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quinta-feira, 12 de junho de 2025

CARTA A QUEM DESEJA MEU SILÊNCIO

Por Cíntia Colares (Flor de Lótus)


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Na primeira vez que me violentaram, eu era uma menina.

E calei pelo medo e vergonha.

Na segunda vez que sofri violência, passei anos sofrendo um duro assédio moral e sexual num ambiente que deveria ser seguro. Apesar de ter sido aprovada num concurso para funcionária pública federal, morri um pouco a cada dia enquanto tentava sobreviver para garantir o sustento do meu filho.

Não calei, mas paguei caro por ousar denunciar velhas práticas e por não ceder ao assédio. Na terceira vez que sofri violência foi onde buscava construir outro mundo possível. Quando busquei voz e poder de decisão como os demais, ouvi que deveria me pôr no meu lugar.

O meu lugar e o de todos nós: pessoas negras, mulheres, indígenas é onde a gente quiser e reivindicar. É onde a vida acontece e está sendo decidida.

Nada mais sobre nós sem nós.

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Não me calo, não silencio, não dou manutenção ao que não quero que siga acontecendo. Meus gritos já denunciaram violência sexual, política, verbal, psicológica e até ameaças de agressão física que sofri e vão ficar na memória daquele contraditório espaço dito de luta. Ainda temos muito que lutar por equidade de gênero, raça e diversidade.

De minha parte, muitos gritos mais ainda serão ouvidos até que me escutem e me vejam estar presente nos espaços e nas decisões.

E nunca mais calarei.

Porque minhas dores gritam em mim até no silêncio. No olhar que fere, na boca que nos enxota.

Não estarei olhando do lado de fora e não estarei em silêncio do lado de dentro, fazendo apenas figuração para aliviar suas consciências.”

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Arquivo da Autora


Cíntia Colares (Flor de Lótus) é uma mulher preta cis, jornalista, poeta e coautora em coletâneas, antologias, revistas e sites de poesia. É ativista no antirracismo e mãe solo de um adolescente negro, morando na periferia de Porto Alegre/RS.


Obrigada por ler até aqui  “Sou Flor de Lótus🪷

segunda-feira, 9 de junho de 2025

ÀS VEZES AGENDO MEU CHORO

Por Cíntia Colares 


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Esses dias eu estava ouvindo aquela música que a letra diz: “Às vezes eu quero chorar, mas o dia amanhece e eu esqueço…”

Lembrei o quanto essa letra sempre me toca. 

Me veio a lembrança de quantas vezes quis chorar, mas…

Agora não…

estou na rua…

Agora não…

…não vou chorar na frente dessa pessoa…

(ainda que a pessoa esteja me dando todos os motivos para chorar)

Agora não…

deixa não ter ninguém por perto… 

Agora não...

não adianta chorar escondido…vai voltar com os olhos vermelhos…vão perceber…não fica bem…

Agora não…

Preciso buscar meu filho, preciso transmitir alegria quando nos reencontrarmos depois de passarmos o dia inteiro longe…

Agora não…

o ônibus tá lotado…alguém vai ver…

Agora não…

deixa chegar em casa…

Agora não…

deixa atender meu filho primeiro…

Agora não….

Espera meu filho não estar por perto…

Agora não…

Tomara que você durma logo, filho…

Agora não…

preciso tanto chorar, mas na tua frente não….

Agora não…

eu precisava tanto chorar hoje…está entalado…

Agora não…

Um novo dia vai começar. 

Preciso me levantar e não dá mais tempo pra chorar.

Os dias correm assim.

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Às vezes agendo meu choro e não compareço ao meu próprio evento, porque sempre tem algo ou muitos "algos" ao meu redor que não me permitem olhar para mim ou me sentir. 

Porque antes de pensar em mim, eu preciso dar conta, resolver, prevenir, ensinar, acolher, tratar, corrigir, aguentar, quebrar as molduras que insistem em tentar me enquadrar e preciso, principalmente, manter viva a crença de que valerá a pena lutar por mudanças, que é para eu não andar por aí morta em vida.

No meio desse turbilhão cotidiano, até eu conseguir algum tempo pra mim, o choro já empedrou por dentro e me endureceu também por fora.

