Mostrando postagens com marcador e-books. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador e-books. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

ELES LEEM ELAS: A LANTERNA NO LABIRINTO, POR ROGEL SAMUEL



 ELES LEEM ELAS|09

Mapa das Narrativas nos Romances de Milton Hatoumde Francisca de Lourdes Souza Louro

A LANTERNA DO LABIRINTO


Em “Mapa das narrativas nos romances de Milton Hatoum de Francisca de Lourdes Souza Louro. -- Manaus, 2021” há uma cartografia, um passeio pelo mundo das ruas, das portas da linguagem, do som da crítica e da imaginação, as algaravias, as falas, as cartas, as identidades.

            O livro vai tecendo um tapete de significações, explicitações, com a vantagem de que vai ficando cada vez mais interessante à medida que avança, de forma que em vez de ser cansativo, acadêmico,  árido, repetitivo para o leitor mais alarga mais aumenta os interesses hermenêuticos, aquelas confissões, murmúrios, fofocas, recados, sintomas, cartas, como disse alguém: “Conta logo, mas devagar...”, que o prazer está nos cantos escuros do texto, e detalhes, n“as mocinhas do viúvo Talib, não as filhas: as outras, que ele fisgava perto dos armazéns. Na casa dos Reinoso era muito pior, Zana ficava sem fôlego, me pedia para contar tudinho. Quando a confusão começava, os empregados ligavam o gerador para abafar os guinchos dos macacos e os gritos de Abelardo Reinoso”.

            “Em que consiste a unidade de A la recherche du temps perdu?

            Sabemos ao menos que ela não consiste na memória, nem tampouco na lembrança, ainda que involuntária. O essencial da Recherche não está na madeleine nem no calçamento. Por um lado, a Recherche, a busca, não é simplesmente um esforço de recordação, uma exploração da memória: a palavra deve ser tomada em sentido preciso, como na expressão "busca da verdade". Por outro lado, o tempo perdido não é simplesmente o tempo passado; é também o tempo que se perde, como na expressão "perder tempo". É certo que a memória intervém como um meio da busca, mas não é o meio mais profundo; e o tempo passado intervém como uma estrutura do tempo, mas não é a estrutura mais profunda. Os campanários de Martinville e a pequena frase musical de Vinteuil, que não trazem à memória nenhuma lembrança, nenhuma ressurreição do passado, têm, para Proust, muito mais importância do que a madeleine e o calçamento de Veneza, que dependem da memória, e, por isso, remetem ainda a uma "explicação material".  A obra de Proust é baseada não na exposição da memória, mas no aprendizado dos signos. (Deleuse: “Proust e os signos”).

            Esse aprendizado o faz a leitura que a Lourdes Louro faz (por exemplo) das mulheres que emergem dos romances, principalmente daquelas invisíveis, as “escravas”, crias, prostitutas. É na teia dos igarapés, da cidade flutuante, das falas, dos esquecidos, da algaravia. O aprendizado da vida amazônica. Sua tristeza, seu capitalismo periférico. Como em Proust, “é baseada não na exposição da memória, mas no aprendizado dos signos”.

        Pode-se dizer que Lourdes Louro construiu um romance fragmentado sobre os três romances do Milton através de “pistas sobre sua produção, cartas, fotos, conversas com os mais velhos, especialmente os avós, o pai, muitos artifícios para dar os nós nos fios que amarram o texto”.

            Escreveu Hatoum:

        “Decidi, então, perambular pela cidade, dialogar com a ausência de tanto tempo, e retornar ao sobrado à hora do almoço (p. 122). Atravessei a ponte metálica sobre o igarapé, e penetrei nas ruelas de um bairro desconhecido. Crescemos ouvindo histórias macabras e sórdidas daquele bairro infanticida, povoado de seres do outro mundo, o triste hospício que abriga monstros. Foi preciso distanciar-me de tudo e de todos para exorcizar essas quimeras, atravessar a ponte e alcançar o espaço que nos era vedado: lodo e água parada, paredes de madeira, tingidas com as cores do arco-íris e recortadas por rasgos verticais...”

