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segunda-feira, 26 de setembro de 2022

SUSTÂNCIA: SOBRE PRIMAVERAS CHUVOSAS, POR ROSANGELA MARQUEZI

  


SUSTÂNCIA/01


 SOBRE PRIMAVERAS CHUVOSAS


POR ROSANGELA MARQUEZI


       Dei-me conta, nesta semana, que a primavera chegou. Não tenho certeza de quem me a anunciou. Acredito que tenha sido, sem poesia, o calendário da fria tela do celular, afinal, que é feito dos pássaros namorando sob o frágil fio de luz das cheias ruas da cidade? Onde estão as flores gritando nas sacadas dos prédios? Onde... O calor suave que antecede o quente verão... O vento macio e fresco... Os parques cheios de floridas gentes... O desejo próprio da própria primavera... Onde?

       As estações do ano já mudaram seu calendário interno faz tempo... A gente é que ainda teima em enquadrá-las em rígidas datas. Deveríamos é aprender com elas e nos transmutarmos sem expectativas de aniversário, sem esperarmos o incerto tempo certo que acreditamos existir. A atual primavera está nos mostrando isso. Se esperássemos pela data para celebrá-la, não a teríamos conosco, pois tudo se faz chuva e frio neste tempo diferente. Os ipês floresceram apenas timidamente, os ventos de agosto não ventaram com gosto, os cabelos não encheram o ralo do banheiro como em outras trocas de estação, não houve tatear quente de mãos...

[foto arquivo pessoal da autora]

         Mas há uma primavera em mim.

    Uma primavera que teima em existir. Uma primavera que burla chuvas e baixas temperaturas. Uma primavera que, obstinada, persiste em renascer... Sem tempo, sem data, sem estação. Uma primavera livre de amarras e de não dizeres e de maldizeres. Uma primavera benfazeja, tal qual a gente deseja. E essa primavera é minha. Ela me habita. Deseja-me. Sonha-me. Enrodilha-me. Entranha-me. Engravida-me. Vive em mim. Sonha em mim. E só morrerá quando, por fim, o inverno da minha vida chegar.

Então, mesmo fria e chuvosa, abro portas e janelas para recebê-la. Revisto meu coração de brancos lírios, na esperança de – mesmo endurecida, não perder jamais minha ternura; preencho minh’alma de rosas amarelas, na expectativa de que a alegria jamais me abandone; tranço meus cabelos com delicados miosótis azuis, na promessa de não me esquecer do que já vivi; cubro meu corpo de coloridas anêmonas, na espera de voar com o vento e seguir, solta e leve, novos e aéreos caminhos na vida, pois os terrenos estão difíceis...


Abraço. Seja feliz.

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DICAS DA SUSTÂNCIA
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1. Ouça “Primavera (Vai chuva)”, com o glorioso Tim Maia e dê uma rosa a quem você ama. A música é de 1970, mas levanta a mão quem nunca a cantou! A composição é de Genival Cassiano dos Santos (que também a gravou, em 1971, em disco solo) e Silvio Rochael.

2. Veja a pintura “A Primavera”, também conhecida como “Alegoria da Primavera”, do pintor renascentista Sandro Botticelli (1445-1510). O quadro é uma representação de uma festa pela chegada da primavera e apresenta, além de outros deuses e pessoas, Vênus, a deusa do amor e da beleza, e seu filho Eros, deus do amor, do erotismo e da paixão (também conhecido como Cupido, na mitologia romana), atirando flechas, em um belíssimo bosque de laranjeiras. O quadro é lindo! Pesquise! E se tiver oportunidade de conhecer Florença, na Itália, não deixe de conhecer a obra original, que está exposta na Galeria Uffizi.

3. Leia “Ausência na Primavera”, de Agatha Christie, mas escrito sob o pseudônimo Mary Westmacott, em 1944. Segundo a autora, este é o livro que ela “sempre quis escrever”. Resumidamente, é a história de uma dona de casa, Joan Scudamore, que, após uma visita à sua filha, em Bagdá, está voltando para casa, na Inglaterra. Por conta de um imprevisto, o trem no qual ela viajava acaba parando e ela tem que ficar numa estação ferroviária no meio do deserto... Com tempo e com a solidão do lugar, Joan começa a se questionar sobre sua vida... O livro é bem diferente dos que a gente está acostumado a ler da Agatha Christie, mas vale muito a pena!!

4. Ouça, na voz do ator português Pedro Lamares, o poema “Quando vier a primavera”, de Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. São versos lindos, potentes, que nos encantam ainda mais na voz de Pedro Lamares... “Quando vier a Primavera, / Se eu já estiver morto, / As flores florirão da mesma maneira / E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada. / A realidade não precisa de mim.”
Para ouvir, acesse o canal da RTP: https://www.youtube.com/watch?v=ZNWEmKLLFWA

5. Dance ao som do Concerto nº 1 em mi maior, “La primavera” – que faz parte de uma das mais famosas sinfonias do veneziano Antonio Vivaldi (1678-1741), “Le quatro stagioni”.

6. Assista ao primeiro curta-metragem da Disney, em animação, em cores com três tiras, “Flowers and Trees (1932). O filme, que faz parte da série “Silly Symphonies”, da Disney, ganhou o Oscar de Curta-Metragem de Animação e, a partir dele, todos os desenhos animados dessa série passaram a ser em cores. A história contada é sobre a primavera, quando flores, cogumelos e árvores estão fazendo seus exercícios de renascimento, após longo inverno. É curtinho (7min49s), mas cheio de magia. Vale a pena!! Você encontra em vários canais do YouTube, mas uma dica é: https://www.youtube.com/watch?v=_NKcsg8vE_U

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Rosangela Marquezi
[foto arquivo pessoal da autora]



Rosangela Marquezi é professora de formação e atuação, mas fã de primaveras mesmo que chuvosas... Nas horas vagas, escreve poemas, crônicas e contos e já participou de coletâneas e antologias no Brasil e também em Portugal.


terça-feira, 18 de outubro de 2022

SUSTÂNCIA - SOBRE SEXO E VIDA, POR ROSANGELA MARQUEZI


SUSTÂNCIA/02


 SOBRE SEXO E VIDA


POR ROSANGELA MARQUEZI


Hoje, quando acordei, me deu uma vontade de sussurrar no seu ouvido e dizer vamos fazer amor... Acordei com vontade de sexo e essa vontade, depois de uma certa idade, não é diária não. Não diria que é rara, mas é demorenta! E aí... como você não estava lá e sozinha não era o que eu queria, resolvi escrever sobre, porque afinal, a escrita é um modo de prazer, principalmente se pensarmos o texto a partir da acepção derrideana de mimesis, em que o real é, de certo modo, réplica do que já foi contado, descrito...


Mas aí também já é muita filosofia para algo que deveria ser bem mais simples, olho no olho, corpo no corpo... Então, c’est la vie! A gente vai fazendo e desfazendo a vida, ou – como já citei Derrida – construindo e descontruindo a vida da forma que a gente pode e quer. E viver, como dizia o grande Guimarães Rosa, “é muito perigoso”, mas também é gostoso. Penso que é nos aprendizados que a gente concebe a vida...

