NAS TEIAS DO POEMA VIII: ENTRE PERCEPÇAO E MEMÓRIA
Por
Marta Cortezão
A realidade apenas se forma na memória; as flores que hoje me mostram pela primeira vez não me parecem verdadeiras flores.
{Marcel Proust}
No oitavo episódio do Nas Teias do Poema, um quadro realizado pelo Projeto Enluaradas, vamos dialogar sobre o “fazer literário” que se (entre)cruza neste processo de criação da escrita, nestas teias que se (des)tecem no corpo do poema. Para nosso encontro poético de hoje, teremos a companhia das autoras:
MARIA DO CARMO SILVA. Natural de Mutuípe-BA (Brasil). Professora, poeta e
escritora. Membro do Mulherio das Letras e da Academia Internacional Mulheres
das Letras. Autora do livro de “Poesias Retalhos de Vivências”. Participa de
várias Antologias. Colunista no site de notícias: Tribuna do Recôncavo;
PATRÍCIA CACAU, atualmente vive em Linz, Áustria, é empreendedora e ativista social, incentivadora do Mulherio das Letras Ceará, Áustria e União Europa. Escreve desde a adolescência, sua escrita nasceu no coletivo Mulherio das Letras Europa. Idealizadora do Projeto Enluaradas. Participou de coletâneas/antologias no Brasil e Europa. Livro individual Quintais (In-finita/PT, 2020);
LUCILA BONINA é natural de Manaus, mas reside em Vargem Grande Paulista, SP. Desde sempre as artes da palavra povoam seu universo pessoal com histórias, poesia e música. É professora de Língua Portuguesa, Mestre em Letras e Artes e narradora de histórias. Publicou poesia nas Coletâneas Enluaradas Se essa lua fosse nossa; Coletânea I do Mulherio das Letras na Lua e Coletânea 2021 do Mulherio das Letras Portugal;
MARTA CORTEZÃO nasceu em Tefé/AM, mas mora em Segóvia/ES desde 2012. É escritora, poeta, tradutora, trovadora, ativista cultural, idealizadora dos projetos Enluaradas, Tertúlias Virtuais, Ajuri Cultural e do também do blog Feminário Conexões. Tem obras (poemas e contos) publicadas em antologias, tanto nacionais como internacionais; Livros de poesia Banzeiro manso e Amazonidades: gesta das águas (no prelo).
Neste oitavo episódio, desejamos falar sobre estes fios da memória que se laçam e se entrelaçam no exercício de nossa escritura. Quais são este(s) gatilho(s) capaz(es) de fiar este sudário na carne nua/crua da linguagem? Em que campos de nossas percepções estas sensações afloram? Que sabor(res) ou cheiro(s) nos levarão a um poema? Que “madeleines de Proust” preparamos no “forno” de nossa memória?
Mas
como o escritor francês Marcel Proust concebe esta memória em sua famosa série
de sete romances, “Em busca do tempo perdido”? Para Proust, a apreensão da
realidade se dá de forma inconclusa e insuficiente, pois a memória involuntária
é vista como catalisadora de um tempo perdido, resgatado e ressignificado pelo
intelecto através de fragmentos temporais que nos dão uma imagem relativizada da
realidade plena:
“[...] nem tudo o que acontece me ocorre: o sino tocando em Saint
Hilarie. Muitas vezes até essa hora prematura soava duas batidas a mais que a
última, havia, portanto, uma que eu não ouvira, algo que não acontecera para
mim” (PROUST apud PEREIRA, 2014, p.
10-11).
Esta
perene dinâmica de reconstrução da memória, de caráter plural e instável e que
beira a fantasia e a invenção, trouxe-me a imagem de Penélope, a que retoma, em
sua longa espera, os fios da memória para dar forma ao manto de tessitura
caleidoscópica, incessante e complexa. E nós, mulheres escritoras do século
XXI, desta avassaladora contemporaneidade, o que temos a dizer, em primeira
pessoa, sobre nosso “fazer literário”? Sobre este exercício de intensa subjetivação,
mas, paradoxalmente, sedento de dialética, pleno de constância e inconstâncias?
Como pensar estas teias involuntárias, nas quais nos prendemos pelo fascínio
que a arte literária exerce sobre nós?
O
texto literário é o suporte para a produção destas memórias imagéticas, devido
à liberdade ficcional e polissêmica que o habita. E por que não usar a metáfora
de que o texto literário é o intérmino sudário tecido pelos fios da memória que
se (re)modelam na busca proustiana pelos instantes revisitados no rastro da
insuficiente memória involuntária do passado?
Você
é nossa/o/e convidada/o/e especial para este encontro! Venha nos fazer companhia
e enriquecer nossos diálogos através de comentários! Até logo mais!
REFERÊNCIAS:
BOSI,
Eclea. Memória e Sociedade: lembrança de
velhos. São Paulo: Cia as Letras, 2003.
PEREIRA,
Danielle Cristina Mendes. Literatura,
lugar de memória. Disponível em https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/soletras/article/download/16314/12499.
Acesso 7 de Janeiro de 2021.
Maravilhoso texto!!! Lembrei-me de uma fala do Mia Couto em que ele afirma que a única linguagem possível para a memória, assim como para o sonho, é a linguagem poética, porque a memória está naquele lugar entre o vivido e imaginado, entre o imanente e o etéreo recriado pelo afeto, pelo desejo, pelos nossos sentidos que, enfim, são sujeitos à ação do tempo, mas teimam em vencê-lo.
ResponderExcluirRecriar a memória pelo fazer literário é um modo de refazer a própria vida!
Que lindo, Lucila! Amei❤Que bom dividir momentos de Poesia com vocês. Gratidão🌻❤🌻
ExcluirBelíssimo texto!
ResponderExcluir"Não vim ao mundo pra andar pra trás. O caminhar é pra frente, por isso não temos pés de Curupira. Mesmo que as teias do meu passado prendam-se às memórias doloridas, eu corto todos os dias um fio, quando escolho seguir e construir mais um caminho." (Fragmento de O dia que
meu sorriso escureceu- Ale Heidenreich)
São tantas as teias...Cortamos algumas, e nos deixamos envolver em outras. Um caminho sem volta, esse da escrita poética.
Que vontade de te dar um abraço!🌷🌻Lindo, Ale. Que bim fazer este caminho a seu lado.🥰😘😘
ExcluirQuerida Marta,
ResponderExcluirSinto-me representada no seu antenado texto sobre a memória como catalizadora na literatura. Assim que for lançado em novembro, gostaria muito de receber a sua interpretação sensível sobre meu livro Memórias da pele. Um forte abraço poético!
Nossa, Isa, é tão prazeroso este carinho... e uma responsabilidade imensa apreciar sua poética presente no Memórias da pele. Parabéns pelo novo livro que se anuncia sedento de poesia. Viva, Isa, Deusa de nossa Ciranda Enluarada.🥰🥰
Excluir