            De acordo com Ricoeur e Gadamer, a hermenêutica vê os textos como expressões da vida social fixadas na escrita, através de fatos psíquicos, de encadeamentos históricos. Sua interpretação consiste, então, em decifrar o sentido oculto no aparente, e desdobrar os diversos graus de interpretação ali implicados. Na realidade a hermenêutica é compreensão de si, mediante a compreensão do outro: o máximo de interpretação se dá quando o leitor se compreende a si mesmo, interpretando o texto.

            A tática da interpretação aparece sempre que há ambigüidade, mas compreender não significa a repetição do conhecer. A hermenêutica postula uma superação: Ela se quer uma teoria e uma arte, fazendo da leitura uma nova criação, e dela se exige uma reflexão que leve à ação.

            A hermenêutica questiona a evidência, recusando-se a explicar completamente o fato interpretado. Uma interpretação definitiva deve ser uma contradição em si mesma, diz Gadamer. Pois, mais importante do que interpretar o claro conteúdo de um enunciado, é perguntar pelos interesses que o guia.

         “Vemos nas cores da grande tela amazônica, os quadros narrativos que o autor imprime e apresenta aos leitores, como se observa nos três romances”, diz a Lourdes Louro.

            Ele conclui que “neste texto, mas por acharmos ser a mais exata para fechar a análise pode-se constatar que estudar os três romances nessa “perquirição” foi uma aprendizagem abalroada (em que) eu ia vislumbrando, talvez intuitivamente, o halo do “alifebata”, até desvendar a espinha dorsal do novo idioma: as letras lunares e solares, as sutilezas da gramática e da fonética que luziam em cada objeto exposto nas vitrinas ou visgado na penumbra dos quartos (RcO: p. 51) onde percebi e tive o prazer de (re)ver nas histórias hatounianas o (re)viver da vida amazônica.”

        O termo hermenêutica, num sentido mais radical, não quer dizer arte da interpretação, mas a tentativa de determinar a própria interpretação, a própria compreensão. E assim, a hermenêutica torna-se interpretação da compreensão ou “círculo hermenêutico”, pois toda compreensão apresenta uma estrutura circular: “Toda interpretação, para produzir compreensão, deve já ter compreendido o que vai interpretar.” O mundo, portanto, é o que se encontra no horizonte da compreensão. Nosso mundo é o que se encontra no horizonte de nossa compreensão, mas podemos alargá-lo, mediante a compreensão do outro, realizando então uma fusão de horizontes.

       O que deve ter norteado a dra. Lourdes Louro é compreender a nossa cidade de Manaus, estabelecendo e abrindo um mapa de sentidos, um roteiro no labirinto, do entrecruzamento de vidas, de relatos, de sofrimentos, um quadro que se amplia no espaço, no tempo, na profundidade dos sentimentos – os nichos e escondidos, as gavetas – as tensões, amizades, e tudo que constitui a vida, esse mistério. As estórias daqueles personagens naquela cidade única, cercada de floresta, rios e lagos. Através dos textos do Milton procurou o valor de sua própria vida, de sua humanidade, que é o que faz a hermenêutica. Toda pergunta busca essa impossível resposta nos fragmentos das recordações (e assim o livro é fragmentado).

        O livro de análise e leitura é propositalmente costurado em temas e lemas, em fatos e motes, em fantasmas, medos, vultos, sombras, pois em certa época (que eu conheci) não se podia andar à noite sem levar uma lanterna.

           Essa lanterna é o que busca o rumo do nosso destino.