E se de sexo passei para a vida é porque ambos são inseparáveis, se não quisermos imaginar uma sociedade à la Admirável Mundo Novo, ou a qualquer outra história de mundos distópicos, nos quais a perpetuação da espécie é em laboratório, apenas... E se são inseparáveis, é de se pensar que – no tempo atribulado em que estamos vivendo – há muita gente sem vida, ou sem sexo...

Manter o desejo, essa pulsão pela vida ou pelo sexo, não é fácil depois de um dia cansativo, em que o trabalho é que determina o resto de nosso tempo... Felizes e afortunados os que – ao fim de um exaustivo dia – ainda mantém essa pulsão viva! O cansaço, as dores, as angústias, as descrenças e a desesperança matam vontades, lavam libidos, levam desejos embora!

Enfim, que o “meu” desejo transformou-se em texto e, nas tessituras da vida, vou levando e abraçando o que vem pela frente, na ânsia de calmaria dos fortes ventos que nos desmantelam. E tecer a vida é, também, escolher os fios e cores que combinam... Ou não, já que cores são apenas uma percepção visual. A grande questão que se põe é, então: educar o olhar para boas escolhas de sexo e de vida!

E, para boas escolhas, corpo e alma precisam conversar mais demoradamente para que a vida ande nos eixos – não que andar fora dos trilhos não seja bom, de vez em quando...

Abraço. Seja feliz.


DICAS DA SUSTÂNCIA


1. Aprecie a obra O abraço (The embrace – Lovers II), de Egon Schiele. Pintada em 1917, no Expressionismo vienense, a pintura mostra dois corpos nus, em um abraço, entregando-se ao desejo, em uma praia. Por ser expressionista, nos leva a aquele lugar, como se fôssemos voyeurs a liberar toda a nossa curiosidade. É uma pintura belíssima. Aproveite e visite o site em que estão as outras pinturas de Schiele: http://www.egonschieleonline.org/ .  


2. Ouça Amor I love you, de Marisa Monte, com participação de Arnaldo Antunes recitando um trecho de O primo Basílio, de Eça de Queiroz. Marisa compôs a música em parceria com Carlinhos Brown. Música linda, que arrepia e faz querer contar “[...] pras paredes / Coisas do meu coração”. O excerto recitado por Arnaldo:

[...] tinha suspirado, tinha beijado o papel devotamente! Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades, e o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saia delas, como um corpo ressequido que se estira num banho tépido; sentia um acréscimo de estima por si mesma, e parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante, onde cada hora tinha o seu encanto diferente, cada passo conduzia a um êxtase, e a alma se cobria de um luxo radioso de sensações! 

3. Leia O primo Basílio, do escritor Eça de Queiroz! Publicado em 1878, o romance conta a história de Jorge e Luísa e, é claro, do primo Basílio, com o qual a protagonista se envolve acreditando ser amada... Retrato da burguesia da época, o romance é um dos mais importantes do Realismo Português. Nele, o autor analisa de uma forma dura e crua a sociedade e suas hipocrisias. Luísa é uma personagem emblemática, que permanece na vida da gente mesmo após o término da leitura. Delicie-se com mais um trechinho do livro, que vem na sequência do que é declamado por Arnaldo Antunes em Amor I love you:

Ergueu-se de um salto, passou rapidamente um roupão, veio levantar os transparentes da janela... Que linda manhã! Era um daqueles dias do fim de agosto em que o estio faz uma pausa; há prematuramente, no calor e na luz, uma tranquilidade outonal; o sol cai largo, resplandecente, mas pousa de leve, o ar não tem o embaciado canicular, e o azul muito alto reluz com uma nitidez lavada; respira-se mais livremente; e já não se vê na gente que passa o abatimento mole da calma enfraquecedora. Veio-lhe uma alegria: sentia-se ligeira, tinha dormido a noite de um sono são, contínuo, e todas as agitações, as impaciências dos dias passados pareciam ter-se dissipado naquele repouso. Foi-se ver ao espelho; achou a pele mais clara, mais fresca, e um enternecimento úmido no olhar — seria verdade então o que dizia Leopoldina, que não havia como uma maldadezinha para fazer a gente bonita? Tinha um amante, ela! 

4. Assista a série Modern Love, na Amazon Prime. São duas temporadas, uma de 2019 e a segunda de 2021. A série é baseada em uma coluna do New York Times, de título homônimo, e apresenta, de acordo com o The Hollywood Report, o amor em suas inúmeras formas: sexual, romântico, familiar, platônico e também o amor próprio. Até o momento, são duas temporadas! Ah! Na segunda temporada tem o astro de Game of Thrones, o maravilhoso Kit Harington, no terceiro episódio, fazendo, inclusive, uma referência ao seriado!

5. Leia Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, para lembrar sempre o perigo que corremos, enquanto humanidade, de nos desumanizarmos!! O livro foi publicado em 1932 e a sua narrativa se passa numa Londres futura, do ano 2540... Mas que parece cada vez mais perto!! O título vem da peça A tempestade, do imortal dramaturgo inglês William Shakespeare.



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Rosangela Marquezi
[foto arquivo pessoal da autora]



Rosangela Marquezi é professora de formação e atuação, mas aprendente de novos olhares por opção... Nas horas vagas, escreve poemas, crônicas e contos e já participou de coletâneas e antologias no Brasil e também em Portugal.


quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

SUSTÂNCIA - SOBRE ENCERRAMENTOS DE TEMPO, POR ROSANGELA MARQUEZI



Foto: arquivo pessoal da autora / 2022.


SUSTÂNCIA/03


 SOBRE ENCERRAMENTOS DE TEMPO


POR ROSANGELA MARQUEZI


Presa em um calendário que não condiz com meu tempo de ser. Eis a sensação que tenho em períodos que antecedem o fim e o nascer de tempos estipulados em folhinhas de almanaque. Em muitos momentos da vida, tudo que eu queria era não ver o tempo passar, nessa marcação arbitrária que inventaram sem nos consultar. Sinto, às vezes, que inícios e finais de tempo são apenas imposições de um sujeito ou de vários sujeitos que, não satisfeitos em simplesmente deixarem a vida fluir, resolveram inventar um calendário e nele nos prenderam.

O calendário não entende (e não aceita) que tem momentos na vida que tudo o que queremos ser é a Carolina, do Chico Buarque, aquela moça que não viu o tempo passar na janela, mesmo que, lá fora, uma rosa tenha morrido, uma festa tenha acabado, um barco tenha partido... Simples assim, como se pudéssemos cruzar o espaço-tempo ao ritmo da canção de Maria Bethânia e Zeca Pagodinho: “Deixa a vida me levar / Vida leva eu / Deixa a vida me levar / Vida leva eu”;

(Mas não! A vida urge urgente e cortante, cheia de rimas engraçadinhas para nos desviar a atenção do incerto mundo aberto!)

