenciadas. Nós somos tantas mulheres que, individualmente, não conseguiríamos publicar [...] essas escritas que são revolucionárias, e aqui eu quero retomar, na minha fala, a fala de nosso amigo Sidnei que acho que foi muito propícia mesmo, toda vez que uma de nós constrói um verso, compõe um verso, grita esse verso para a humanidade, uma algema do patriarcado se quebra porque nós, mulheres, trazemos a revolução na nossa poesia, nas nossas vozes, somos nós com os nossos poemas, com a nossa sensibilidade que vamos construir um mundo mais humano.”

{Heliene Rosa (MG), Fechamento do FLENLUA, 05/12/2021}

         

QUANDO AS BRUXAS CRIAM ASAS

                Na Coletânea III: I Tomo das Bruxas – do Ventre à Vida, tivemos o edital aberto de 10 de fevereiro a 22 de maio de 2022. Não foi um tema muito bem aceito e nos custou mais trabalho e tempo de divulgação; mas graças à adesão de nossas parceiras poetas foi possível alcançar o número expressivo de 106 (cento e seis) participações. No entanto, esta possível resistência havia sido cogitada no decorrer do processo, pois sabe-se que houve um projeto de extermínio para que as mulheres comuns, campesinas, as que conheciam o saber curativo das ervas, as ditas bruxas, fossem expurgadas da sociedade, e que todos estes conceitos e parâmetros negativos, gestados pelo patriarcado, nos foram legados e absorvidos estruturalmente. O projeto editorial desta coletânea procura trazer para o centro do discurso esta história de dor, sofrimento e perseguição através da analogia à estrutura tripartida do livro Malleus Maleficarum (Martelo das Feiticeiras), escrito em 1.487, do diálogo com as autoras Michelle Perrot (filósofa), Maria Teresa Horta (escritora, poeta), Clarissa Pinkola Estés (psicóloga) e de todo “um compêndio poético de subjetividades e vivências, tecido pela historicidade, ativismo e progressiva visibilidade das mulheres nas suas lutas e conquistas nos âmbitos público e privado” que se fazem presente no discurso poético desta coletânea.

No percurso de construção desta coletânea, realizamos, via Instagram, 22 (vinte e dois) episódios do quadro (Com)Pulsão Poética, para os quais contamos com o apoio imprescindível das poetas Enluaradas Ale Heidenreich, Carollina Costa, Lucila Bonina e Flavia Ferrari na mediação dos encontros.  O objetivo do quadro foi celebrar o poder transformador da Poesia, aquele que nos leva à realização dos sonhos, à compulsão, ao desejo de dar vazão à palavra. Esta palavra em estado de pulsão poética, que lateja, que anseia viver e sentir-se viva, esticando as asas semânticas do verbo por campos outros para desaguar em rios profundos de ardente pulsões...

Destaco aqui dois pontos importantes que marcaram a História das Mulheres pela repressão da sociedade patriarcal: a negação ao saber, eternizada na curiosidade maliciosa de Eva que nos foi herdada como 'castigo' em todos os tempos e, a partir daí, a diabolização do corpo objetificado da mulher, seu sexo insaciável propenso a vícios e às mais cruéis violências. Michelle Perrot, historiadora francesa, em seu livro Minha História das mulheres, pergunta e responde: O que querem as mulheres? Assim como Eva, elas querem morder a maçã, mas sem serem expulsas do Paraíso.

E, em pleno século XXI, continuamos perseguindo a maçã das possibilidades e o direito de permanecer no Paraíso. E este continua sendo o nosso desejo, e o fazemos com pulsão, com força poética, com a força de todos os silêncios herdados; esse é o anelo das Bruxas, eu disse 'anelo' para contrapor a 'martelo das bruxas' (Malleus Maleficarum), uma obra, escrita no século XV que justificou o assassinato, a perseguição (planejada e calculada) de bruxas e hereges durante séculos, onde encontramos afirmações como: “Eva nasceu de uma costela torta de Adão, portanto nenhuma mulher pode ser reta”. E aqui deixo mais três anelos: mulheres, pesquisemos nossa História, involucremo-nos com pautas feministas e busquemos razões para continuar a dura luta, pois o Feminismo é a grande declaração de amor que se pode fazer à Humanidade! Vamos conferir os episódios:

1º) (Com)Pulsão Poética I: Lucila Bonina Simões, Carollina Costa e Ale Heidenreich – mediação de Marta Cortezão (06/JUN/2022);

2º) (Com)Pulsão Poética II: Dilma Barrozo, Alyne Castro e Sueli Salles – mediação de Ale Heidenreich (08/JUN/2022);

3º) (Com)Pulsão Poética III: Cecília Rogers, Janine Carvalho e Simone Santos Guimarães – mediação de Lucila Bonina Simões (10/JUN/2022);

4º) (Com)Pulsão Poética IV: Giselle Pretti, Lilian Rocha e Deyse Ribeiro – mediação de Carollina Costa (12/JUN/2022);

5º) (Com)Pulsão Poética V: Verônica Oliveira, Cândida Carneiro e Magalhe Oliveira – mediação de Marta Cortezão (13/JUN/2022);

6º) (Com)Pulsão Poética VI: TidaFeliz, Amanda Pereira Santos e Rozana Gastaldi Cominal – mediação de Ale Heidenreich (15/JUN/2022);

7º) (Com)Pulsão Poética VII: Fátima Soares, Hydelvídia Cavalcante e Marina Neder Monteiro – mediação de Lucila Bonina Simões (17/JUN/2022);

8º) (Com)Pulsão Poética VIII: Valéria Pisauro – mediação de Carollina Costa (19/JUN/2022);

9º) (Com)Pulsão Poética IX: Vânia Perciani, Tati Vidal e Rita Alencar – mediação de Flavia Ferrari (20/JUN/2022);