Sobre Francisca de Lourdes Louro:

        De Manaus/ AM. Possui Pós-Doutorado em Sociedade e Cultura da Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Mestrado e Doutorado em Poética e Hermenêutica pela Universidade de Coimbra-Portugal. Especialista em Literatura Moderna e Pós-Moderna pela UFAM, Graduação em Letras – Língua e Literatura Portuguesa pela UFAM. Professora de Língua e Literatura Portuguesa da Secretaria de Educação do Estado do Amazonas (SEDUC/AM). A autora escreveu mais de uma dezena de artigos sobre a produção literária de autores amazonenses  que estão disponíveis em versão eletrônica pela internet. Em 2019, publicou o livro Manaus de dois rios, gentes e matas: literatura e geografia dos sentimentos, em parceria com José Aldemir de Oliveira. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Literaturas de Língua Portuguesa – GEPELIP e do Projeto Poesia, Prosa e Cinema no Amazonas: 1996-2016, ambos desenvolvidos na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), sob a coordenação da professora Dra. Rita Barbosa de Oliveira. É Membro do Grupo de Pesquisa – Estudos Semióticos: Literatura, Cultura e outras Artes (GES), do curso de Letras da Universidade do Estado do Amazonas – UEA, Coordenado pela Dra. Socorro Viana de Almeida. Publicou em parceria: com a Dra. Socorro Viana de Almeida :IMAGENS AMAZÔNICAS - Estudos de Semiótica, Poética e Hermenêutica.


Visite o o blog de Rogel Samuel AQUI.

terça-feira, 23 de novembro de 2021

ELES LEEM ELAS: FLOR DE LINZ, POR KRISHNAMURTI GÓES DOS ANJOS

 

ELES LEEM ELAS|08

Flor de Linz de Danielli Cavalcanti

CRÔNICA DE UMA MIGRANTE BRASILEIRA NA EUROPA

 

Por Krishnamurti Góes dos Anjos 

 

“Flor de Linz”, da escritora brasileira Danielli Cavalcanti, é livro que deveria ser lido e relido por aqueles que sonham com paraísos europeus onde tudo ‘floresce’ e a vida humana é plena de realizações e prosperidade. Tendo como palco o fictício café “Flor de Linz” existente na cidade austríaca de Linz e que se afigura como um ponto de apoio e encontro de imigrantes, uma voz narrativa (que traduz as experiências da própria autora que de fato ali residiu por anos), expõe o cotidiano dos migrantes, sobretudo brasileiros, que, por um motivo ou outro, acabaram indo dar com os costados naquelas paragens às margens do rio Danúbio.

Positivamente vivemos época em que a distinção entre “migrantes” e “refugiados” é cada vez mais tênue. De fato, vem ocorrendo no mundo uma forte mutabilidade e variedade dos fluxos migratórios, porque impulsionados por mudanças mais densas, imbricadas e complexas do que em épocas anteriores. São múltiplas as confluências e semelhanças entre ambos os conceitos e indiferenciadas muitas das causas e consequências desses fluxos. Difícil, muito mesmo, diferenciar movimentos “voluntários” dos “forçados” por guerras e/ou perseguições políticas, tal a natureza híbrida dos mesmos. Muitos dos migrantes “voluntários” – por vezes designados como migrantes econômicos – são na realidade “forçados” a deixar suas regiões de origem, devido a situações de grande privação (absoluta ou relativa), como parece ser caso da maioria dos migrantes brasileiros que optam por tal alternativa ante um quadro social extremamente instável, de avanços e recuos cada vez maiores no país.

A velha questão de ausência de perspectiva de melhoria de vida, aliada à um quadro de instabilidade, violência crescente, corrupção e crise constante, tem empurrado muitos às aventuras em terras europeias.Decorre de tal situação, que a vivência e convivência em tal ambiência é sempre marcada também por muito sofrimento físico e psíquico (pois o tal homo sapiens ainda acredita piamente que não existe paraíso sem serpente, e as vezes trabalha com afinco para que assim continue). As narrativas da senhora Danielli Cavalcanti, embora adornadas por uma tonalidade poética e por certo carinho pela cidade de Linz e alguns de seus habitantes mais cordiais, não esconde a brutalidade do racismo, o preconceito, e a imposição de uma mentalidade europeia que se pensa superior ao resto do mundo.