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Sou Cíntia Colares, sou Flor de Lótus 🪷

segunda-feira, 2 de junho de 2025

"ESCAPA PELOS DEDOS COMO AREIA", POR MEIRE MARION

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PALAVRA FRACA

Por  Meire Marion

Coração se divide em dois

Duas partes que eram uma

Através de uma carta gelada e sem vida

Tudo o que compartilhamos foi desfeito.

 

A tristeza me atinge intensamente

Duro como uma pedra pesada

Amor não é uma palavra forte o suficiente.

Agora, quem vai me dar um ombro?

 

Tentando compreender onde tudo deu errado

Escapa pelos meus dedos como areia

Enquanto as chamas em meu coração queimam, queimam, queimam

O rádio toca uma música da nossa banda favorita

 

Lágrimas encharcaram meu travesseiro enquanto tentei dormir

Dormi profundamente no abismo tão profundo.

Um lembrete de como ações são mais fortes que palavras.


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Arquivo da autora


Meire Marion é professora de inglês, língua e literatura, escritora e poeta. É diretora da UBE (União Brasileira de Escritores), responsável pelo Prêmio Cláudio Willer de poesia. Têm sete livros para crianças publicados pela Editora Scortecci. É colunista da Revista Voo Livre de literatura. Também participa de diversas antologias com poemas e contos.

terça-feira, 13 de maio de 2025

PARA SE DIZER ANTIRRACISTA É PRECISO AGIR***, POR CÍNTIA COLARES

Por Cíntia Colares 

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Chega o mês de maio e então todos lembram de falar sobre questões raciais em função da data da falsa abolição. Depois vem novembro e aí sim o frenesi aumenta. Depois parece que a gente deixa de existir. Parece que as mudanças na sociedade racista em que vivemos deixam de ter urgência novamente. Então chega marco do outro ano já. Todo dia 8 de março recebemos muitas mensagens de feliz dia da Mulher. 

Quando explicamos que essas não são datas ou mês lúdicos e sim de luta e reflexões, ainda somos taxadas de 'desmancha prazeres': "custava sorrir e agradecer?" Nessa pergunta, faltou nos dizer: e silenciar... e manter tudo como está. Pois não silencio. Falo cotidianamente contra essas estruturas que tentam nos oprimir e manter os privilégios do patriarcado e da branquitude em dia.

De março a março são negadas oportunidades a mulheres negras porque ainda esperam que a gente ocupe apenas posições de subserviência. Em outras palavras, nos tratam como se não pudéssemos desempenhar funções intelectuais ou de liderança e tivéssemos um perfil engessado para somente servir.

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Esses dias li um comentário que me chamou atenção. O comentário dizia que falas sobre situações de racismo não traziam nenhuma surpresa nos dias de hoje. A pessoa contava que já havia decidido de uns tempos pra cá ser antirracista e que, inclusive, é preciso agir urgentemente. Fiquei pensando sobre. 

Sabe, relatos de situações de racismo me surpreendem. Mesmo eu sendo uma mulher negra, ou seja, vivenciando situações de racismo desde criança, ainda assim as falas de outras pessoas negras e a maneira como alguns autores descrevem a engrenagem de como o racismo e o pacto da branquitude acontecem no cotidiano me surpreendem.

Sabe porque me surpreendem? 

Porque fico me interrogando: como essas situações ainda se reproduzem?

Como não foi visto ainda que é preciso agir para combater situações tão desumanizantes? 

Como algumas pessoas passam a vida toda sem se dar conta de uma desigualdade tão gritante como se fosse normal nos verem majoritariamente em situações de subserviência no mercado de trabalho, por exemplo, uma situação que todos vivenciam e não tem como não ver a desigualdade de posições. 

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Será que uma vida inteira não se perguntaram o porquê disso? Ou quiseram acreditar que era normal porque era cômodo não pensar sobre seus privilégios e dá trabalho se mexer para agir contra esses absurdos? 

A nós, pessoas negras, eram negadas oportunidades e voz nos espaços de decisão, mas e as pessoas brancas que sempre tiveram acesso aos melhores estudos, livros, debates sobre a sociedade e ainda assim não pensaram sobre isso e não agiram contra uma vida inteira? 

A mim sempre espanta. Desde sempre não consigo ver a desumanização de alguém e ficar impávida. E assim criei meu filho para sempre pensar em que mundo vive, com quem convive em sociedade e como estão sendo tratadas as pessoas nessa sociedade. 