10º) (Com)Pulsão Poética X: Amélia Costa, Helena Terra e Dorlene Macedo – mediação de Ale Heidenreich (22/JUN/2022);

11º) (Com)Pulsão Poética XI: Sandra A. Santos, Tainá Vieira e Lucirene Façanha – mediação de Lucila Bonina Simões (24/JUN/2022);

12º) (Com)Pulsão Poética XII: Célia Oliveira, Fátima Sá Sarmento e Karla Castro – mediação de Carollina Costa (26/JUN/2022);

13º) (Com)Pulsão Poética XIII: Neli Germano, Amana Assumpção e Noélia Ribeiro – mediação de Flavia Ferrari (27/JUN/2022);

14º) (Com)Pulsão Poética XIV: Malu Baumgarten e Carla De Sà Morais – mediação de Ale Heidenreich (29/JUN/2022);

15º) (Com)Pulsão Poética XV: Rilnete Melo, Lisieux Beviláqua e Érika Foresti – mediação de Lucila Bonina Simões (01/JUL/2022);

16º) (Com)Pulsão Poética XVI: Giulia Nogueira, Maria da Paz Farias e Heloisa Helena Garcia – mediação de Carollina Costa (03/JUL/2022);

17º) (Com)Pulsão Poética XVII: Cláudia V. Lopes, Sandra Santos e Adriana Bandeira – mediação de Flavia Ferrari (04/JUL/2022);

18º) (Com)Pulsão Poética XVIII: Rozana Nascimento, Cíntia Colares e Aline Leitão – mediação de Ale Heidenreich (06/JUL/2022);

19º) (Com)Pulsão Poética XIX: Wilma Amâncio, Lígia Savio e Lua Lopes – mediação de Lucila Bonina Simões (08/JUL/2022);

20º) (Com)Pulsão Poética XX: Araceli Sobreira, Patrícia Cacau e Jeane Bordignon – mediação de Carollina Costa (10/JUL/2022);

21º) (Com)Pulsão Poética XXI: Aurora Castro Mourão, Marta Cortezão e Rita Queiroz – mediação de Flavia Ferrari (11/JUL/2022);

22º) (Com)Pulsão Poética XXII: Eloísa Aragão, Chris Lafayette e Rai Albuquerque – mediação de Ale Heidenreich (13/JUL/2022);

Entretanto, não paramos apenas nestas (com)pulsões poéticas, realizamos também o quadro Caldeirão Literário, via canal do Youtube Banzeiro Conexões. Neste quadro, o objetivo foi celebrar a escrita de autoria feminina, discorrendo sobre as obras autorais das poetas, escritoras convidadas. Cada episódio abraçava uma temática para temperar o caldeirão das Bruxas. Foram 4 episódios, cujos textos eram publicados, aqui, no Feminário Conexões. Vamos a eles:

1º) Caldeirão Literário I: DAS FLORES QUE PERFUMAM O CAMINHOMaria Alice Bragança, Teresa Bendini, Clara Athayde, Cátia Castilho Simon e Dani Espíndola (11/JUN/2022);

2º) Caldeirão Literário II: DA FORÇA DOS SONHOS QUE NOS MOVEIsa Corgosinho, Margarida Montejano, Elisa Lago, Maria do Carmo Silva e Tânia Alves (18/JUN/2022);

3º) Caldeirão Literário III: DAS PULSÕES SUBVERSIVAS DA LINGUAGEMLiana Timm, Cris Mesquita, Dalva Lobo, Flavia Ferrari e Lindevania Martins (02/JUL/2022);

4º) Caldeirão Literário IV: DO PEDREGO(ZO)SO CAMINHO DA ESCRITAHeliene Rosa, Marina Marino, Patrícia Cacau, Manuela Lopes Dipp e Heliana Barriga (09/JUL/2022).

          Mas a história não acaba aqui. É apenas uma pequena pausa. Estamos escrevendo!

 

quarta-feira, 9 de novembro de 2022

LINGUAGEM DO BATOM VERMELHO, POR CAROLLINA COSTA


LINGUAGEM DO BATOM VERMELHO|14


SOBRE A VISIBILIDADE DAS ESCRITORAS NEGRAS + RESENHA DO LIVRO "O QUE É LUGAR DE FALA?" DE DJAMILA RIBEIRO


Por: Carollina Costa


Novembro mal começou e parte dos algoritmos na internet já se "mobilizaram" para aumentar a visibilidade de diversos criadores de conteúdo que falam sobre racismo e negritude. Pena que esse empenho só acontece uma vez por ano.

Vendo os anúncios, em especial de escritores e artistas, comecei a me perguntar quantos autores negros tenho na minha estante de livros e, mais ainda, quantas autoras negras. Para minha vergonha, não tantas quanto deveria. Apesar de ser brasileira e do meu país ter uma maioria da população negra, percebo que nos livros e nas artes esse grupo ainda é uma minoria, talvez nem tanto de produção, mas com certeza de alcance e divulgação. Isso me lembra uma professora de teoria literária que tive na faculdade contando sua experiência durante a palestra da famosa ativista negra estadounidense Angela Davis no Brasil.

Minha professora, assim como várias outras pessoas que foram empolgadas para ouvir a palestra de Angela Davis na conferência "A Liberdade é uma Luta Constante", não esperava que Angela exaltasse uma ativista e intelectual brasileira ao dizer "Eu acho que aprendi mais com Lélia Gonzalez do que vocês jamais aprenderão comigo" (tempo do vídeo: 51:40). Angela não entendia porquê nós no Brasil buscávamos referências negras fora do Brasil, se ela própria tinha como referência uma brasileira. E de fato buscar fora do país estudos que expliquem o nosso país e nossas questões melhor do que nossos intelectuais é, no mínimo, curioso.