Há casos que beiram o cômico como é o caso de Açucena (os personagens femininos têm sempre nomes de flores) que se envolve em um triângulo amoroso que quase acaba em morte, ou o caso de Oleandro que precisou que uma pessoa austríaca falasse por ele – o simples sotaque estrangeiro por vezes é uma porta enorme bem trancada -, para fechar um contrato de locação de um imóvel. Interessante notar que, nesse caso específico, havia um amor em jogo, mais havia também outros interesses urgentes, e imagine-se o que é viver em tal condição:

“Para ela [a noiva], foi a forma de fazer diferença na vida de alguém. Para Oleandro foi a possibilidade de legalizar sua estadia e, finalmente, conseguir permissão para trabalhar e ter seguridade social. Sua emoção não cabia no coração. O Danúbio é testemunha das muitas vezes que Oleandro tremeu de tanto chorar as dores de anos trabalhando no submundo da construção civil. Durante todo o seu tempo de trabalhador indocumentado, teve sonhos destruídos e outros muitos adaptados.”O que pensar disto?

“Os ânimos a todo vapor me renderam duas visitas dos faróis azuis. Na primeira, controlaram minha permissão de estadia na Áustria e o alvará do café. Na segunda visita, as botinas pretas insaciáveis começaram a controlar as pessoas convidadas.”

Ainda pior: “Antes de abrir o café, eu tive um horário marcado no departamento para assuntos de imigração, para renovar meu título de residência permanente. Dessa vez, foi exigido também uma declaração de uma associação, que eu nunca ouvira falar, constando que eu não solicitara nenhum empréstimo bancário. E lá se foram 20 euros, para um papel comprovar que falei a verdade.”

Assombrosa a história de uma certa moça chamada Tulipa (brasileira), casada com um tal Hibisco (austríaco), que foi convidada para um jantar local. Observe-se uma a realidade que subjaz envolvendo mulheres migrantes. Primeiro a pergunta de uma ‘dama’ austríaca:“— Hibisco te escolheu de um catálogo, não foi?”, ante a estranheza que uma tal pergunta causou, veio a resposta:“— Sim, catálogo! Há muitos homens que não encontram mulheres aqui e as buscam de catálogos de outros países. Principalmente as mulheres do Sul são requisitadas pela sua submissão cultural.”

Há ainda outras observações que transmitem bem como é o dia a dia para os imigrantes:Na crônica “Florescimento contínuo” a tradução do que muitos europeus pensam sobre os migrantes: “Parece que, ao carimbarmos o passaporte num país estrangeiro, recebemos de cortesia o carimbo da menos valia, da incompetência. Por mais que nos esforcemos, nunca somos, suficientemente, bons.” Porque: “Nossas habilidades estão sempre sendo questionadas, quando não menosprezadas. Nossas capacidades subestimadas, ao ponto de sermos infantilizadas.”

Entretanto o livro, não trata somente de tristezas e desencantos, há espaço também para belos momentos de solidariedade a ajuda mútua, onde grandes amizades se constroem. Assim mesmo, cala forte nossas consciências quando lemos a crônica “Uma flor de jaçanã”, que narra toda aquela tragédia ocorrida bem na Áustria em 2015 (quem se lembra?), quando no final de agosto daquele ano, “um caminhão com 71 corpos foi encontrado numa autovia, e a Áustria sentiu o peso da presença daquelas vidas ausentes. Eram pessoas vindas na maioria, da Síria. Morreram asfixiadas, dentro de um caminhão, tentando atravessar a Áustria para chegarem à Alemanha.” Fica mesmo a terrível mácula, que o tempo não apaga, e que o texto refere com muita propriedade:

“E se tem que suportar o peso de suas almas gritando na consciência, e seus corpos expondo as crueldades de uma política de exploração e de extermínio. Chegam pelas águas como algas, estão em todos os lugares para nos lembrar do nosso fracasso como humanos.”




sexta-feira, 26 de março de 2021

Sharlene Serra, em Palavras e Trajetórias




 Mulheres & Trajetórias/01


Para ouvir o podcast do poema, clique AQUI.