E corremos. Como formigas que perderam a direção do formigueiro. E voamos. Como mariposas seduzidas pela brilhante luz que as distraem do seu destino. E isso tudo para que, no dia primeiro de janeiro, novamente nos encontremos na linha de partida da corrida da vida.

Felizes os que conseguem cruzar a linha do tempo e não se quedam ao fim anual da jornada. Felizes os que entendem que calendários são arbitrários e vivem o tempo perfeito do momento presente. Para esses, há esperança. Para os desencantados, não sei...

O que sei é que esta minha rabugice logo passa, pois sei que nada melhor do que um tempo – sim, tempo – atrás do outro, com uma folguinha para respirar, para que tudo volte ao seu (in)devido lugar. E porque sei disso é que lhes digo que esta reflexão não é sobre desesperança, mas esperança-certeza de que, como tão bem ilustrou Heráclito de Éfeso, se ninguém se banha duas vezes no mesmo rio, seremos novas mulheres e novos homens a cada segundo desta vida!!

E isso é transcender a existência! É também acreditar que todos as estações se fazem e refazem dentro de cada um de nós, passageiros efêmeros desse breve espaço-tempo de um bater de asas de uma borboleta que é a nossa história.

Seja feliz!



DICAS DA SUSTÂNCIA


1. Ouça Carolina, de Chico Buarque, e entenda que nem sempre precisamos estar atentos ao passar do tempo! A canção ficou em terceiro lugar no II Festival Internacional da Canção Popular (FIC), em 1967. Ouça AQUI!

2. Leia Como parar o tempo, do escritor inglês Matt Haig. É uma leitura bem instigante sobre a jornada de um homem, Tom Hazard, que, por causa de uma alteração genética, não envelhece da mesma forma que os seres humanos normais. Dessa forma, ele perpassa séculos da nossa história... O livro discute questões como imortalidade e como tudo vai se repetindo neste mundo... Paixões, medos, angústias, guerras. O livro foi publicado aqui no Brasil em 2017, pela Harper Collins. 

Eu fui pessoas que odiei e pessoas que admirei. Fui divertido e chato e feliz e infinitamente triste. Já estive do lado certo e do errado da história. 

3. Ouça a música Sobre o tempo, do Pato Fu, lançada no álbum Foi gol de quem?, de 1995. É uma música que, mesmo não tendo uma letra que nos faça profundamente refletir, nos faz dançar ao sabor do tempo... Uma delícia. Ouça AQUI!

4. Veja o quadro Persistência da memória (1931), do pintor surrealista Salvador Dalí. Se for possível, visite o Museu de Arte Moderna da Nova York (MoMA) e veja-a ao vivo! Se não puder realizar este passeio, a conheça a partir do site do MoMA (https://www.moma.org/collection/works/79018! Com seus tradicionais relógios “derretendo”, a pintura de Dalí traz um cenário onírico, que faz um diálogo, talvez, com a Teoria da Relatividade, de Einstein, além de trazer a ideia de que o tempo passa sem que possamos controlá-lo. É uma pintura que merece ser vista e pensada!

Foto: reprodução da Internet


5. Deguste o poema Seiscentos e sessenta e seis, do poeta alegretense Mario Quintana, publicado originalmente no livro Esconderijos do tempo (1980), no qual o autor traz a ciência da inexorabilidade do tempo...

A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo…
Quando se vê, já é 6ª feira…
Quando se vê, passaram 60 anos!
Agora, é tarde demais para ser reprovado…
E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio
seguia sempre em frente…

E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.

6. Leia Em busca do tempo perdido (1913-1927), um clássico da literatura mundial, escrita por Marcel Proust. São sete livros nos quais o autor, a partir de um momento em que degusta uma Madeleine, mergulhada no chá, começa a lembrar da infância e vai nos trazendo uma gama imensa de personagens, que acabam se encadeando em diferentes histórias na França da Belle Époque. No último volume, O tempo redescoberto, o narrador por fim percebe que só poderá trazer o passado de volta a partir de sua escrita, entendendo então sua vocação: escrever um grande romance. Uma das traduções aqui para o Brasil foi feita por diferentes tradutores, entre eles os famosos poetas Mario Quintana (volume 1 a 4); Manuel Bandeira (volume 5), junto com Lourdes Sousa de Alencar; e Carlos Drummond de Andrade (volume 6); O volume 7 foi traduzido pela importante crítica literária Lúcia Miguel Pereira.

7. Corra a uma boa panificadora e coma uma deliciosa Madeleine, famoso biscoito em forma de concha, originário da região de Lorraine, na França.

Foto: reprodução da Internet


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Rosangela Marquezi
[foto arquivo pessoal da autora]
Rosangela Marquezi é professora de formação e atuação, mas aprendente de novos olhares por opção... Nas horas vagas, escreve poemas, crônicas e contos e já participou de coletâneas e antologias no Brasil e também em Portugal.


segunda-feira, 12 de junho de 2023

CRÔNICA SOBRE O DIA DOS NAMORADOS... POR ROSANGELA MARQUEZI


SOBRE O AMOR... 

Rosangela Marquezi

Sempre que datas comemorativas se apresentam no calendário estático da parede [porque, definitivamente, não é no dinâmico calendário da vida] pressões se fazem para que os celebremos.

E, soltas as pressões externas, internas também vão sendo criadas e logo se avolumam no peito e na alma. Se é Natal, lá vamos nós comprarmos presentes para amigos e família... Ou seria comprarmos amigos e família com presentes? Se é Dia das Mães ou dos Pais, lá vamos nós mostrarmos nosso amor carregado de culpa por falta de atenção em forma de pantufas e pijamas. Se é Dia dos Namorados... Bom, se é Dia dos Namorados, lá vamos nós, também, comprarmos amor em forma de presente, mais caro, é certo, pois o ser amado e o ser amante andam cada vez mais exigentes, só não sei se verdadeiramente de amor ou de sinais de amor. 

Mas, me pergunto, quem, afinal, instituiu que o amor precisa disso? Lembro Fernando Pessoa, em seu heterônimo Alberto Caeiro, que dizia que agora, que estava a sentir amor, interessava-se pelos perfumes das flores, simples assim, como deveria ser. Canta o poeta que, antes, só sabia que elas existiam e que tinham cheiro. Agora, ele sabia, “[...] com a respiração da parte de trás da cabeça. / Hoje as flores sabem-me bem num paladar que se cheira. / Hoje às vezes acordo e cheiro antes de ver.” 

Amor, para mim, é isso: simplicidade, no ver e no ser e no estar e no fazer e no demonstrar. Um ver o que antes só existia em si mesmo. Um ser eu num outro eu, mas mantendo, eu, o meu eu, e o outro o seu eu [Talvez sem vírgulas, mas mantendo cada eu no seu lugar]. Um estar no mundo com um outro, mas respeitando esse outro e esse outro a mim. Um fazer de cada dia uma festa, não de fantasia, mas de verdades. Um demonstrar de sentimentos-atitudes mais do que exagerados presentes muitas vezes sem estar presente.