São muitas as vertentes que esse questionamento pode apresentar, mas me atenho aqui à visibilidade — ou falta de — que muitos estudiosos, artistas, criadores, escritores negros possuem em nosso país. Quando pensamos nas mulheres negras, menos ainda. Atualmente temos a Carolina Maria de Jesus, que foi "redescoberta" como escritora quase 50 anos depois de sua morte. Quando pensamos em como essas e outras escritoras, artistas e intelectuais negras conseguem visibilidade, não há como negar a importância que ainda tem a validação de uma elite intelectual qualquer ou a existência de um espaço de alcance democrático. Mesmo com algumas limitações e controvérsias, a internet cumpre esse papel de espaço democrático que, apesar do alcance dos algoritmos, ainda permite aos usuários existir e resistir no compartilhamento de artes e ideias.

Olhando cuidadosamente minha estante de livros, encontrei um que acredito explicar de forma bem didática alguns processos de visibilidade, em especial da mulher negra, é O Que É Lugar De Fala, da filósofa e ativista brasileira Djamila Ribeiro. Cheguei a escrever uma breve resenha dele ano passado para minha página pessoal do Instagram e decidi compartilhar novamente esse ano, dessa vez no espaço do Feminário, que existe e resiste como um espaço virtual para mulherências diversas.


RESENHA: O QUE É LUGAR DE FALA?, DE DJAMILA RIBEIRO

Existe um termo que tem sido muito usado atualmente que é “Lugar de Fala”. Porém, seu significado muitas vezes é mal interpretado e utilizado como desculpa para pessoas optarem pelo silêncio por julgarem não ter “lugar de fala” sobre determinado tema ou realidade.

O Que É Lugar De Fala? é um livro em formato de bolso, de 111 páginas e dividido em 4 capítulos + Apresentação e Notas. Possui diversas referências teóricas citadas de forma muito didática e bem explicada. O livro aborda principalmente a questão do feminismo negro e a predominância do saber acadêmico eurocêntrico e utiliza esses temas para desdobrar o significado e uso do termo “Lugar de Fala”. 

O que Djamila Ribeiro, filósofa e intelectual do feminismo negro brasileiro, vem nos mostrar com esse livro, ao explicar o termo que ela própria difundiu no Brasil, é que todos têm lugar de fala. Lugar de fala é de onde você vê determinada realidade, diferente de protagonismo, que é você viver determinada realidade. A consciência de que todos temos um ponto de onde observamos diversas situações é essencial para entendermos nossa força de ação sobre ela, mas nem todos enxergam a influência que têm seus lugares.

Uma citação de Lélia Gonzalez abre o livro de Djamila e convida o(a) leitor(a) para uma viagem pela história da luta das mulheres negras desde o início do movimento feminista ao surgimento do feminismo negro, seguindo para explicações do termo "Lugar de Fala" e suas formas de uso.

Acredito que esse livro seja uma leitura essencial para quem já faz muito uso do termo, sabendo pouco ou muito sobre ele. Mas para quem não tem familiaridade com o assunto e busca uma forma didática, simples e ao mesmo tempo completa para um primeiro contato com o conceito, esse também é um excelente livro!

terça-feira, 8 de novembro de 2022

ELES LEEM ELAS: DESTINOS DESDOBRADOS, DE TERE TAVARES, POR KRISHNAMURTI GÓES DOS ANJOS

 


ELES LEEM ELAS|14


DESTINOS DESDOBRADOS, DE TERE TAVARES

 POR KRISHNAMURTI GÓES DOS ANJOS

 

É possível conciliar o espírito da poesia com as formas da prosa? Foi pergunta semelhante, mas bastante esclarecedora, que Charles Baudelaire considerado como o responsável por uma guinada decisiva na poesia moderna, dirigiu em carta a um editor de seus textos, ali por volta de 1861: “Qual de nós, em seus dias de ambição, não sonhou com o milagre de uma prosa poética, musical sem ritmo e sem rima, bastante maleável e bastante rica em contrastes para se adaptar aos movimentos líricos da alma, às ondulações do devaneio, aos sobressaltos da consciência?”.

Desde então e, cada vez com mais frequência, os escritores(as) têm produzido uma escrita algo arbitrária, despida de formalidades de composição, e com o espírito próximo da anotação íntima. Parece-nos que um impulso reflexivo serve de meio condutor para despertar imagens e ideias. E temos afinal, uma abordagem ao mesmo tempo lírica e incomodada, atenta às subjetividades e ao mundo ao redor sem, no entanto, deixar de estar relacionada com as qualidades da prosa; por isso mesmo, apresentando tendências voltadas para acolher textos maiores – narrativos ou não –, mesmo que procure fixar um olhar lírico sobre a realidade. As frases e parágrafos acabam por supor uma dinâmica extensiva para o texto e as imagens evocadas.

 

[Foto aquivo pessoal da autora]

A palavra perde seus contornos unívocos, e torna-se multisignificativa, irradiadora de significados variados. Com o andar da leitura, percebe-se o caráter de prosa desses textos – presente em tênues fios de enredos e nas conjecturas das personagens, interessadas em resgatar fatos e sentimentos que envolvem o fio narrativo. Textos em prosas poéticas que eventualmente, recorrem a figuras típicas da poesia, como a aliteração, a metáfora, a elipse, a sonoridade das frases etc. Contudo, o emprego desses elementos subordina-se ao ritmo mais alongado do discurso.