Intensa


Meu nome é 

exagero

Sobrenome

superlativo

 

Nada é simples

ou pequeno,

tudo vasto

e divino

 

Lentes captam as palavras do dia

o "sou" irradia o lado

ampliado da  poesia

 

"Sol" maturidade

intensidade que se

oscila entre rios de risos,

lágrimas 

ousadia e

dores

 

Ignoro o raso

do vaso

busco o profundo

na alma das flores

 

Sou intensa

escrever  é lenha

nada é morno  ou

diminuto.

 

"Pólvoro" em segundos

Não escondo o percebido:

Meu olhar

é ampliado

Exponencial

voa além e

propaga  infinitos.

*** 

Sharlene Serra é especialista em Educação inclusiva, educadora, palestrante, escritora e poeta maranhense e vem conquistando uma carreira consistente na literatura, mediante um olhar social e transformador.

Possui como trabalho pioneiro a "Coleção Incluir", composta por 5 títulos  iniciais, que  abordam sobre a inclusão das pessoas com deficiência, onde apresenta, nas histórias, um convite que se abre a inúmeras formas de aprendizagem.

Em cada livro, passeia na simplicidade daquilo que precisa ser informado e, como poeta que é, costura sensibilidade em cada história.

Na coleção "Olhando com Ritinha", a personagem com deficiência visual enxerga com o coração; no "Ouvindo com Vitória", ela ouve com os olhos e fala com as mãos;  no "Caminhando com Paulo", o personagem caminha girando sua cadeira de rodas e ensina sobre acessibilidade  atitudinal; no "Aprendendo com Biel", a personagem  com síndrome de down, nos ensina que ninguém aprende igual e no "Interagindo com Lucas", a personagem nos mostra que existem várias formas de sentir o mundo. É  nessa forma lúdica e poética, que Sharlene descreve a COLEÇÃO INCLUIR. A coleção passou a ser fonte inesgotável do aprendizado das convivências, onde reconhecer o outro, exercitar a empatia, o respeito às diferenças e aos valores morais são objetivos fundamentais do projeto, já que visa conscientizar e humanizar toda a sociedade, trabalhando, através da literatura, a inclusão.

A literatura da escritora Sharlene Serra tem um olhar social e transformador e, além da "Coleção Incluir", ela nos apresentou outro aspecto importante,  que precisa ser abordado , o tema sobre abuso infantil que consta no livro “Diário Mágico - um segredo para contar", o qual pode ser considerado como uma ferramenta de proteção às crianças. O livro faz referência também a um ‘diário’, como forma de resgate das memórias, da história e da escrita. E no final da obra, ela traz uma lista dos órgãos responsáveis para a efetivação de denúncias de violências contra abusos infantis.

Sharlene Serra é membro da APB Academia Poética Brasileira de Curitiba, Vice presidente da Associação de jornalista e escritoras do Brasil-MA , Membro da União Brasileira de Escritores e da Associação de Cultura Latina.

A autora esteve nas Bienais do Livro do Ceará e Pernambuco e Fortaleza,  recebeu menção de aplausos sendo inspiração para o dia municipal da Literatura inclusiva. Possui participações em várias Antologias. Os livros estão  nas escolas particulares de São Luís e de outros Estados.

Sharlene Serra foi uma das 25 homenageadas pela biblioteca Pública Benedito Leite,  recebeu o certificado de reconhecimento pela OAB pela sua atuação na defesa dos direitos humanos de crianças e adolescentes, e recebeu o certificado de homenagem “Amiga da Leitura Maria Firmina dos Reis”, através da rede de Bibliotecas Comunitárias, ilha Literária, pelo reconhecimento da sua atuação em prol da literatura infanto-juvenil. Em 2018, foi homenageada com o prêmio Estrela Literária Recife-PE. Em 2019,  recebeu prêmio Monteiro Lobato em Búzios, na categoria Melhor livro de inclusão. Escritora homenageada da FLICT, Feira de Livro de Caxias-MA. 