Ter esse olhar que humaniza já teria despertado ações antirracistas há décadas, séculos, mas há pessoas que passam a vida sem nos ver. Somos desumanizados desde que jogaram nossos antepassados aqui. 

O racismo nunca deixou de existir, apenas se adaptou a cada época. Então cada vez que ouço um relato de racismo me surpreende que as pessoas brancas ainda tenham a coragem de praticar tantas desumanidades. 

É por conta desse olhar, que nos desumaniza, que a gente ainda passa por situações de racismo, nossos filhos passarão, nossos pais passaram e nossos netos ainda sentirão essas dores. 

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Perceba a carga de cada relato de racismo que você ouvir ou ler. Cada relato é sobre oportunidades que nos são tiradas pelas características da nossa pele, cabelo, nariz, enfim por existirmos. Esses relatos são sobre as consequências dessa perversa invisibilização das pessoas negras e de tudo o que vivemos desde que nossos ancestrais foram sequestrados de África e jogados aqui para exploração de nossa força e anulação de nossa condição humana. 

Hoje não é na senzala que nos prendem, mas basta ler o Pacto da Branquitude de Cida Bento e outras tantas obras que analisam a sociedade em que vivemos para saber onde ainda nos prendem e de que forma ainda açoitam nossa pele. 

Essa situação não começou agora e nem de uns tempos pra cá. Situações de racismo são vivenciadas de maneira escancarada desde sempre. E no entanto, às vezes, leva uma vida para as pessoas brancas pararem para pensar o que acontece conosco há séculos e o que podem fazer para combater? 

Por isso o slogan “Vidas Negras Importam”. Não quer dizer que outras vidas não importam. É uma afirmação que tenta construir a narrativa de que nossas vidas importam, porque cotidianamente a branquitude nos diz que não importamos. É como se o que fazem conosco não estivesse sendo feito com seres humanos. 

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Se a gente der sorte, um dia vem o estalo que é preciso falar sobre a desumanização e apagamento que tentam fazer conosco. Até lá, via de regra, nas situações de racismo, a vítima se insurge sozinha e ainda tentam taxá-la de exagerada, barraqueira, vitimista ou paranóica. 

Quando nos dizem que não tinham pensado antes em tudo isso que a gente passa durante a vida toda, às vezes, a sensação que dá é que a gente não existia para essas pessoas. Por isso, eu sempre me surpreendo com as falas. Me surpreendo, me indigno e me pergunto: como as pessoas brancas "não viram" o racismo antes e que era urgente agir? O racismo não começou a existir de uns tempos para cá. Essa urgência não é de hoje. Quando cada um de nós que está lendo essa reflexão agora nasceu, essa urgência já existia.

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***Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do blog Feminário Conexões.

Arquivo da autora
Cíntia Colares (Flor de Lótus),mulher preta cis, jornalista (Mtb 11082), poeta, ultimamente anda se expressando em forma de crônicas e contos também. Coautora em coletâneas, antologias, revistas e sites de poesia, coletivos como o Enluaradas e 20 Poemas Para Novembro. Ativista no antirracismo, mãe solo de um adolescente negro, mora na periferia de Porto Alegre/RS. @jornalistacintiacolares 

"Escrevo para buscar me aquilombar com mãos e vozes para desconstruir o que está posto na sociedade em que vivemos e construir o que precisamos para termos direito a oportunidade de viver com dignidade e não apenas sobreviver."



sexta-feira, 9 de maio de 2025

ENTRE LINHAS E CORDAS, LIVRO DE VALÉRIA PISAURO

UM CORAÇÃO EM SOL MAIOR  (Por Marta Cortezão)

Palavra cantada é palavra voando.

{James Joyce}

Arquivo da autora
Entre linhas e cordas, de Valéria Pisauro, revela um caminho estreito que aproxima palavra e som e dá asas a inúmeras imagens poéticas, comparações e metáforas. Nestas linhas e cordas, de Valéria Pisauro, a poesia está contaminada de musicalidade. De um lado, a poesia e sua natureza verbal; do outro, a música com sua natureza sonora. Duas artes distintas, de caráter único e contraditório, mas completamente correlatas. Uma relação que surge desde a própria origem cantada da poesia e que se amplia nas cantigas poéticas e melodiosas de trovadores ou menestréis para nos legar as canções populares e seguir, cada uma, seu caminho, suscitando acaloradas e recentes discussões entre poesia e música na contemporaneidade. Entretanto, em Entre linhas e cordas, esta relação expõe um sem-fim de possíveis aproximações entre palavra e música, ainda que na contramão (p. 21) de “um violão sem cordas, reverso do verso, / Coroa e cara em inversão”, porque assim como o paradoxo vocábulo-som, “somos guerra e flor, / Acordes de silêncio, / Rima sem poesia, / Refrão sem música”.