Há um bom tempo sozinha, só amando o que não exige reciprocidade, percebo à minha volta uma busca angustiante de manutenção desse sentimento. E, nessa busca, vejo perdas de rumo, paradas no tempo, chuvas ácidas de desejos não realizados a encher caldeirões borbulhantes. Eu, que hoje me creio mais livre disso, só observo, mas confesso que, muitas vezes, em outros tempos, me vi também presa em um algum desses caldeirões. Já amei. Se acreditei no amor, não sei. Não sou crente, mas também não descrente, porque, como diz o ditado castelhano: "No creo en brujas, pero que las hay, las hay".

[É fechar os olhos que me vejo, às vezes, parada na estação esperando a correspondência do amor. Mas, ao ver o vagão vazio, o maquinista me avisa que ele saltou um ponto antes. Talvez, na próxima semana.]

Enfim, que cada amor tem um jeito. Enfim, que quem quer amar, ama, não pede opinião. Enfim, que amar é bom. Enfim, que reciprocidade nunca é na mesma medida. Enfim, que o comércio no Dia dos Namorados continue vendendo rosas, perfumes, dixes e que também haja muito diz-que-me-diz sobre o amor. Enfim, que essa reflexão já tomou outros caminhos e o que era para ser crítica virou análise para divã, então, viva o amor de forma que ele ainda lhe permita arrepios, de prazer ou de alegria, pois este talvez seja o sentimento que verdadeiramente buscamos...

Abraço. Seja feliz.

Rosangela Marquezi

Professora de formação e atuação que, às vezes, acredita, por mais que não o digam as palavras e as ações, no amor...


DICAS DA RÔ

1. Ouça Naquela estação, música de Adriana Calcanhoto, e veja – e está tudo bem – que amores se vão...

                                “E agora, tudo bem
                                 Você partiu
                                 Para ver outras paisagens”

2. Deguste os poemas de meu silêncio lambe tua orelha, da poeta amazonense Marta Cortezão. Em versos que dialogam com outros tantos versos de outras tantas mulheres, Marta nos permite adentrar no âmago de palavras e sentimentos que há muito nos podem parecer perdidos, mas que estão aí... A lamber nossas orelhas... Entre essas palavras/sentimentos, o amor também aparece. Vivo, latente e palpável. Está presente, por exemplo, nos versos de hermetismos, em que dialoga com a escritora portuguesa Agustina Bessa-Luís.

"O fenômeno mais herético é o amor. Ele não é bem recebido nem tolerado porque é uma força sem desistência e que não se revoga a si mesma." (Agustina Bessa-Luís)

                            hermetismos

o amor disse-me mistérios
regozijou-me primaveras
e tudo é doce enigma em mim
 
o dia levantou crepúsculo
em meu coração semente
era chuva começo flores
porque o amor passarinho
segredava hermetismos
cantando águas distantes
 
ele ainda chove decidido
nas noites estrelas lua grande
quando o amor travessia longe
nunca não e sempre sim

3. Leia O amor nos tempos do Cólera, do escritor colombiano, ganhador do Nobel de Literatura de 1982, Gabriel García Márquez, o El Gabo, e entenda que há amores dentro dos quais se vivem outros amores e que há amores que nunca se esquecem...

“Florentino Ariza sabia disto e nunca fez nada para desmenti-lo. [...] Tal como as outras mulheres incontáveis que amou, e mesmo as que lhe agradavam e o achavam agradável sem amá-lo, aceitou-o como aquilo que era na realidade: um homem de passagem.”
                          
“Florentino Ariza, por outro lado, não deixara de pensar nela um único instante desde que Fermina Daza o rechaçou sem aplicação depois de uns amores longos e contrariados, e haviam transcorrido a partir de então cinquenta e um anos, nove meses e quatro dias. Não tivera que manter a conta do esquecimento fazendo uma risca diária nas paredes de um calabouço, porque não se havia passado um dia sem que acontecesse alguma coisa que o fizesse lembrar-se dela.”
                     
"— E até quando acredita o senhor que podemos continuar neste ir e vir do caralho? — perguntou. 
Florentino Ariza tinha a resposta preparada havia cinquenta e três anos, sete meses e onze dias com as respectivas noites.  
— Toda a vida — disse.”


4. Leia o conto Pomba Enamorada ou uma história de amor, da escritora brasileira Lygia Fagundes Telles. Na história, a protagonista se enamora por Antenor, com quem dançou apenas uma vez, mas se apaixonou ao ponto de, mesmo sendo rechaçada por ele, continuar a amá-lo vida afora. E tanto que, mesmo casada, com outro, ela continua a amar essa imagem de homem que projetou sobre Antenor... No final, já velha, acreditando em uma cartomante, vai novamente ao encontro dele... A nós, leitores, fica a possibilidade de criarmos um desfecho: haverá um reencontro ou uma ruptura definitiva? Enfim... Leia e perceba como ficar amarrada a uma ideia de amor é frustrante.

“Encontrou-o pela primeira vez quando foi coroada princesa no Baile da Primavera e assim que o coração deu aquele tranco e o olho ficou cheio d’água pensou: acho que vou amar ele pra sempre.”

“Quando engravidou, mandou-lhe um postal com uma vista do Cristo Redentor (ele morava agora em Piracicaba com a mulher e as gêmeas) comunicando-lhe o quanto estava feliz numa casa modesta mas limpa, com sua televisão a cores, seu canário e seu cachorrinho chamado Perereca.”

“[...] disse que tudo isso era passado, que já estava ficando velha demais pra pensar nessas bobagens mas no domingo marcado deixou a neta com a comadre, vestiu o vestido azul-turquesa das bodas de prata, deu uma espiada no horóscopo do dia (não podia ser melhor) e foi.”


5. Leia poemas do livro Vinte poemas de amor e uma canção desesperada, do poeta chileno Pablo Neruda, ganhador do Nobel de Literatura de 1971. É o segundo livro do autor e, mesmo tendo sido publicado pela primeira vez em 1924, é o livro de poesia mais vendido em língua espanhola. O poema n.º 20 é um dos mais belos/tristes sobre amor que se perde.

"Posso escrever os versos mais tristes esta noite. 
 
Escrever, por exemplo: a noite está estrelada,
E cintilam azuis, os astros, desde longe. 
 
[...] 
 
Já não a quero, é certo, mas quanto a quis.
Minha voz buscava o vento para tocar seu ouvido. 
 
De outro. Será de outro. Como antes de meus beijos.
Sua voz, seu corpo claro. Seus olhos infinitos. 
 
[...] 
 
Porque, em noites como esta, a tive entre meus braços,
minha alma não se contenta em havê-la perdido. 
 
Ainda que esta seja a última dor que ela me causa,
e estes sejam os últimos versos que eu lhe escrevo."