Seu livros foram mencionados, em rede Nacional, no programa "Encontro", de Fátima Bernades.

Lançou  pela editora Penalux o livro "Espelhos de Eva" (2019), que aborda o universo feminino. Participações em Antologias 2020: selecionada pela editora Trevo, pela “Coletânea Enluaradas I: Se Essa Lua Fosse Nossa”, pelo Mulherio das Letras, prêmio Literart  de Melhor Prosa Poética, entre outros.

Sobre planos, Sharlene Serra entrará em 2021 no mercado digital com novas histórias em e-books, além de livros impressos voltados para literatura infantil e outro sobre poemas autorais.

Ela nos diz: Escrevo o que vejo, ouço ou vivencio em mim ou nos outros. A minha escrita pulsa.



quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

ELES LEEM ELAS: BORDADOS, POR KRISHNAMURTI GÓES DOS ANJOS


ELES LEEM ELAS/06

BORDADOS: MESCLA DE GÊNEROS E SUBGÊNEROS LITERÁRIOS, A FUSÃO E TRANS-FUSÃO DE POESIA E PROSA, de Roberta Gasparotto


A cada dia, parece-nos, perdemos aquela antiga proposta crítica estável, firme, inflexível, em relação à literatura, enfraquecendo-se a confiança em modelos muito formalizados. Estamos vivendo uma mudança de paradigmas em todos os níveis do conhecimento humano, situação que propicia, por sua vez, uma visão mais complexa, teoricamente falando. Voltamo-nos ao necessário diálogo que cada crítico estabelece com o seu objeto, na busca da elucidação das questões que, no seu desafio, a obra lhe propõe. Isto não é propriamente uma novidade, vem de certo tempo à esta parte. Desde meados do século XIX, com Baudelaire, Mallarmé, Rimbaud e companhia. O poema em prosa (e leia-se também a prosa poética), tornou-se uma terceira via da modernidade literária, a ponto de suscitar uma trajetória e tradição próprias desde então. Talvez como resposta ao dilema da expressividade poética. Vale a pena atentar para uma linhagem de textos contemporâneos que revelam algumas características em comum. Inspirados por forte carga subjetiva, apresentam uma linguagem despida de requintes e próxima da anotação íntima: mas com alta dose de reflexão. Importante referir que a atitude meditativa não provoca necessariamente uma depreciação do efeito poético. O ato de refletir implica alguma complexidade; esboça-se a partir de operações entrecruzadas, envolvendo ao mesmo tempo as capacidades de perceber, duvidar, julgar, raciocinar – mistura que se resolve na singularidade do poema. Essa perspectiva permite ao sujeito lírico ocupar a centralidade do texto e despertar as associações que lhe interessam ou cativam. 

Paralelamente a isto, vivemos em uma sociedade de escala global. que ignora os sintomas e o sofrimento advindos de relações humanas desencontradas, do pouco caso com a natureza que nos sustém, e finalmente, assistimos perplexos a deterioração e decadência do humano, mesmo em face de tanto desenvolvimento tecnológico. Por cima, tome-lhe coice com a tal da pandemia monstruosa.  

O tempo torna-se algo efêmero e impreciso, em virtude da velocidade dos acontecimentos e da multiplicidade de possibilidades que se oferecem aos nossos olhos. Parece-nos que, ou melhor; plantam em nossas consciências a sensação de liberdade individual plena, tão sonhada durante tanto tempo. Liberdade esta que mostra-se carente de referenciais sólidos, tornando cada vez mais difícil a visualização de um ponto norteador, algo que indique uma coisa semelhante a um sentimento de certeza para o sujeito em suas escolhas. Nessa perspectiva, a Pós-Modernidade oferta aos indivíduos uma liberdade aparente à custa de um sentimento de insegurança generalizada, e dessa forma, o mal-estar vai se caracterizando pela liberdade fluida, e não pela opressão e repressão de outrora. Desamparo no sentido de que carecemos de referências sólidas de identificação, uma vez que se tornou impossível fixar-se a um determinado tipo de identidade em um cenário em que a transitoriedade dos referenciais é perpétua e contínua. Viceja por seu turno, a violência de todos os tipos, às vezes chegando às raias do terrorismo, fruto de uma sociedade desigual onde a desconsideração com o outro incentiva práticas intolerantes e retaliadoras. 