Arquivo da autora
Ler Pisauro é dedilhar as cinco linhas de um pentagrama e sentir o calor vibrante de uma clave de sol; é percorrer as palavras, os meandros de seus versos, sussurrando o princípio-fim de um ruído para saborear tons e semitons de suas metáforas ascendentes ou descendentes; é glosar o mote de um humano coração em Sol Maior, em uma sequência completa de todas as notas para perceber, de ouvido, a (des)afinação das cordas que movimentam o mundo:

“Meu canto é poema, é seca, é fome

Estancado nos olhos dos homens, dos homens!” (Bate Tambor, p. 40)

 

“Não risca o risco da hipocrisia.

No meio da praça, no inteiro da raça,

Nas ruas, nos guetos, nas chacinas,

Marginais no anonimato dos jornais.” (Cruz, p. 59)

 

“E nos fios, corais de pássaros

Regem a aresta do cotidiano

Sonhos em Sol Maior

O silêncio é outro engano.” (Aresta, p. 108)

 

“Quero o teu beijo cifrado (...)

Amor bemol e sustenido,

Com o arco e o violino,

Com todos talvez e então...

Acorde sonante,

Que afina minha canção.” (Afinação, p. 116)

 

“No banco do jardim público

Raiz de pedra

Há na luz uma cor amarga

De quem vive às margens

Entre escombros da cegueira

Sob os pés de quem passa.” (Jardim, p. 149)


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Nesse compasso Entre linhas e cordas, também se percebe a presença de uma poeta admiradora e conhecedora da cultura brasileira. Não é à toa que o primeiro poema que abre o livro é Antropomorfose Brasileira (p. 17)! Nele, a voz lírica passeia pelo Brasil cultural, literário, musical e poético. O Brasil que abraça e acolhe a sua rica diversidade, é o Brasil ideal que se harmoniza em suas diferenças feito som e palavra:

“De Macunaíma sou cria,

Antropofagia, Abaporu,

Bicho-do-mato, tupiniquim,

Grão da massa, Jeca Tatu.

Dom Quixote brasileiro,

Poeta louco, botequim.

(...)

Não ouvi o cantar do sabiá.

As pedras do meu caminho,

Deixei pela estrada, aprendi apreciar,

Deixei tudo a Deus dará, oxalá!”.

Arquivo da autora
Ser cria de Macunaíma –personagem anti-herói, criado por Mário de Andrade–, vai além do significado histórico-literário-cultural e alcança um outro de grande valia, que se reconhece e se encontra no elo perdido de suas raízes ancestrais. Assim como Macunaíma, a voz lírica, no poema Muiraquitã (p.64) de forte estribilho, parte em busca do amuleto extraviado, que, aqui, representa o legado-manifesto de um Matriarcado Pindorama de mulheres guerreiras, as Icamiabas:

“No espelho da lua cheia,

Penitentes castas arqueiras,

Desciam de Iaci-Taperê,

Com mil flechas certeiras.

Purificação a noite inteira,

Que do ventre da terra sorri,

São amazonas guerreiras,

Cantos de carícias plenas,  

Da guerreira nação Tupi.

São amazonas guerreiras,

Cantos de carícias plenas,

Da guerreira nação Tupi.”       

Arquivo da autora

E de uma Pauliceia Tupiniquim (p. 131) da contemporaneidade se pode ouvir o canto lamentoso de uma “Cidade-Mãe, de braços de concreto”, prestes a ser devorada pelo neoliberalismo dominante e nefasto e que agoniza nas mazelas sociais, essa “fumaça que embaça o amanhã”: “Madrasta que abraça toda raça, / Herança que não muda de mãos. / Cidade-realidade, sonho de diversidade, / Disneylândia periférica, favelas alçadas / Cassetetes, Cracolândia, Anhangabaú / E os meninos passeiam seminus pelas calçadas.”. Em contrapartida há as Manhãs de Minas (p. 127) que “Despertam o aroma, a melodia”. Uma Minas Gerais da infância da voz lírica, através da qual “a vida renasce todos os dias”. São as “Manhãs meninas, manhãs de Minas.”. 