6. Leia A insustentável leveza do ser, do escritor tcheco Milan Kundera. Uma história muito marcante sobre o que se busca verdadeiramente em relacionamentos. Tomas, um dos protagonistas, busca alegria, e quando não encontra parte em busca dela em outros corpos/amores. Mas essa busca também lhe causa tristezas...

"Mas seria possível ainda falar de alegria? Assim que ele saía para encontrar uma de suas amantes, perdia o interesse e jurava a si próprio que seria a última vez."

7. Aprecie a pintura Os amantes (The Lovers, 1928), do pintor surrealista René Magritte (1898-1967). Pintura perturbadora que nos traz a ideia de um amor proibido, um amor que nos cega, representado pelos rostos que se unem em um beijo, mas que estão cobertos por véus brancos... Caso esteja passeando em Nova Iorque, aproveite e visite o Museu de Arte Moderna (MoMA) e veja in loco a pintura, que está lá exposta.

Fonte: https://www.moma.org/collection/works/79933?artist_id=3692&page=1&sov_referrer=artist

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Rosangela Marquezi é professora de formação e atuação que, às vezes, acredita, por mais que não o digam as palavras e as ações, no amor... Nas horas vagas poucas da vida, escreve poemas, crônicas e contos e já participou de coletâneas e antologias no Brasil e também em Portugal. É membro da Academia de Letras e Artes de sua cidade, Pato Branco - PR.


quarta-feira, 16 de novembro de 2022

BAIXE O E-BOOK GRÁTIS: I TOMO DAS BRUXAS: DO VENTRE À VIDA

 


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Arte do card: Patrícia Cacau 


BAIXE O E-BOOK GRÁTIS: I TOMO DAS BRUXAS: DO VENTRE À VIDA

Por Marta Cortezão

O Projeto Enluaradas, neste dia festivo de 15 de novembro de 2022, congratula-se com todas as autoras poetas pela publicação da Coletânea Enluaradas III: I Tomo das Bruxas – do Ventre à Vida, em versão e-book, fechando assim esta trilogia iniciada com a Coletânea Enluaradas I: Se Essa Lua Fosse Nossa (Ser MulherArte Editorial, 2021) e seguida pela Coletânea II: uma Ciranda de Deusas (Sarasvati Editora, 2021). A versão do livro físico já foi encaminhada via correios a todas as autoras participantes. Temos os lançamentos presenciais confirmados na Bienal Internacional do Livro do Ceará, 18/NOV/2022, às 15h e no 5º Encontro Nacional do Mulherio das Letras – João Pessoa/PB, 25 de novembro, às 19h30, na Usina Cultural Energisa – Tenda 3.

 



DO PERCURSO RUMO A UMA LUA TODA NOSSA

A abertura do edital da Coletânea Enluaradas I: Se Essa Lua Fosse Nossa aconteceu em 01/01/2021. Naquele momento em que vivíamos uma assustadora pandemia, recebemos uma expressiva adesão de escritoras/poetas. Foram mais de 200 (duzentas) inscrições, das quais 168 (cento e sessenta e oito) foram selecionadas para compor o livro digital. O e-book possui temática livre, mas faz reverência à força da Deusa Selene, essa “lua toda nossa”, uma metáfora-lugar que desenhamos, juntamente com as autoras enluaradas, neste espaço poético-virtual que aninhou as angústias do nosso mundo real. Esta primeira coletânea teve lançamento virtual no dia 21/04, quarta-feira, via canal do YouTube Banzeiro Conexões, às 17h30m (BSB), com a participação de autoras via depoimentos gravados que foram ao ar, em transmissão ao vivo, com muita música e muita poesia:

Elizabete Nascimento: [...] A “Coletânea enluaradas” apresenta a escrita poética de várias mulheres escritoras de diversos países e, que, na maioria das vezes, não têm a oportunidade de publicação. Então, no meu olhar, o projeto se constitui como um exercício de travessia e tem como foco a efetiva ação, vamos dizer assim, implícita, do vocábulo sororidade. Então compreendo que, ao nos dá as mãos, especialmente no cenário contemporâneo, nós provocamos algumas rupturas no sistema, nos tornamos mais fortes e exercemos alguns princípios éticos e estéticos que fazem o ser e o estar no mundo com os outros ou com as outras coisas do mundo. E com isso, nos tornamos, de certa forma, juntas, a ponte, a água, a luz rumo a um mundo, a uma sociedade com equidade, porque “Juntas somos as Enluaradas”!

Eunice Tomé: [...] Uma lua jogou sua luz sobre minha cabeça/ em tempos que não julgávamos possível olhar para o céu e contemplar os astros. Uma mutação aconteceu e foi por esta inspiração que me fez escrever poesia e acreditar que a beleza não se esconde nas nuvens e vendavais por mais que estejamos cegos e descrentes. Na adesão de revisitar a lua, partindo de uma centena e mais de outras vozes femininas, o universo se abriu e deixou entrar uma força vulcânica em gritos de amor e de sublimação. Passei a contemplar a lua e suas estações em noites de insônia e aprender com ela os gestos divinos. Foi assim que surgiu em mim o “Projeto Enluaradas” e julgo que a forma livre e aberta de tantas vertentes literárias encontrou um espaço sem fim no céu com outras tantas estrelas de muita luz. Que venham outras coletâneas tão bem organizadas e coordenadas por suas idealizadoras. Juntas somos as Enluaradas!

Daiana Pasquim: [...] Estou me sentindo extremamente feliz porque a Coletânea Enluaradas me inaugurou no útero das poesias [...] Essa coletânea significa um entrelaçamento, um “congressamento” com as mulheres, as lobas, as inspiradas pela lua. São mulheres do mundo inteiro. Juntas Somos as Enluaradas!

Roberta Gasparotto: […] para mim, ter participado da Coletânea Enluaradas 2021, foi um respiro, um refresco em meio a tantas notícias tristes que a gente vem recebendo diariamente e, em meio a tanto sofrimento que o mundo, de uma maneira geral e o Brasil em particular, estão passando nesse momento. E até [...] pela temática da lua, pela magia da lua e, principalmente, pelo projeto de vanguarda que a Marta Cortezão e a Patrícia Cacau, que são as idealizadoras do projeto. Elas tiveram a sensibilidade de fazer um projeto que, além de uma coletânea de poemas de mulheres, que ficou lindo, a coletânea ficou maravilhosa! – elas também fizeram lives com cada uma das participantes que quiseram participar [...]. Então, assim, a Patrícia e a Marta, elas colocaram em prática uma palavra que hoje em dia é muito usada, mas que a gente não coloca tanto em prática quanto a gente usa essa palavra, que é sororidade. Então assim, é um projeto belíssimo, conheci mulheres maravilhosas, porque tive a grande alegria de além de participar da live enquanto escritora, participar também entrevistando essas mulheres maravilhosas. E estou muito feliz [...]. gratidão, Marta e Patrícia. Juntas somos as enluaradas!