Voltemos ao poema em prosa produzido aqui e agora, em um meio como este no qual “o real está demasiado posto e nos encara com olhos esbugalhados” e que o sentimento forte que nos assedia é “sentir profundamente a impotência, o nojo e a vergonha de ser... [humano]”. Os textos de “Bordados” da escritora Roberta Gasparotto, recentemente editado pela Camino Editorial do Rio Grande do Sul, nutrem-se de algumas conquistas radicais como a mescla de gêneros e subgêneros literários, a fusão e trans-fusão de poesia e prosa, verdadeiros vasos comunicantes que forjam os vários modos de poetização/liricização da prosa e de prosificação da poesia lírica. A obra que foi publicada em formato e-book revela uma escrita concisa – e contraditoriamente sentenciosa –, interessada muitas vezes em registrar o flagrante da subjetividade em face da circunstância real ou imaginária. Ou por outras palavras: o poema se transforma em "pequena reflexão”, deslizando para um tom sem ornamentos, acionando uma sensibilidade aguda e sintética.

Encontramos na obra uma mistura de tendências estéticas.  Alguns textos de caráter intimista, misturados a outros com temáticas cotidianas e de engajamento social, notadamente com relação à situação da mulher ante o mundo, (não necessariamente de um feminismo militante), há ainda os de formato reduzido, quase poemas frasais. Em Roberta Gasparotto, observamos ainda o uso constante de reticências que não indicam propriamente divagações da voz poética, ou desvio na linha do pensamento, mas sugerem uma continuidade daquilo que é realmente dito, indicando que a ideia que se pretende exprimir não se completa com o término do verso, a qual só pode ser feita pela imaginação do leitor. Senão vejamos:

 

Nascimento – p. 15.

 

quem sabe um dia retornaremos à vida embrionária

:pulsante, caótica e organizadora de tudo.

quem sabe um dia retornaremos ao útero da terra

:repleto de contrações e expansões onde os espasmos moldam a

experiência.

quem sabe um dia aprenderemos com a nossa mais remota vivência

:respiração primeva onde a lancinante dor de receber o ar não nos

impediu de sentir o seu frescor.

quem sabe um dia retornaremos à transparência do líquido e à

opacidade placentária

:aquele lugar onde nada se exclui, porque tudo é parte integrante da

jornada.

quem sabe um dia deixaremos de ser tão miseráveis

:apego ignóbil.

um dia, teceremos com cordões de barro nossas próprias asas e

contemplaremos os voos alheios com a alegria de quem conhece a

liberdade de ser pássaro

...

...

errante.

 

O amor não aceita desaforo – p. 34.

 

a esposa queria muito ficar famosa. ou, ao menos, conhecida. estava

cansada de viver à sombra do marido

.

o marido queria mais e mais dinheiro. e, claro, topou na hora ajudar a

esposa a ficar famosa

.

o amante da mulher, de repente, se viu de escanteio. aquele amor,

antes tão caloroso, não encontrou mais lugar frente a tantos devaneios

.

a amante do marido, se sentindo extremamente só, abandonou aquele

homem que, durante anos, lhe provocou incêndios

.

- o amor não aceita desaforo

 

pacto social – p.44.

 

deve haver algum pacto em curso

de todos aceitarmos a morte em vida

mutilação de sonhos

de emoções

a vida transborda

borbulha

faz barulho e incomoda

a morte não

a morte é quieta

temos tanto medo de morrer, sem saber que a morte há tempos nos

invade...

e ronda nossas faces covardes.