A poética de Pisauro é uma sonata estradeira em versos que evidencia um Brasil profundo, marcado por um compasso particular, diverso e vertical, de temporalidades histórico-poéticas. Entre linhas e cordas é também convocação, compromisso humano, engajamento, solidariedade política entre mulheres, essência e amor necessários:

“Na esteira das grandes cheias

Ribeirinhas bailarinas cativeiras

Pele vermelha, mulher-sereia

A cantarolar nas beiras dos rios.

Filhas de velhas benzedeiras

Olha o azul sonha com o mar

Correnteza de oferendas

Nas águas de todo lugar.” (Rede de Rezas, p. 56)

 

“Dentro de mim liberdade

Tarsilas, Severinas, Marias

Cativas, sagradas e profanas (...)

Múltiplas que choram e riem

Ramos cortados que insistem em florir.” (Múltiplas, p. 77)

 

“Ela é mulher, é quem ela quer,

Ela dança com as ninfas,

 

Já teve família, sonhou menina,

Hoje, Maria de todos os dias,

Dos solitários, a companheira,

Dos abandonados, a alegria.

É novela e favela, é fantasia.

Na calçada é plateia, dama, meretriz,” (Quem Ela Quer, p. 87)

 

“Giram saias rendadas

No terreiro, na senzala

Lendas e causos em Iorubá

Sonhos antigos afogados” (África Distante, p. 198)

Findo este itinerário com a força da “palavra cantada” repousando no ninho que levo no peito, agora embevecido pelas relevantes pausas necessárias que fui amealhando pelo caminho. É tempo de um silêncio providencial para libertar a palavra da opressão de ser verbo, porque o poema também se cansa, está sem voz, sem melodia, Sem pauta (p. 191): “o poema está com fome, de vida, do homem, / Sem pauta vagueia distraído, / Marca passo das trincheiras, / Sem espaço em linhas vazias.”. A você que chegou agora, siga a dica de viagem, pois é sabido que a “poesia arde, salva uma vez mais”, portanto, Pisaurize-se!

A aquisição de livros é diretamente com a autora via redes sociais
Acompanhe a produção musical de Valéria Pisauro pelo Youtube e Spotify!
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PISAURO, Valéria. Entre linhas e cordas. Jundiaí (SP): Telucazu Ediçoes, 2023.

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Arquivo da autora
Valéria Pisauro nasceu em Campinas-SP, exerce intensa atividade cultural na literatura e na música, como professora, pesquisadora, palestrante, poeta, contista, cronista, roteirista e letrista musical. Graduada em Letras e em História da Arte, a escritora trafega com muita personalidade, versatilidade e desenvoltura por uma criaçao artística, que vem angariando críticas positivas, rendendo à poeta um lugar de destaque no cenário poético e musical brasileiro. o requinte de suas poesias/letras prima pela pluralidade de recursos, fruto de pesquisas, onde a variaçao de estilos traduz a força e a leveza de um trabalho sofisticadamente inovador, pendulando com naturalidade entre o rebuscamento e o coloquial. Participa de certames culturais, concursos literários e de reconhecidos festivais de música, tendo a felicidade de ter sido premiada em muitos deles.

quarta-feira, 7 de maio de 2025

CHÃO ANCESTRAL, DE MARGARIDA MONTEJANO

 E L A   A C E N D E   O   M U N D O   C O M   A    V O Z

Por Marta Cortezão

Chão ancestral é o primeiro livro de poemas de Margarida Montejano, cujo título evoca profunda simbologia: a terra como esse chão sagrado que ordena o mundo vivo com seu caráter divino e sua função maternal, administrando o mistério vida-morte-vida. Uma Terra Sagrada que agoniza e definha nas mãos desumanas da cobiça pelo “líquido lucro/ extraído pelo bruto”; o bruto e histriônico ser humano que, acometido pela cegueira e selvageria do capital, interpreta, sob os holofotes do mundo, a clássica farsa de “estancar a hemorragia/ com cuspe e panos quentes” (p.19), enquanto a fome e a guerra assolam o mundo.

