sexta-feira, 8 de outubro de 2021

NAS TEIAS DO POEMA VIII: ENTRE PERCEPÇAO E MEMÓRIA

 


NAS TEIAS DO POEMA VIII: ENTRE PERCEPÇAO E MEMÓRIA


Por Marta Cortezão

 

A realidade apenas se forma na memória; as flores que hoje me mostram pela primeira vez não me parecem verdadeiras flores. 

{Marcel Proust}

 

No oitavo episódio do Nas Teias do Poema, um quadro realizado pelo Projeto Enluaradas, vamos dialogar sobre o “fazer literário” que se (entre)cruza neste processo de criação da escrita, nestas teias que se (des)tecem no corpo do poema. Para nosso encontro poético de hoje, teremos a companhia das autoras:

MARIA DO CARMO SILVA. Natural de Mutuípe-BA (Brasil). Professora, poeta e escritora. Membro do Mulherio das Letras e da Academia Internacional Mulheres das Letras. Autora do livro de “Poesias Retalhos de Vivências”. Participa de várias Antologias. Colunista no site de notícias: Tribuna do Recôncavo;

PATRÍCIA CACAU, atualmente vive em Linz, Áustria, é empreendedora e ativista social, incentivadora do Mulherio das Letras Ceará, Áustria e União Europa. Escreve desde a adolescência, sua escrita nasceu no coletivo Mulherio das Letras Europa. Idealizadora do Projeto Enluaradas. Participou de coletâneas/antologias no Brasil e Europa. Livro individual Quintais (In-finita/PT, 2020); 

LUCILA BONINA é natural de Manaus, mas reside em Vargem Grande Paulista, SP. Desde sempre as artes da palavra povoam seu universo pessoal com histórias, poesia e música. É professora de Língua Portuguesa, Mestre em Letras e Artes e narradora de histórias. Publicou poesia nas Coletâneas Enluaradas Se essa lua fosse nossa; Coletânea I do Mulherio das Letras na Lua e Coletânea 2021 do Mulherio das Letras Portugal; 

MARTA CORTEZÃO nasceu em Tefé/AM, mas mora em Segóvia/ES desde 2012. É escritora, poeta, tradutora, trovadora, ativista cultural, idealizadora dos projetos Enluaradas, Tertúlias Virtuais, Ajuri Cultural e do também do blog Feminário Conexões. Tem obras (poemas e contos) publicadas em antologias, tanto nacionais como internacionais; Livros de poesia Banzeiro manso e Amazonidades: gesta das águas (no prelo).

Neste oitavo episódio, desejamos falar sobre estes fios da memória que se laçam e se entrelaçam no exercício de nossa escritura. Quais são este(s) gatilho(s) capaz(es) de fiar este sudário na carne nua/crua da linguagem? Em que campos de nossas percepções estas sensações afloram? Que sabor(res) ou cheiro(s) nos levarão a um poema? Que “madeleines de Proust” preparamos no “forno” de nossa memória?   

Mas como o escritor francês Marcel Proust concebe esta memória em sua famosa série de sete romances, “Em busca do tempo perdido”? Para Proust, a apreensão da realidade se dá de forma inconclusa e insuficiente, pois a memória involuntária é vista como catalisadora de um tempo perdido, resgatado e ressignificado pelo intelecto através de fragmentos temporais que nos dão uma imagem relativizada da realidade plena:

“[...] nem tudo o que acontece me ocorre: o sino tocando em Saint Hilarie. Muitas vezes até essa hora prematura soava duas batidas a mais que a última, havia, portanto, uma que eu não ouvira, algo que não acontecera para mim” (PROUST apud PEREIRA, 2014, p. 10-11).

Esta perene dinâmica de reconstrução da memória, de caráter plural e instável e que beira a fantasia e a invenção, trouxe-me a imagem de Penélope, a que retoma, em sua longa espera, os fios da memória para dar forma ao manto de tessitura caleidoscópica, incessante e complexa. E nós, mulheres escritoras do século XXI, desta avassaladora contemporaneidade, o que temos a dizer, em primeira pessoa, sobre nosso “fazer literário”? Sobre este exercício de intensa subjetivação, mas, paradoxalmente, sedento de dialética, pleno de constância e inconstâncias? Como pensar estas teias involuntárias, nas quais nos prendemos pelo fascínio que a arte literária exerce sobre nós?

O texto literário é o suporte para a produção destas memórias imagéticas, devido à liberdade ficcional e polissêmica que o habita. E por que não usar a metáfora de que o texto literário é o intérmino sudário tecido pelos fios da memória que se (re)modelam na busca proustiana pelos instantes revisitados no rastro da insuficiente memória involuntária do passado?

Você é nossa/o/e convidada/o/e especial para este encontro! Venha nos fazer companhia e enriquecer nossos diálogos através de comentários! Até logo mais!

REFERÊNCIAS:

BOSI, Eclea. Memória e Sociedade: lembrança de velhos. São Paulo: Cia as Letras, 2003.

PEREIRA, Danielle Cristina Mendes. Literatura, lugar de memória. Disponível em https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/soletras/article/download/16314/12499. Acesso 7 de Janeiro de 2021.

6 comentários:

  1. Maravilhoso texto!!! Lembrei-me de uma fala do Mia Couto em que ele afirma que a única linguagem possível para a memória, assim como para o sonho, é a linguagem poética, porque a memória está naquele lugar entre o vivido e imaginado, entre o imanente e o etéreo recriado pelo afeto, pelo desejo, pelos nossos sentidos que, enfim, são sujeitos à ação do tempo, mas teimam em vencê-lo.
    Recriar a memória pelo fazer literário é um modo de refazer a própria vida!

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    1. Que lindo, Lucila! Amei❤Que bom dividir momentos de Poesia com vocês. Gratidão🌻❤🌻

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  2. Belíssimo texto!

    "Não vim ao mundo pra andar pra trás. O caminhar é pra frente, por isso não temos pés de Curupira. Mesmo que as teias do meu passado prendam-se às memórias doloridas, eu corto todos os dias um fio, quando escolho seguir e construir mais um caminho." (Fragmento de O dia que
    meu sorriso escureceu- Ale Heidenreich)
    São tantas as teias...Cortamos algumas, e nos deixamos envolver em outras. Um caminho sem volta, esse da escrita poética.

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    1. Que vontade de te dar um abraço!🌷🌻Lindo, Ale. Que bim fazer este caminho a seu lado.🥰😘😘

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  3. Querida Marta,

    Sinto-me representada no seu antenado texto sobre a memória como catalizadora na literatura. Assim que for lançado em novembro, gostaria muito de receber a sua interpretação sensível sobre meu livro Memórias da pele. Um forte abraço poético!

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    1. Nossa, Isa, é tão prazeroso este carinho... e uma responsabilidade imensa apreciar sua poética presente no Memórias da pele. Parabéns pelo novo livro que se anuncia sedento de poesia. Viva, Isa, Deusa de nossa Ciranda Enluarada.🥰🥰

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