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terça-feira, 27 de setembro de 2022

LIVROS & ENCANTAMENTOS: AS CORES NA PONTA DA LÍNGUA, DE ADRIANNA ALBERTI, POR CRIS LIRA



LIVROS & ENCANTAMENTOS/07


 'AS CORES NA PONTA DA LÍNGUA', DE ADRIANNA ALBERTI


POR CRIS LIRA


Como comentei na postagem da resenha anterior, na coluna Livros & Encantamentos, estou lendo a Coleção III do Mulherio das Letras e vou compartilhar neste espaço impressões de leitura como um convite para que mais leitoras e leitores conheçam a vigorosa produção literária do Mulherio das Letras.

[foto arquivo pessoal Cris Lira]

Hoje, falo sobre As cores na ponta da língua, de Adrianna Alberti. Desde o título, o livro nos chama a vivenciá-lo a partir de vários sentidos, despertando em nós um pouco do lúdico, da forma de experimentar o mundo pelos olhos das crianças, mas com um olhar de quem já conhece um bocado da vida e do cotidiano atroz que nos consome.

Organizado em 4 seções: “Céus azuis e sóis cinzas”, “A melodia do arco-íris”, “Memórias de ipê” e “Elas na ciranda”, o livro é composto por pequenas narrativas que são sempre introduzidas por um título instigante. Confesso que, como leitora, sou dada a títulos. Gosto dos que não me entregam nada, que me deixam sem qualquer expectativa, mas que iluminam as entrelinhas quando me aproximo do fim. O primeiro texto, por exemplo, “Quando os dias são bons”, narra sequencialmente os acontecimentos de uma manhã qualquer, num dia qualquer, cujo triunfo é conseguir chegar ao trabalho. Não há qualquer menção à depressão, à angústia, à tristeza. É a disposição dos afazeres feitos e por fazer que indica por onde anda o estado mental da protagonista: “respirar era simples” (28). Há várias narrativas com o mesmo tom no livro, indicando a força do cotidiano para a compreensão do mundo, as repetições como o caminho para aceitar perdas e descobrir novas formas de estar presente, como é o caso de “Seu nome é perpétuo” (31). O universo que se abre com este livro é o que nos oferece possibilidades para olharmos para a nossa própria rotina, para a beleza das coisas mínimas e mundanas que se mostram diariamente. Não é esse, também, um dos papéis a ser desempenhado belos bons livros? Fazer-nos ver, no nosso dia a dia, reflexos das histórias que trazemos do papel para as nossas vidas? Acho que justamente por isso gostei tanto de “O quintal do inferno” (55). Só quem viveu e amou em geografias outras, sentindo-se fora do lugar, é capaz de compreender o peso do clima na nossa forma de habitar o mundo. Reproduzo, aqui, um trechinho: “O primeiro mês foi sofrimento. Noites quentes, o ar morno e seco, mas a roupa sempre molhada, cheia de suor nojento. . . . O povo do sotaque diferente, sorridente, mas quem poderia ser feliz em um lugar onde faz 45 graus na sombra?” Ler esta pequena narrativa foi como receber aquela troca de olhar que apenas as amigas que se conhecem há muito tempo sabem trocar. Piscamos, ali, uma para a outra, ambas um pouco perplexas de como há quem exista, ame e coma em lugares que podem ser tão inóspitos e, ao mesmo tempo, tão queridos por nós. É uma lembrança de que somos seres contraditórios, sempre na corda bamba, à espreita de algo que hoje pode ser bom, mas que amanhã talvez seja ruim. Não há medida para a totalidade é o ensinamento de “As cores na ponta da língua”, de Adrianna Alberti.

[arquivo pessoal da autora Adrianna Alberti]

Quero deixar uma nota para agradecer o prefácio primoroso assinado por Carolina Mancini. Diz a autora, na abertura, “Você precisa sentir primeiro”. Pois, então, sintamos!

 

Não mudem os livros de lugar (p. 34)

 

Primeiro, um importante fato sobre mim: eu peço o mesmo sorvete há sete anos na sorveteria da cidade. Portanto, na noite em que, sem nenhuma sugestão, eu coloquei queijo ralado no meu miojo, considerei uma vitória. Apenas uni o pensamento que sopa é excelente quando vai queijo ralado, miojo é quase uma sopa, então deveria ficar bem. Não ficou. Decepção. O queijo empelotou e o miojo ficou com cheiro esquisito e sabor estranho de queijo velho, quando deveria ter o sabor e o cheiro artificial de galinha caipira. Me senti orgulhosa, mas completamente decepcionada. E, é por essas e outras, que peço o mesmo sorvete há sete anos na mesma sorveteria da cidade.

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[arquivo pessoal da autora]

Adrianna Alberti é a paulista mais campo-grandense dessas paragens. Já passou dos trinta, workholic, vive com alguns gatos endemoniados. Possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e graduação e mestrado em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grasso do Sul (UEMS). Pesquisadora de Literatura Fantástica, contista nas horas vagas e poetisa por identificação dos leitores. Publicou o livro de poesias O silêncio na ponta dos dedos em 2020, seu primeiro livro solo, tendo publicado desde 2011 contos fantásticos e poesias em antologias pelo Brasil. Colunista do coletivo literário O Bule. Adrianna.alberti@gmail.com  @tykkaa



[arquivo pessoal da autora]
Cris Lira é paulista e escreve desde que se entende por gente. Com a Editora Venas Abiertas, participou das Coleções I, II e III do Mulherio das Letras. Seu mais recente livro, Fragmentos do Interior, foi lançado em 2021. Atualmente, é professora e supervisora do Programa de Português da Universidade da Geórgia, em Athens, nos Estados Unidos. Redes Sociais: Instagram: @lircris Facebook: facebook.com/cris.lirica Youtube: Vamos ouvir o Mulherio

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