Destinos desdobrados, da escritora e artista plástica Tere Tavares segue tal seara de fortes conotações poéticas embasadas na preocupação com o humano e em refinado trabalho com a linguagem, que permitem considerar os textos como prosa poética. Poéticos porque são textos que não se fecham num sentido único, ao contrário, abrem-se ao final da leitura e apontam para o infinito, para o futuro e para dentro do “eu”. Faz-nos meditar sobre o penoso e solitário trabalho de aperfeiçoamento da consciência individual, conseguido graças à contemplação atenta do mundo e à investigação minuciosa dos submundos que compõem a alma. Trecho do texto “Maria Pedro”:

 

Arte: Tere Tavares, 'Beija-flor com flores vermelhas'- óleo sobre tela- 18 x 24 cm- 2019
[Foto arquivo pessoal da autora]


Escrevendo como se falasse, eu lhe permito confiar em dados diferentes, em escalas de conflitos insuperáveis e frases finais. Ensino-lhe a ver a dor maior para que ele sinta a sua dor diminuir. Abasteço-o com arquejos inéditos como um alfabeto infinito, onde cada soluço propõe uma nova música. Ele se entretece nessa leitura como um estudo de concordância às normatividades vibracionais capturadas quando se cola os ouvidos ao chão fechando as pálpebras. Isso supera avaliações de forma ou conteúdo. Eu lhe permito um sinal para outras fronteiras, a interpretação mapeada das catástrofes desconhecidas, das monumentais ideografias que completam a paisagem involuntária da sua própria luz; bastam-me esses voos que evolam de mim por puro deslumbramento”.

Se alguns textos se recolhem ao silêncio de confissões envolventes, outros guardam, todavia, uma atitude de provocação libertária, sobretudo naqueles que, de alguma sorte, tocam no sentir feminino e nas tantas e tamanhas violências que as mulheres ainda hoje padecem, e que ao final das contas acabam por se constituir nas “lost voices” do mundo. E isto percebemos já a partir do título da obra que se caracteriza por uma intenção manifesta. Desdobramentos da alma feminina. Percebe-se nitidamente a centelha de inquietação de uma prosa levada ao estado da poesia, mas sem abrir mão do plano narrativo. Verdadeira simbiose entre os gêneros tradicionais. Alquimia entre prosa e poesia.

 

[Foto aquivo pessoal da autora]

Mas isto também se faz por uma tendência meditativa que vai se acentuando e constituindo linha de força da produção da autora. O pendor reflexivo desdobra-se num leque de muitas faces, afinal. E pode mesmo prescindir da centralidade do sujeito lírico, articulando um ponto de vista que se entremostra oculto sob um fluxo de frases impessoais, e de que são exemplos flagrantes, textos como: “A feminina arte de nascer”, Notas de amor de uma mulher em muitas”, “Hino às obras inversas”, “Deméter”, “Filhos de papel e tinta”, “A arte não conhece o impossível” e “Sobre o filho de José”. Já na segunda parte da obra sob o título de “Outros destinos ou ensaios dos fins” que, dentre outros aspectos, foca no perpassar do tempo em nossas vidas, merecem destaque textos profundamente reflexivos como o são, “Nada precisa ser perfeito”, “Ensaio dos fins”, “Amulherquedesejaser” e “Translúcida”.

Para o espírito reflexivo interessam mais as ambiguidades e torções de sentido; são mais adequadas as palavras da ironia, do jogo de contrastes ou da liberdade associativa. Desvios que a linguagem poética produz para se afastar do imaginário comum. Acionado pela força do detalhe ou do objeto, por um ângulo ou por um gesto fortuito, o procedimento reflexivo costuma recorrer aos valores elementares – sensações, sentimentos, percepções –, com o propósito de expressar determinada condição. Qualquer coisa ou ser, têm o poder de estimular os sentidos e produzir entrelace de imagens.


[Foto arquivo pessoal da autora]

Saliente-se finalmente, que a atitude meditativa que prevalece em boa parte dos textos não provoca necessariamente uma depreciação do efeito poético. Ao contrário, essa mesma visão crítica recusa os mecanismos sociais que banalizam a linguagem e continua desejosa de uma expressão outra, em que seja possível uma linguagem pessoal e ao mesmo tempo comprometida com a experiência vivida. Sem dúvida uma atitude geral que tende à uma concepção Holística da vida, uma forma de se ver a si mesmo e de ver o mundo e todos os seres de uma forma global, como um todo, onde tudo está interligado, onde nada é isolado, tudo pulsa simultaneamente, onde o todo está presente em cada parte. Não existe nada desligado, isolado. Uma maneira de ver que cada ser humano está diretamente conectado com todos os seres humanos e com todas as demais coisas do universo.

Num mundo que está passando por tão rápidas mudanças em todos os sentidos, seja nos avanços tecnológicos, seja nos costumes e crenças, é de suma importância adquirirmos uma visão ampliada e um entendimento maior da vida. A autora ao caminhar rumo às sombras que existem no interior do ser e que guardam os mistérios primordiais, aposta no profundo poder da arte para transformar o indivíduo e incorporar poesia à vida humana, para que esta se transforme num poema contínuo e numa encantada realidade. Positivamente soube urdir textos que arrebatam o leitor numa torrente de símbolos, imagens e significados.

Krishnamurti Góes dos Anjos

Escritor e Crítico Literário

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Tere Tavares nasceu em São Valentim, RS, é escritora e artista visual. Reside em Cascavel, PR. Autora dos livros Flor Essência, Meus Outros, Entre as Águas, A linguagem dos Pássaros, Vozes & Recortes, A licitude dos olhos, Na ternura das horas, Campos errantes, Folhas dos dias, Destinos desdobrados e Diário dos inícios. Participante de 17 antologias e coletâneas no Brasil e exterior, algumas resultantes de concursos literários. Os livros Campos Errantes e Folhas dos dias, foram contemplados pela Lei Aldir Blanc, Edital Arte em toda Parte 2020. Possui publicações em diversas revistas no Brasil e exterior. Integra a Academia Cascavelense de Letras. Blog: http://m-eusoutros.blogspot.com.