 

A simbiose entre prosa e poesia nessa autora, assume a ótica subjetiva para emoldurar o conteúdo objetivo (ou imaginário) ao seu gosto e sentido. À sua maneira, atualiza o desafio de urdir uma escrita voltada para reproduzir os movimentos líricos da alma, seus sobressaltos de consciência e questionamentos, neste nosso mundo conturbadíssimo. Vale salientar, todavia, que a quantidade diminuta de textos reunidos na obra, causam no leitor aquela sensação de “quero mais”, pelo que torcemos para que a autora nos brinde em breve, com novas produções.


Livro: “Bordados” – Poesia de Roberta Gasparotto 1ª edição- 2021 - Camino Editorial  – Viamão – RS -  53 p.  

ISBN:  978-65-00-15429-0



terça-feira, 29 de dezembro de 2020

A Mulher de Todos os Dias


 

Conto/01


Por Ana Dietmüller


Dia agitado na organização que presta serviços de aconselhamento jurídico a refugiados e imigrantes.

Nos últimos minutos de expediente adentra um rapaz de semblante grave, mas bastante educado e com bom entendimento da língua do país onde estava agora residindo.

- Bom dia, senhora. Gostaria de saber o que é necessário para trazer minha esposa, que ficou no Afeganistão.

A jurista explica todo o procedimento e os requisitos obrigatórios a serem cumpridos a fim de possibilitarem a vinda da esposa. Legalmente, tudo correto e a documentação trazida para conferência estava, da mesma forma, dentro do exigido. O marido - originalmente refugiado sírio - já residia há anos no país europeu que lhe conferiu asilo; já exercia trabalho remunerado e ganhava o suficiente para demonstrar às autoridades que tinha reais condições de trazer sua esposa para morar consigo.

Com a resposta da profissional, o consultante demonstrou alívio, mas um único detalhe foi suficiente para que retomasse o semblante grave: era também requisito obrigatório que a esposa fosse, pessoalmente, à embaixada do país que receberia o pedido de reunião familiar para entrega da documentação.

- Meu Deus, minha esposa terá de ir pessoalmente e fazer tudo sozinha?

- Sim, senhor. Do contrário, o processo não será aceito se for feito através de advogado ou terceira pessoa. Precisa ser sua esposa em pessoa.

- Sabe, senhora, por isso meu desejo em tirá-la de lá o mais rápido possível: ela, obviamente, fará tudo o que eu disser ou meu pai ou meu irmão, mas não terá muito domínio do que estará fazendo. Ela irá pessoalmente, mas, com toda a certeza, terá de ser acompanhada por um homem, porque lá as coisas funcionam assim ainda, infelizmente. Quero deixar tudo o mais “mastigado” possível no intuito de evitar complicações que ela não terá condição de resolver, por mais simples que sejam. Por isso, também, todo meu esforço em trazê-la: para que veja que as mulheres têm direitos, liberdade e podem resolver coisas quotidianas por si mesmas!

Após preencher os últimos documentos e o breve desabafo, o marido despediu-se, agradecendo a consultoria prestada.

A jurista, acostumada à repetição mecânica, diária e profissional do “sua esposa precisa ir pessoalmente”, deu-se conta de que, até então, jamais havia pensado sob esse prisma. Suspirou, silenciou e tergiversou: “a mulher, de todos os dias, que somos aqui, não é a mesma mulher, de todos os dias, de lá. Triste!”

Envolta em pensamentos, fechou a porta atrás de si e rumou para casa!





Feminário Conexões, o blog que conecta você!

CRÔNICAS DA SUSTÂNCIA - HISTÓRIAS DE MINHA MÃE: a curva da Velha Beta... Por Rosangela Marquezi

CRÔNICAS DA SUSTÂNCIA /05   HISTÓRIAS DE MINHA MÃE: A CURVA DA VELHA BETA Rosangela Marquezi Minha mãe... Que ainda brinca! Fonte: Arquivo p...