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segunda-feira, 22 de agosto de 2022

RISCOS FEMININOS: PARA FALAR DE NÓS, POR CRISTIANE DE MESQUITA ALVES



RISCOS FEMININOS|01


P A R A   F A L A R   D E   N Ó S


Por Cristiane de Mesquita Alves


Parece que há uma fenda, um buraco negro talvez – se pensar ironicamente em Freud em relação a falar de nós – que possivelmente nascemos mulheres ou não nascemos mulheres, mas, que a identificação com o corpo fêmeo fez com que Beauvoir (2009) escrevesse uma das pautas mais importantes dos estudos feministas, ao afirmar que não nascemos mulheres, tornamo-nos mulheres.

Na esteira dessa filosofia, formou-se uma busca incessante para nós que buscamos, lutamos, insistimos, resistimos ao longo dos séculos de lutas pelas ondas do feminismo, ocupar um lugar nos âmbitos sociais onde pudéssemos expor nosso pensamento, nosso lugar de fala a partir de nós mesmas, cansadas de não nos vermos do jeito que somos refletidas pelo pensamento patriarcal que nos esculpiu com a insígnia do objeto, que categorizou a mulher na condição de inferiorização, colocando-a na subalternidade social e ratificando tal posição a cada sociedade que foi se organizando, adaptando, desenvolvendo no percurso da História.

            Se passarmos rapidamente pela História a construção da identidade feminina forjada pelo patriarcalismo foi moldada na ideia de subserviência (para não discutirmos os conceitos de servidão e escravidão por enquanto) destinada a servir o homem, desde a organização da sociedade  dos povos não-nômades, passando pela  Antiguidade Clássica, Cristianismo (estão aí as narrativas bíblicas que servem até hoje como muitos exemplos para aquelas que ainda não compreenderam o papel social da mulher), perpassando pela formação do pensamento ocidental da dita era renascentista, iluminista, moderna e vamos recorrer ao momento pós-moderno, considerando a cronologia de Danto (2006), o qual conceitua a pós-modernidade como um estilo artístico a partir de 1960. Segundo Danto o “moderno passou a parecer cada vez mais um estilo que floresceu de aproximadamente 1880 até 1960 a partir de então, tem-se o que se denomina pós-modernidade.” (Danto, 2006, p. 13).

Na Literatura, que é nosso lugar de fala, não podemos esquecer o movimento do Romantismo da primeira metade do século 19, que a meu ver representou, grosso modo, um fôlego, para a escrita feminina, um fôlego, não a liberdade de expressão que continuava para a mulher - uma balela. O slogan Liberdade, igualdade e fraternidade para a autoria feminina que usou a Literatura para demonstrar suas ideias, suas experiências, seus sentimentos, sua visão de mundo, ainda continuou no plano de uma idealização romântica, quando não muito – uma utopia – se olharmos do ponto de vista da palavra igualdade, que já na segunda década do século 21, não mudou muita coisa.

Por outro lado, a Literatura, a Arte, o pensamento científico, quando não o próprio religioso[1], foi responsável por provocar nas mulheres a busca por sua própria imagem social a partir dela mesma. Por este motivo, a produção litero-artística serve como um quadro social do pensamento feminino de uma determinada época em que cada uma dessas grandes mulheres viveu.

Nesse contexto, quando a multiartista e produtora cultural Marta Cortezão lançou um convite para que eu assim como as demais mulheres que assinam uma coluna nesse Feminário Conexão, eu pensei em riscar pequenas considerações sobre o universo das feminilidades, femininidades, as questões que nos provocam a pesquisar, a entender, a buscar o que nós mesmas somos. Eu uso o nós para se referir bem ao gosto da premissa do tornar-se mulher de Beauvoir (2009) mesmo! Do autoidentificar-se como mulher, do se ver mulher, do sentir mulher, do pensar mulher... e aqui – eu me coloco como mulher cis, abraçando minhas souer lésbicas, binárias, trans... toda aquela que se vestiu com o manto feminino e feminista sobre o seu corpo.

O título da coluna Riscos femininos dialoga com o meu primeiro livro solo de poesias Riscos de mulher ... e eu costumo explorar bastante o sentido ambíguo da palavra “risco” bem pontuado pela professora e pesquisadora de estudos feministas Joyce Amorim (2021), prefaciadora do meu livro. Risco por alertar, denunciar o risco que temos e vivemos diariamente por ter vindo do ventre como mulher - que ainda não encontrou o respeito devido, a equidade e o direito à vida no mundo em que o falocentrismo impera. Outro sentido, risco – o ato cotidiano para se referir à escrita, pois, uma de minhas filosofias de vida é escrever para falar de nós. Escrever para valer os sacrifícios das que vieram antes de mim e deixar registrado pela escrita – em especial - a literária de todas aquelas que lutaram para que eu tivesse nesse momento a oportunidade de escrever e expor o que penso, bem como as que me leem têm o direito de saber um pouco a respeito do que essa mulher faz para contribuir e somar com as nossas lutas feministas diárias.

Nessas palavras introdutórias, risco algumas inquietações de mulher que vivo e pesquiso e apresento-me como mais uma colaboradora desse espaço de construções poéticas e reflexões sobre o feminismo e feminino procurando desmistificar a cultura a respeito do patriarcado criado para a mulher e valorizar a divulgação das ideias pensadas pelas mulheres no que tange a suas narrativas de vida.

 

Referências

AMORIM, Joyce Cristina Farias de. Prefácio. In: ALVES, Cristiane de Mesquita. Riscos de mulher. 1ª ed. São Paulo: Editora Todas as Musas, 2021.

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo. Trad. Sérgio Milliet. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.

DANTO, Arthur C. Após o fim da arte. A arte contemporânea e os limites da História. Tradução de Saulo Krieger. São Paulo: Odysseus Editora, 2006.

 



[1] Um exemplo disso pode ser a escritora mexicana que viveu entre os anos de 1648 1695 Sóror Juana Inés de la Cruz. Dramaturga, filósofa e freira que revolucionou o pensamento crítico em uma época histórica que a Igreja Católica ainda se mantinha no poder e controle para ditar e regrar os costumes e valores sociais.  

@cris.mesquita.52

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