Escritor, Pesquisador, e Crítico literário. Autor de: Il Crime dei Caminho Novo - Romance Histórico, Gato de Telhado - Contos, Um Novo Século - Contos, Embriagado Intelecto e outros contos e Doze Contos & meio Poema. Participação em 27 Coletâneas e antologias, também em revistas no Brasil, Argentina, Chile, Peru, Venezuela, Panamá, México e Espanha.

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

UMA CARTOGRAFIA DA ESCRITA DE MULHERES: ENTREVISTA COM MARGARIDA MONTEJANO, POR GABRIELA LAGES VELOSO

 


UMA CARTOGRAFIA DA ESCRITA DE MULHERES |03

ENTREVISTA COM MARGARIDA MONTEJANO

Por Gabriela Lages Veloso

De acordo com a escritora chilena Isabel Allende, “as mulheres foram silenciadas por séculos e só agora, com as conquistas do feminismo e as inevitáveis ​​mudanças na sociedade, elas começam a receber alguma consideração. Custa a uma mulher três vezes mais do que a um homem obter metade do reconhecimento. No meu caso, isso ficou evidente, especialmente no Chile. Ninguém é profeta em sua terra, pior se for mulher”. Diante disso, a literatura manifesta-se como uma importante arma de combate contra as desigualdades de gênero, ao dar voz e poder às mulheres. Na intenção de mapear as margens e abrir espaço para as novas vozes sociais, nossa coluna intitulada Uma Cartografia da Escrita de Mulheres tem como principal objetivo promover a valorização de escritoras contemporâneas, através de entrevistas. Hoje, temos a honra de receber a escritora Margarida Montejano, cujos versos e narrativas são repletos de sensibilidade, reflexão e sororidade.

ENTREVISTA COM MARGARIDA MONTEJANO: 

Arquivo pessoal da autora

Margarida Montejano é natural de Mogi Guaçu (SP), mas reside em Paulínia (SP). Atualmente a escritora e poeta é Supervisora Educacional na Rede Municipal de Campinas. Cursou a graduação em Pedagogia e o Mestrado em Educação, na PUC Campinas, e, o Doutorado em Educação, na Unicamp. Além disso, é Pesquisadora do Loed/Unicamp, e, Produtora do Canal Literário N’outras Palavras – histórias que inspiram, no Youtube. Em 2021, foi Co-Organizadora do livro Cotidiano, Poesia e Resistência, publicado pela Editora Siano. Em 2022, publicou o seu primeiro livro, intitulado Fio de Prata, pela Scenarium Livros Artesanais (SP), e, em seguida, o livro  Pérolas do Caminho, na Amazon.

Como você adentrou no mundo das letras?

Gabriela, querida. Antes de dialogar com você nesta e nas outras provocações deste maravilhoso espaço literário, quero agradecer o convite e desejar a você e ao Feminário Conexões, muitos êxitos! Que sua coluna atinja o objetivo maior que é o de ser lida,  ressignificada e compartilhada com inúmeras mulheres do Brasil e do mundo. Sobre como adentrei no mundo das letras, penso que as letras sempre estiveram em mim, desde a infância, pelos olhos de minha mãe, primeira leitora e contadora de histórias. Eu era uma ouvinte atenta e curiosa, e fazia perguntas que a ela, talvez,  por não ter as respostas,  me pedia para ouvir até o fim  porque lá, no final, eu entenderia. Não funcionava bem assim, mas ela tentava e conseguia prender minha atenção. Contudo, posso dizer que, foi na adolescência, período em que, por influência de um professor de literatura, mergulhei literalmente nos livros.  Devorava os clássicos da biblioteca da escola municipal e, não satisfeita, na época, me inscrevi num clube do livro e recebia livros de bolso, com grandes títulos, pelo correio. Foi uma época mágica, pois tive contato com obras nacionais e internacionais, dentre elas algumas de Machado de Assis, Jorge Amado, Lygia Fagundes Telles, Cecília Meireles, Agatha Christie, Julio Verne,  Gabriel Garcia Marques. Dele, faço questão de citar Cem Anos de Solidão, lido em cinco dias. Um livro que me marcou muito, pois trago comigo os detalhes de Macondo, cidade fictícia e a riqueza do real e do imaginário, retratada pelo autor na existência e especificidades humanas, presentes nas várias gerações da família Buendia.

A sua formação acadêmica, na área de educação, tem alguma influência na sua escrita literária?

Sim, com toda certeza. Minha formação acadêmica sempre esteve vinculada à educação pública. Tive o privilégio de receber uma bolsa de estudos no Mestrado e realizar meu doutorado numa universidade pública. Penso que a base político-educacional, que recebi em minha formação,  possibilitou-me estar mais atenta à leitura crítica da realidade e, por conta disso, escrever com os pés fincados nos contextos político e social. E, ao mesmo tempo, considerando a licença poética e criativa que a literatura me permite, criar, sonhar e esperançar por tempos melhores, como nos ensinou Paulo Freire. Não consigo escrever descolada da realidade sócio-político-econômica que produz e se alimenta das desigualdades, miséria, violência e opressão. Neste sentido, acredito que, pela educação, com bases numa formação humana que promova o gosto pela leitura e, com isso, a leitura crítica da realidade, será possível construirmos um mundo mais fraterno, mais humanizado e sensível no enfrentamento dos problemas sociais.

Por que você escreve?

Eu diria que escrevo para me libertar de todas as amarras culturais que carrego comigo. A escrita feminina e a esperança são temas que permeiam minhas produções, sejam na poesia ou nos contos. Penso que minha escrita retrata as violências praticadas contra os oprimidos, de um modo geral. Contudo, mais especificamente, contra as centenas de milhares de mulheres que sofreram e sofrem com a violência e o preconceito causados pelo machismo estrutural, presente nas sociedades e que precisam ser enfrentados e combatidos. A escrita é uma ferramenta extremamente necessária e importante para melhorar a elaboração das ideias, da capacidade argumentativa, oralidade e autonomia da pessoa e deve ser estimulada a todos, desde a infância.