TERRA SAGRADA

estancar a hemorragia

dos corpos suados

da terra sagrada

das matas, dos rios

das rochas rachadas

 

estancar a hemorragia

dos olhos encharcados

das ruas inchadas

 


das águas sagradas

 

do líquido lucro

extraído pelo bruto

 

estancar a hemorragia

com cuspe e panos quentes


Através de uma linguagem aparentemente simples capaz de emocionar pela destreza, fluidez e amabilidade poéticas, este livro revela plurissignificativa união entre palavras e fotografias abocanhadas da realidade. E, nesse exercício de encaixe e desencaixe, vai construindo um fino diálogo com a estética do impacto, onde os contraditórios se chocam e as semelhanças ganham resistência para trazer à tona o despertar da necessária consciência, porque “Toda a nossa história é a mesma história. A história do chão” (p. 83). É urgente desvendar os olhos e sair “deste lugar/ onde te calaram”, nem que para isso seja necessário Nascer pela segunda vez, “nascer de novo, de novo e de novo/ Nascer pela segunda vez, mas agora/ do lado certo da história!” (p. 93).


Montejano conduz a voz lírica, serena, sábia e implacável da Deusa. Essa voz oracular inconfundível, que munida de conhecimento profundo sobre o desconcerto do mundo, traça um mar de versos catárticos onde a face da crua dor se vê refletida. Entretanto, temas tão profundos e universais como o amor e a esperança ganham espaço no cenário de Chão ancestral, eles surgem especialmente da herança deixada pelas bruxas às crias das bruxas contemporâneas: “temos em nós…/ a intuição constante/ (...) a magia para sobreviver/ …das bruxas// herdamos delas/ a matéria que não se esgarça// (...) o tecido da vida/ para curar a história// sarar os males/ combater o ódio/ o machismo insano/ as guerras por terras” (p. 57). Somos “um sonho/ da Deusa”, somos sim as crias das bruxas, mulheres grávidas de Consciência no “meio da insanidade/ dos homens”, mulheres que carregam “o futuro/ do mundo” (p. 31).

HERANÇA

desvendamos as linhas das mãos,

lemos o incerto nas fases da lua,

adivinhamos tempestades

para entender o amanhã

 

temos em nós...

a intuição constante,

o canto profundo,

a reza certeira,

as mãos benzedeiras

a magia para sobreviver

                         ...das bruxas

 

herdamos a matéria que não se esgarça

elas que tecem e cerzem o tecido da vida

 

para curar a história

saras os males,

combater o ódio,

o machismo insano,

as guerras por terras

 

bruxa-divina-escondida

o desejo insaciável

da Deusa-Mulher

 

CONSCIÊNCIA

somos um sonho

da Deusa

 

no meio da insanidade

dos homens

Margarida Montejano e Marta Cortezao/SP

E nas linhas do tempo do Agora ou nunca, a voz poética e generosa da autora se oferta em palavras para fazer o chamado:

“Estou aqui e te dou a minha vida, a minha história, os meus poemas. Te dou a minha palavra, a minha melhor fase, a minha face te dou. A crença nas estrelas, a esperança do sol, minha alegria, minha noite e o meu dia. Só não demora. O tempo, devora” (pág. 65).

Leitura do poema 'Canteiro' (p.81)

                                                               Leitura do poema 'Placenta' (p.35)

Para aquisição de exemplares, entre em contato com a própria autora via Facebook ou Instagram.

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MONTEJANO, Margarida. Chão Ancestral. Curitiba (PR): Editora TAUP, 2023.

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Arquivo da autora
Margarida Montejano, mora em Paulínia/SP. É Escritora, Poeta, Contista; Func. Pública na Secretaria Municipal de Educação de Campinas. Defensora ativa dos direitos da Mulher, sendo membra do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Campinas; Coordenadora do Projeto Bem-Me-Quero: Empoderamento Feminino e Igualdade de Gênero e, Produtora do Canal Literário – N’outras Palavras –  histórias que inspiram, no Youtube. Autora dos livros "Fio de Prata" - Ed. Siano (2022); "Chão Ancestral", TAUP Editora (2023) e dos livros infanto juvenis "A Poeta e a Flor" e "A Poeta e a Sabiá", pela Editora Siano. (2024). @margaridamontejano.escritora


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