Edna Almeida: [...] O projeto Enluaradas foi sedutor [...] foi inclusivo, foi libertador, foi verbalizar, um resgate da poesia feminina e o e-book ele vem assim num cenário literário contemporâneo com um grande presente pra humanidade, uma grande lição de amor e altruísmo, uma alavanca de leitura, onde o sexto sentido se multiplica. Estou ainda vivendo essa ciranda das enluaradas. Se, enquanto as bombas caiam, na 2ª guerra mundial, os franceses faziam amor; na pandemia, nós fazíamos lives poéticas. Juntas somos as Enluaradas!

Rita Queiroz: [...] Participar do Projeto Enluaradas “Se Essa Lua Fosse Nossa” foi um presente nos dado por Marta Cortezão e Patrícia Cacau. Eu já acompanho o projeto desde o final do ano passado, quando foi lançado no Facebook com aquelas lives das enluaradas, eu sempre acompanhei, sempre me deliciei muito com as lives. E quando a Marta e a Patrícia lançaram a coletânea, em janeiro, eu [...] já mandei mensagem no Instagram dizendo “eu quero participar” [...] porque é um projeto que agrega, que agregou e que vai agregar mais e mais. E um projeto que se diferencia dos outros projetos porque houve um entrelaçamento entre essas enluaradas. As enluaradas se conheceram, se integraram e, a partir desse projeto, outros projetos estão surgindo. Então foi uma grande satisfação participar desse projeto e apostar nesse projeto e acreditar no projeto e, querendo já o número 2, número 3, número 4, infinitamente porque Somos Enluaradas!

Tainá Oliveira: [...] Eu tenho muito orgulho de dizer que sou uma das 168 autoras que fazem parte da coletânea “Se Essa Lua Fosse Nossa”. Um projeto muito especial, um projeto que na minha vida em particular, foi um divisor de águas porque é a primeira vez que meus poemas saem lá da pastinha da criatividade e levantam voo e vão ganhar o mundo aí afora. Então eu tenho muito orgulho de fazer parte dessa Coletânea [...] Gosto de frisar que ela é um afago na nossa alma, em período ainda de pandemia, tão complexo, mas poder fazer conexão com outras escritoras, com outras mulheres que dividem o mesmo sonho [...] foi maravilhoso, foi uma experiência incrível. E creio que ele (o projeto) é um marco também para nossa literatura nacional porque está abrindo portas para novas escritoras, para novas obras. Então eu vejo muita importância nele, no cenário literário e é uma honra fazer parte disso tudo e poder dizer “Juntas somos as Enluaradas!”

Vânia Perciani: O que dizer sobre o Movimento Enluaradas? Vamos dar a palavra para as idealizadoras, as fomentadoras do projeto, desse processo de escrita feminina. Marta Cortezão, num comentário muito interessante “ser casulo para entender-se. Ser lagarta para saber-se [...] ser borboleta para voar livre”. E Patrícia Cacau complementa “Se meter no caminho incerto [...] a alma livre com botas novas, com coragem, com fé para criar um mundo novo”. Quais de nós, mulheres, poetas e escritoras, não temos essas vozes chacoalhando, gritando em nosso coração? Queremos espaços nas prateleiras das bibliotecas, queremos ser lidas, queremos ser ouvidas. Esse é o desafio e essa é a promessa que permeia a coletânea que nós fizemos. “Coletânea Enluaradas Se Essa Lua Fosse Nossa”, essa lua está se tornando nossa. Quando uma loba uiva para a lua, a alcateia responde a uma só voz: Juntas Somos as Enluaradas!

Rosangela Marquezi: [...] ter participado do Projeto Enluaradas, organizado pela Marta e pela Patrícia, as quais agradeço de coração, foi para mim uma mistura de emoções à flor da pele, de alegria de sentimento e coletividade, de luta por igualdade e, principalmente, oportunidade de soltar a minha própria voz. Vejo o “Projeto Enluaradas” como um fortalecimento coletivo de mulheres que precisam ser mais ouvidas, mais lidas e mais vistas. A poesia ela não se constrói somente a partir dos cânones, ela também se faz a partir de pequenas manifestações diárias poéticas em que muitas vozes se unem e se tornam potência. É isso: Juntas somos as Enluaradas!

Stéphanie Gomes: [...] Sou uma das 168 participantes da “Coletânea Enluaradas Se Essa Lua Fosse Nossa”, uma coletânea maravilhosa idealizada pela Marta Cortezão e pela Patrícia Cacau. Então assim, gente, me sinto muito lisonjeada por estar fazendo parte dessa Coletânea junto com todas essas mulheres aí, magníficas que também integram [...] esse elenco [...] Eu acredito que quando nós temos algo dentro de nós que é bom, nosso dever é partilhar, compartilhar com outras pessoas e eu acredito sim e espero que essa coletânea alcance muitas pessoas. Agora imagina aí você lê uma coletânea com 168 cabeças pensantes, diferentes; cada mulher dessa mostrando, através da poesia, as suas ideias, a sua visão (de mundo). Será que essa lua pode ser só minha? Ou pode ser só sua? Pode ser nossa, essa lua é nossa, até porque Somos todas Enluaradas!

Ale Heidenreich: Hoje eu estou aqui, nesse dia tão especial para nós, o encerramento da nossa “Coletânea Enluaradas” e quero aproveitar e falar da importância da nossa coletânea no cenário literário contemporâneo. A nossa coletânea, ela veio como um marco, ela chegou resgatando, auxiliando, dando apoio a muitas mulheres, resgatando suas identidades ou até talvez (revelando) uma identidade nova para muitas delas. Ela veio acolhendo mulheres de todas as classes de nossa sociedade, escritoras e não escritoras. Ela veio humana, ela veio inovadora, ela veio divertida e é isso que a gente deve levar. E vai ficar pra mim, pra minha vida. Tenho a influência de muitas de vocês. Nossa querida Frida Kahlo, ela diz “onde não puderes amar, não te demores”, eu quero ficar aqui, aqui está bom demais, infelizmente eu sei que não dá, mas a gente vai se encontrar em outras coletâneas, em outros projetos. Então fica aqui meu agradecimento, de todo o coração, Patrícia Cacau, Marta Cortezão e cada uma de vocês.

Missandra Almeida: [...] E a antologia Enluaradas, pra mim, é um ajuntamento de mulheres maravilhosas, de mulheres lusófonas (e brasileiras) espalhadas pelo mundo de mãos dadas buscando e mostrando a força da mulher e da sua poesia, o encanto e todas as possibilidades de potência e de existência. E também é a possibilidade de experimentar esse lugar de publicação. Que lugar é esse? [...] Um lugar de existência, um lugar de voz, de visibilidade, mas também de acesso à leitura. Sabendo da dificuldade que nosso país tem de ofertar acesso à leitura, de valorizar a criação e a leitura como prioridade para a educação. Sabendo disso e, nesse momento, eu estar participando de uma antologia que foi oferecida ao público gratuitamente, pra mim, é extremamente especial, é muito significativo.