Quais escritoras(es) te motivam a continuar sua carreira literária? 

São muitas escritoras maravilhosas, que me motivaram e motivam, quando as leio e as releio, vejo o quanto eu tenho a aprender com elas!  Interessante que suas escritas me marcaram como tatuagem. Fazem parte de meus poros, de minha pele, de minha essência. De Clarice Lispector, A Hora da estrela, quanta sabedoria na reflexão sobre a vida e a morte! De Lygia Fagundes Telles, a Ciranda de Pedra. Eu era adolescente ainda, quando me encantei com a menina Virgínia, na luta por ser reconhecida! De Adélia Prado, me vem à mente o poema Casamento e a lembrança de que "Coisas prateadas espocam..." Muita riqueza em suas construções poéticas! De Cecília Meireles, o Retrato, muito forte e questionador, me toca lá no fundo:  "Em que espelho ficou perdida a minha face?".  De Cora Coralina, o poema Das Pedras, quanta aprendizagem em seus versos duros e realísticos. Dói e ensina que viver é lutar. Elisa Lucinda, Djamila Ribeiro e Conceição Evaristo, em luta pela defesa da vida das mulheres e de tantos outros irmãos do caminho. Vidas Negras me importam muito! E, como não poderia deixar de citar, as obras de Isabel Allende me estimulam a crer que é possível outro mundo diferente para nós mulheres, destacando, de sua obra, Mulheres de Minha Alma. De Clarissa Pinkola Estés, Mulheres que correm com os lobos e Angela Davis, é claro, com Mulheres, Cultura e Política. Penso que as escritoras citadas e tantas outras escritoras contemporâneas me convocam à escrita pela história de luta feminina e me lembram, nos lembram, em suas produções, de não esquecermos de nosso valor roubado, sonegado, negado e que a luta deve ser constante pelo lugar social reconhecido a que temos direito. Valiosas contribuições que me ajudaram e me ajudam a pensar e a sonhar com um mundo mais humano, fraterno e solidário para conosco e com todos os outros.

Conte-nos sobre o seu primeiro livro, Fio de Prata (2022). Como foi o processo de escrita? Quais temáticas você aborda? Onde podemos adquiri-lo?

Fio de Prata é, como costumo dizer, um livro-presente, pois tem o encanto das ilustrações confeccionadas pelo amigo e artista plástico, Ruy Assumpção Filho exclusivamente para os contos, iluminado pelos prefácios e posfácios e pelo feitio artesanal da Scenarium livros artesanais, sendo em sua forma costurado com uma fita prateada que se prolonga como um marcador  de páginas. Dá para imaginar? É lindo, não deixe de conhecê-lo! Fio de Prata traz, no bojo dos 07 contos, memórias reais e ficcionais projetadas pela literatura em retratos da realidade e da existência, apresentando a mulher como protagonista em sua luta cotidiana pela  integridade sócio-econômica e política de sua presença no mundo. Posso dizer que o processo da escrita nasceu sem pretensão literária, contudo fluiu com o desejo de se fazer registro para não se perder as histórias, transformando-se em contos. Neste sentido, bebeu conteúdos em vivências próprias e em histórias/causos colhidos em encontros com outras mulheres que se entregaram à contação de memórias, considerando não perdê-las no tempo. Como já sinalizado, Fio de Prata é permeado pela presença do feminino no protagonismo da menina, da moça, da mulher madura e idosa, todas apresentando seu aporte às lutas na denúncia e no anúncio de novas formas de enfrentamento do machismo estrutural na atualidade. E, se alguém se interessar em adquirir o livro Fio de Prata, na versão física, poderá fazer os pedidos diretamente com a editora Scenarium Livros Artesanais, ou, na versão digital, no site da Amazon.

Além de escritora de contos, você também é poeta. Na sua opinião, existe alguma diferença entre a escrita de prosa e poesia?

Sim, pois ambas as categorias têm forma própria. Na poesia, há ritmos, rimas, métricas... Na prosa não há versos e nem quebra de linhas, contudo em alguns de meus contos subverto a regra, pois, se na estrutura textual meu narrador pensar alto, não hesitarei em inserir um verso em meio à narrativa.

Você pretende lançar também um livro de poesia? 

Sim. Já está sendo preparada, para o ano de 2023, uma coletânea de poemas, reunindo temáticas variadas, contudo todas em defesa da vida e da esperança.

Comente sobre os seus projetos na área da literatura e cultura, como, por exemplo, o Canal N'outras Palavras: histórias que inspiram

Gabriela, além da leitura e da escrita que têm tomado conta de mim nos últimos tempos, outra ação que me é muito cara é a produção de conteúdo significativo à atualidade para o Canal do Youtube, N'outras Palavras - histórias que inspiram.  Trata-se de um espaço cultural, sociopolítico e educativo, que nasceu no início de 2020, na época do início da Pandemia da Covid-19. O objetivo primeiro do canal era produzir leituras de contos, fábulas, poesias às pessoas que se encontravam em isolamento social, em especial às que estavam internadas em clínicas de recuperação, asilos e, mesmo em casa, longe dos familiares. Em 2021, o Canal intensificou sua produção e foram criados novos quadros, dentre eles o "Fala Poeta", voltado para a apresentação de poemas enviados ao Canal, com a leitura pelo próprio autor; o quadro "Janela Cultural", onde o autor apresenta seu trabalho destacando a sua atuação no universos literário e artístico;  Lives com convidados que tratam temáticas da atualidade e como  um  espaço de lançamento de livros. No ano de 2022, mantivemos os quadros e criamos mais uma possibilidade de produção de conteúdo, o quadro "Na lata", no qual os convidados são entrevistados com questões atuais e que transitam pelas várias áreas do conhecimento, em especial,  as de cunho filosófico-político e culturais. É importante realçar que os conteúdos apresentados no canal dialogam com a música e a arte de modo geral e o objetivo deste espaço de comunicação é apresentar pessoas que produzem educação e cultura na perspectiva da formação humana.

Qual é a importância da literatura?

Quando penso na importância da literatura me vem à mente o poema de Mário Quintana, "Quem faz um poema, salva um afogado". Assim vejo e sinto a literatura. Sua prática representa possibilidades de ampliação do olhar e de perspectiva do sujeito sobre a realidade. De enriquecimento do vocabulário, de elaboração de ideias e de produção escrita, assim como para o desenvolvimento da autonomia e da criatividade. Neste sentido, a presença da leitura desde a infância, ao meu ver, possibilita formar gerações de adultos mais sensíveis e humanizados no desenvolvimento das relações sociais, da ciência, da arte e nos cuidados consigo, com o outro e com o meio ambiente.

Como convidada da nossa coluna Uma Cartografia da Escrita de Mulheres, qual mensagem você deixa para a nova geração de escritoras?

Minha mensagem e desejo para as novas gerações de meninas, moças e mulheres: escrevam. Leiam muito e, em especial, literatura escrita por mulheres. Deixem registradas as experiências de vocês e participem de coletivos femininos. Não desanimem quando tudo parecer aterrador. Lembrem-se das mulheres que as antecederam e se fortaleçam nas experiências de suas vidas, pois somos o que somos por conta delas e das lutas que elas travaram.


Contatos da escritora:

Instagram: @montejanomargarida

Facebook: //www.facebook.com/margarida.montejano

Youtube: //youtube.com/c/NoutrasPalavras

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Gabriela Lages Veloso é escritora, poeta e mestranda em Letras pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). É colunista da Revista Sucuru e do Feminário Conexões, editora do núcleo poético de divulgação feminina Sociedade Carolina e membro do projeto Entre Vasos y Versos, que conta com a participação de escritores de diversas nacionalidades. Além disso, colabora com coletâneas e revistas nacionais e internacionais. Em 2023, organizou a Antologia Poéticas Contemporâneas: uma cartografia da escrita de mulheres, juntamente com a Editora Brecci Books.

quarta-feira, 2 de novembro de 2022

MOSAICO DE IDEIAS: O DIA DE CÃO, POR SANDRA SANTOS

 

MOSAICO DE IDEIAS - SEMEANDO PALAVRAS E COLHENDO BORBOLETAS|02 

O   D I A   D E   C Ã O

POR SANDRA A. SANTOS

As viagens no metrô paulistano geralmente são longas e cansativas, principalmente para quem mora na periferia. Um período de tempo em que passamos às voltas com nossos pensamentos, dando espaço às reflexões que surgem de forma intrusa, e por vezes deslocadas. Gente demais, com espaço de menos, e cada um isolado no seu mundo.

O silêncio, a alma do trem, instala-se como uma trilha sonora invisível a inundar um cenário, onde pessoas estranhas se encontram, amontoam-se, e são forçadas a um desconfortável grau de proximidade.

Quando o vagão lota completamente, desequilibrar-se é impossível para quem segue viagem em pé, pois mesmo sem segurar o corrimão, basta apoiar-se na parede hermética de carne e ossos que involuntariamente balança na mesma onda.

Fiz essa viagem por muitos anos e tinha dificuldades com um certo tipo de passageiro: aquele que, estranhamente, presume que o outro queira prosear durante o trajeto, e qualquer um serve, desde que tenha ouvidos. Concluo que talvez a solidão incentive esse tipo de comportamento, e mesmo sem nenhum empenho de minha parte, muitas pessoas dividiram suas vidas comigo, querendo eu ou não. Por mim, viajaria calada na companhia dos meus pensamentos nada silenciosos, e mesmo à contragosto, nunca neguei atenção a quem me puxasse conversa.

Antes da febre dos smartfones, as viagens eram mais interessantes e mesmo que praticamente ninguém se olhasse nos olhos, as pessoas ainda estavam lá. Com o passar do tempo e com o avanço da tecnologia celular, elas migraram para um universo paralelo onde os olhos ficam na tela, e alma sai do corpo. Entretanto, há quem resista a essa escravidão virtual e abra um livro; eu me identifico quando encontro outro herói da resistência.

Em São Paulo as distâncias são imensas, e o trajeto de casa para o trabalho e do trabalho para casa, de forma cruel nos rouba a individualidade. Mesmo assim, insisto em amar essa cidade engolidora de gente, emprestando-lhe uma aura de poesia que só os loucos e os poetas conseguem ver.

O dia começara como outro qualquer, e estando eu entregue voluntariamente aos labirintos da minha mente, fui puxada para a realidade pela figura de um homem que, apesar de extraordinariamente comum, despertara minha atenção, fazendo com que um arrepio gélido percorresse todo o meu corpo. Havia nele algo que estava além de seu rosto magro e do seu aspecto sofrido: um sorriso cruel, os olhos frios e desprovidos de brilho. Ao invés de sentar-se, parou de frente para a porta com as pernas abertas e os braços cruzados, fitando-a como se pudesse movê-la com a força de seu pensamento.

Passei a observá-lo de forma mais atenta, e pressenti que viria confusão, pois ele parecia pronto para enfrentar a turba ensandecida que entraria na estação seguinte. Aquilo não daria certo, e ouso dizer que nada me preparou para o que aconteceu quando a porta 28-A se abriu.

Com um enorme salto e de braços abertos, o homem lançou-se para frente com uma fúria terrível. Seus olhos estavam em brasa, e ele latia, rosnava e babava-se como um cão raivoso.  Eu, que nunca vira alguém imitar um cachorro com tamanha precisão, duvidei que fosse apenas uma simulação, pois parecia que ele havia se transformado em um animal. Para mim, aquele homem acreditava ser um cachorro.