Janete Manacá: [...] Participar do Projeto “Se Essa Lua Fosse Nossa” foi uma oportunidade única de poder estender as mãos a mulheres de diversos lugares do planeta e mover essa ciranda encantada com palavras sábias e letras mágicas. Essa coletânea, com certeza, é um legado de amor a gerações futuras. Salve, Marta! Salve, Cacau! Vida longa às Enluaradas! Tim-tim!

Antes do lançamento da Coletânea Enluaradas I: Se Essa Lua Fosse Nossa, no encontro Enluaradas: Dia Internacional da Mulher, realizada dia 08/03/2021, via canal do Youtube Banzeiro Conexões, a saudosa amiga Enluarada Vânia Alvarez, pesquisadora, pensadora moderna, escritora e poeta paraense, afirmou, em seu discurso emocionado A poética contemporânea das Enluaradas que as autoras participantes do Projeto Enluaradas estavam “construindo a chamada Arte Contemporânea” e ela assentava as primeiras colunas sólidas deste movimento que nascia, com seu olhar observador de quem enxerga do lado de fora e de dentro, explicando o seguinte:

Não basta uma escrita definir-se como feminina, é preciso designar a fala das mulheres. Colocar-se no lugar do feminino, requer uma posição que implica ver-se no outro. E esse “ver-se no outro” vai construir esse projeto de contemporaneidade, uma contemporaneidade ocidental, racional, evolutiva e disjuntiva. 

Para Vânia Alvarez, o Enluaradas se define como este coletivo de reflexo, não apenas o que se reflete a si mesmo, aquele eu solitário, mas o que em si vê a imagem da outra se refletindo e a que, olhando para a outra, vê o próprio reflexo de si. É a humana conjugação da ação de outrar-se. A alma de Vânia Alvarez, poeta humanamente visionária, enxergou a fina essência que fortalece este projeto – formado por mulheres de luta que resistem pela força da palavra –, afirmando que somos

poetas engajadas ao contemporâneo, que falam por si e que reinterpretam as muitas vozes [...] e a lua aparece influenciando o sentimental [...] Somos mulheres, somos enluaradas, somos um projeto contemporâneo vitorioso, porque “água mole em pedra dura tanto bate até que fura” e nós, mulheres, furamos o cerco [...] porque somos um coletivo, já não estamos sós e estamos apenas no começo.

(“A poética contemporânea das enluaradas”, 08/03/2021)

O curioso deste projeto foi que ele teve início como uma simples chamada para uma coletânea e, no decorrer do processo, se constituiu num movimento agregador, literário e poético denominado “Enluaradas”. Hoje, para além de continuarmos nos designando Projeto Enluaradas, somos um coletivo feminino que vem vingando por causa da participação e da interatividade das autoras que o integram. Somos uma rede de apoio que tem dado muitos frutos, resultando em parcerias entre as próprias autoras Enluaradas, que vêm revolucionando, de forma particular e poética, o mundo da escrita de cada umas das participantes através de parcerias, de participação em outras coletâneas, entrevistas e eventos literários e, principalmente, muitas autoras nos têm falado do quanto este movimento foi importante para estimular a escrita, que estava há bastante tempo estacionada. Conjugamos o verbo ESCUTAR em todas as suas modalidades de vida nas “Enluaradas Live” (ações da primeira coletânea) que realizamos, onde as participantes da coletânea contavam de seus projetos literários, enquanto uma ciranda de mulheres, nossa “egrégora lunar”, comentava, aplaudia e se via refletida de alguma maneira em cada discurso. E, naquele momento, passaram por lá (@enluaradas2022) cento e vinte (120) autoras falando sobre sua trajetória literária, de seus medos, de seus sonhos e da alegria de fazer parte do Projeto Enluaradas. Um espaço "lunar" que abraça, praticando a escuta e a sororidade.


DAS MÃOS QUE SE UNEM PARA UMA CIRANDA DE DEUSAS

Na Coletânea II: uma Ciranda de Deusas, cujo edital foi lançado dia 21/05, numa sexta-feira de muitas expectativas, iniciamos várias ações dentro do projeto, como: Ciranda de Deusas, que foram lives realizadas, em diferentes dias da semana, tanto pela plataforma do Instagram quanto pelo canal Youtube Banzeiro Conexões, e que consistia em leituras poéticas através das quais divulgamos a literatura lusófona de mulheres de estados brasileiros e países estrangeiros. No total, foram 26 (vinte e seis) encontros (Cirandas de Deusas) realizados: 14 (catorze) via plataforma Instagram, 04 deles, em parceria com o Mulherio das Letras, a convite de Silvia Schmidt, no perfil @livrariamulherio; 11 (onze) via canal Banzeiro Conexões. Tivemos também o quadro Nas Teias do Poema, com a realização de 14 (catorze) episódios, nos quais as autoras participantes da Coletânea Enluaradas II: uma Ciranda de Deusas apresentavam poemas de sua produção autoral para falar sobre o processo criativo literário e das “teias” que envolvem esse processo do “fazer poético”. Todos os episódios do “Nas Teias do Poema” eram acompanhados de uma publicação prévia para fomentar o pensamento sobre a práxis do fazer literário do poema que antecedia cada encontro. Relaciono os links dos episódios caso haja interesse para rememorar nossas leituras:

1º) Nas Teias do poema I: CARNE E TECIDO POÉTICOSAnna Liz, Artane Inarde e Maria Alice Bragança;

2º) Nas Teias do poema II: DAS ESCREVIVÊNCIAS QUE NOS HABITAM - Ale Heidenreich, Aline Galvão e Vania Clares;

3º) Nas Teias do poema III: O (IN)CORPÓREO DA PALAVRAAdriana Teixeira, Cris Mesquita e Janete Manacá;

4º) Nas Teias do poema IV: ENTRE FIOS E METÁFORASHeliene Rosa, Isa Corgosinho e Lucila Bonina;

5º) Nas Teias do poema V: NOS FIOS DA 'ALQUIMIA DO VERBO'Dani Espíndola, Elizabete Nascimento e Maria da Paz Farias;

6º) Nas Teias do poema VI: DOS MATIZES DA LINGUAGEMLindevania Martins, Malu Baumgarten e Raquel Basilone;

7º) Nas Teias do poema VII: TECENDO EPIFANIAS POÉTICASBelise Campos, Carolina Ferreira, Flavia Ferrari e Jéssica Iancoski;

8º) Nas Teias do poema VIII: ENTRE PERCEPÇAO E MEMÓRIAMaria do Carmo Silva, Marta Cortezão e Patrícia Cacau;

9º) Nas Teias do poema IX: NO MEIO DO POEMA, O(A) LEITOR(A)Margarida Montejano, Rita Queiroz e Rosangela Marquezi;

10º) Nas Teias do poema X: NÃO SOMOS AS MESMAS DE ONTEMElisa Lago, Hydelvídia Cavalcante e Tânia Alves;

11º) Nas Teias do poema XI: INDOMÁVEL E EFÊMERA CRIAÇÃO DO BICHO-POEMAAna Mendes, Cris Arantes e Heloisa Helena Garcia;

12º) Nas Teias do poema XII: UMA LITERATURA ENGAJADACátia Castilho Simon, Frahm Torres e Marina Marino;

13º) Nas Teias do poema XIII: DA FORÇA PERENE DA PALAVRAJoelma Queiroz, Glafira Menezes Corti e Valéria Pisauro;

14º) Nas Teias do poema XIV: ENLUARADAS E A POÉTICA DO ESPAÇOCarla Sà De Morais, Neli Germano e Patrícia Cacau.