A porta se fechou e ninguém entrou. Afinal, quem se atreveria a ser atacado por um monstro feroz? Foi tudo muito rápido, surreal. A movimentação automática na plataforma havia sido quebrada com louvor, e de forma inusitada, qualquer protocolo de convivência social comum aos transportes coletivos, diluíra-se ao som de latidos.

Um silêncio mortal circulou pelo vagão, e as pessoas se entreolhavam contorcendo-se nos acentos, e creio, que como eu, os outros passageiros foram tomados pela surpresa e pelo medo. Olhares confusos buscavam algum tipo razoável de explicação para o que acabávamos de testemunhar. Antecipei seus movimentos tentando traçar uma rota de fuga, afinal talvez fosse necessário. Mantive os olhos nele até que o infeliz me fitou diretamente, e eu por instinto, baixei rapidamente a cabeça considerando que não se olha um predador nos olhos, a menos que se queira enfrentá-lo.

Ele então, calmamente descruzou os braços e passou a nos analisar, observando-nos de forma acintosa, saboreando orgulhoso o impacto que causara. Divertindo-se às nossas custas ele sabia que tinha o controle da situação.

- Ceis gostaram do Toinho? - Indagou certificando-se que era ouvido.

- Esse cão “dos inferno” é meu companheiro, e é só nele que eu confio. Não confio em ninguém nessa cidade de loucos. Cidade de loucos sim. Eu odeio essa cidade. – Frisou aos berros tentando ofender-nos.

- Já passei muita fome, e até hoje não sei o que tô fazendo aqui..., nessa cidade de merda! Cidade fedida. Eu vim pra melhorar de vida e não consegui nada. – Sua expressão ensandecida, paulatinamente, assumia os ares de um solene discurso.

- Cheguei novo e cheio de esperança. A cabeça cheia de sonho. Cheio de vontade de trabalhar... E o que eu ganhei? O que eu ganhei? – Seu olhar nos atravessava e eu imaginei que talvez fosse melhor se o ignorássemos, mas olhar para ele era irresistível, e acho mesmo que, àquela altura, queríamos e merecíamos saber o motivo daquilo tudo.

Quando a voz robótica anunciou a chegada da próxima estação, o homem-cão posicionou-se novamente em frente à porta, pronto para o momento do bote.

- Vem Toinho, a porta vai abrir..., pega tsss tss Pega! Au uau au auuuuuuuu. – Ele berrava, e o Toinho latia como um cão obediente, pronto a proteger seu tutor. Dessa vez foi mais feroz e as pessoas na plataforma recuaram estonteadas. Ninguém se arriscou a entrar, nem na porta onde ele estava, nem nas outras mais distantes.

Impotentes, assistimos o trem ganhar novamente os trilhos enquanto ele continuava sua história. Sua expressão, paulatinamente se modificava, e eu notei que o ódio dava lugar a algo mais leve que eu ainda não conseguia identificar.

- Ceis gostam do Toinho né que eu sei? Eu também... só tenho ele! Ô cachorro danado. Esse é fiel. Au! Auau! Cala a boca Toinho, fica quieto e me deixa falar cachorro danado. - Ralhou com Toinho até conseguir seu silêncio canino.

- Não vi pai nem mãe e se meus irmãos são vivos, só Deus é quem sabe. Aqui carreguei muita areia e cimento no lombo. Nunca estudei, mas arranjei “uns rabo de saia” e trepei e trepei gostoso... Até que sosseguei e casei. Casei não..., caguei. Tive “uns menino” que nunca consegui sustentar direito. Nunca roubei, nunca matei e..., o que eu ganhei? – Suas perguntas só receberam nosso profundo, e agora, consternado silêncio.

- O que eu ganhei? Fala caralho..., eu tô perguntando... – Silêncio mais profundo.

 - Tô sem emprego, tomei uns “belo par de chifre” e agora tô aqui com meu amigo Toinho. Agora só eu e ele... “Ceis” tão com medo dele ou de mim? Fala com eles Toinho! – Fala pra eles que hoje a gente saiu com vontade de morrer ou de matar... Fala pra eles que nóis num tá brincando... Au au auauau – Lembro-me de sentir um certo alivio ao observar que ele não parecia estar armado.

De estação em estação, o desconhecido desabafou, o cachorro latiu e o trem seguiu vazio.

Aquele homem, em seu dia de fúria compartilhou sua triste história, deixando que do ódio explodisse o choro, em um lamento doído e barulhento. Pouco a pouco, o medo deu lugar a solidariedade e o homem-cão agora, era apenas um homem simples pedindo socorro.

Uma espécie de conversa de boteco mesclada a uma sessão de terapia de grupo se instalou aos poucos, e não faltaram os mais variados conselhos para que ele seguisse sua vida: um partilhou sua história de chifre garantindo que com o tempo, a dor passaria; outro pregou um discurso religioso; alguém, da outra ponta do vagão, ensinou uma simpatia para tirar o encosto; a senhorinha sentada ao meu lado, ensinou um chá milagroso para acalmar a alma. Houve até quem brincasse com o cachorro..., se o Toinho fosse de verdade, provavelmente ganharia um cafuné.

Fato é que em um certo momento, alguém do outro lado do vagão gritou:

- Eita que a porta vai abrir e o vagão vai encher! Pelo amor de Deus homem, solta o Toinho!

Todos riram, e arrisco a dizer que o cachorro Toinho, agora abanava a cauda alegremente.

FIM.

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Sandra A. Santos 
é pedagoga com especialização em Educação Ambiental, ambientalista apaixonada pela natureza e pela vida em todas as suas formas. Hoje aposentada, dedica-se à literatura, escrevendo contos, romances e poesias que giram em torno do universo feminino. Com trabalhos publicados em antologias no Brasil e na Argentina.

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