Tanto as ações literárias Ciranda de Deusas quanto o Nas Teias do Poema foram divulgadas pelo blog Feminário Conexões através de textos e comentários que foram/vão construindo o itinerário literário e histórico do Projeto Enluaradas, que só tem razão de ser graças à participação de todas as poetas Enluaradas que somam conosco na realização e construção desta Literatura Contemporânea Enluaradas. Lembramos também dos artigos literários das autoras Isa Corgosinho, Carla De Sà MoraisElizabete Nascimento (texto 1 e texto 2) e Margarida Montejano sobre as ações do projeto também publicados neste blog. Outro evento significativo para o projeto foi o 1º FLENLUA (Festival Literário Enluaradas), realizado nos dias 03, 04 e 05 de dezembro, com a participação da maioria das 87 (oitenta e sete) autoras/poetas. Transcrevo aqui alguns fragmentos das falas que bem ilustram o primeiro festival literário e que vale muito a pena tê-los em conta:

“trazer cada vez mais mulheres para a escrita, para a publicação, segurar na mão, cirandar [...] é parte bastante importante da militância feminista que, para mim, é uma forma de estar no mundo [...] A nossa situação como mulheres é complexa (digamos assim, para não dizer triste), no mundo inteiro. Todo o espaço que a gente tem é um espaço ganho, é lutado, nada nos é dado e nada continua a não ser pela nossa luta. [...] Este é meu lugar de mulher, é o lugar de todas as mulheres. Quem não for feminista que não use calça comprida, que devolva o passaporte, que devolva a carteira de motorista, que não vote, porque tudo é fruto desta luta.”

{Maria Alice Bragança (RS), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“O que eu percebo nesse grande movimento, em que as mulheres, sobretudo nesse processo criativo da literatura, das artes, é essa necessidade de se colocar mesmo como protagonistas. Eu percebo neste projeto essas dimensões muito atadas, muito “dialogizadas”, que é a questão do estético, dessa procura do processo criativo, inovador, constitutivo e também a questão social, ética, moral, no momento de distopias, de isolamento, de pandemia, de refluxos, de bandeiras do social.”

{Isa Corgosinho (PB), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Estou aqui para falar com que força surgiu esse movimento, porque ele já nasceu empoderado e empoderando [...] E de poetas, num estalar de dedos, nós viramos deusas, as deusas da poesia. E isso mostra o quanto o Projeto Enluaradas veio para nos fortalecer nesse meio literário, para fortalecer a nossa escrita e a nossa poética.”

{Marina Marino (SP), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Talvez a gente nem tenha noção do que é que nós estamos fazendo dentro desse coletivo, agora uma coisa eu tenho certeza, ele veio para fazer a diferença, eu não estou falando de vaidade, eu estou falando de necessidade da gente buscar sim o arquétipo dessas deusas que há muito tempo adormeceu [...] (O Projeto Enluaradas) vem com afetos, as inclusões, os acolhimentos e traz à tona a poética que nos habita. É um trabalho bem socrático, a maiêutica que reconhece que você tem dentro de você o conhecimento, só precisa de alguém para ajudar nesse parto de luz.”

{Janete Manacá (MT), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Estou muito feliz por fazer parte deste movimento [...] (que) tem levado o trabalho de todas nós, conhecidas, desconhecidas, sem distinção. Isto é realmente o que eu chamo Literatura, que é dar oportunidade a todas, não só a uma parte, como se considera a elite,”

{Ana Mendes (Suíça), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Lembrei da menina mulher que fui e quanto faria a diferença se eu tivesse encontrado mãos acolhedoras e agregadoras como nós temos agora e, para mim, não foi só um livro a mais, eu recebi a certeza de que é possível um mundo novo onde cada mulher, assumidamente poeta, entende o que é entrar numa ciranda, dar as mãos [...] dividindo a força, e todas sem medo de expor sua fragilidade e grandeza nesse universo de poesia”

{Vania Clares (SP), Abertura do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“Eu sinto que eu pertenço à essa família, que eu encontrei o meu lugar, poeticamente falando, e isso é tão raro hoje em dia [...] não sei se elas (Marta e Cacau) têm a dimensão da história que elas estão fazendo na arte contemporânea, mas elas estão deixando um legado pós-moderno, reunindo o que há de melhor das escritoras que compõem esta coletânea.”

{Aline Galvão (AM), Mesa 1 do FLENLUA, 03/12/2021}

 

“A luta só começou; a gente já consegue votar, já consegue dirigir, já consegue escrever com nosso próprio nome, mas ainda tem muito que se lutar, e os nossos espaços vão ser ocupados por nós e pela próxima geração porque uma hora nós também seremos legado da próxima geração. [...] Não quero a literatura só para mim, eu preciso de um coletivo, eu preciso de mulheres que girem comigo, eu preciso de mulheres que tenham esse sentimento de não querer a literatura só para si, as oportunidades só para si.”

{Patrícia Cacau, Mesa 2 do FLENLUA, 04/12/2021}

 

“Esse projeto [...] me diz muito, me diz demais. Eu também me confesso não feminista, no sentido mais ativo dessa palavra, mas porque eu acho que não me foi dada essa oportunidade que eu vim a ter quando conheci esse projeto. Isso para mim representa muito”

{Dalva Lobo, Mesa 2 do FLENLUA, 04/12/2021}

 

“A palavra Ciranda tem tantos significados, assim como passagem do tempo, aquilo que vai passando, o transcurso dos dias, na ciranda dos dias. E a primeira acepção da palavra, se você vai para o dicionário [...] ciranda é uma peneira grossa que serve para joeirar, separar os materiais, as impurezas [...] Eu acho que nesta Ciranda com tantos significados, nos faz tirar as impurezas da vida, aquilo que não serve mais [...] que caia por terra”

{Rosangela Marquezi (PR), Mesa 2 do FLENLUA, 04/12/2021}

 

“Nós sabemos que exclusão é uma questão de patriarcado, segregação é uma questão de patriarcado, concentração de riqueza é uma questão de patriarcado e nós precisamos, mulheres, todas nós somos maioria, ter consciência do nosso papel. É muito importante essa consciência começar a explodir dentro de nós e nos fazer realmente participativas e transformadoras [...] Que as mulheres pensem muito, repensem, estudem, participem de lives, penetrem mesmo na discussão política tão em voga e que veio à tona com uma força muito grande depois do golpe que vivemos, para que vocês votem certo, conheçam seus candidatos, se aprofundem na política. Tudo é também uma questão política [...] A poesia é uma ferramenta de transformação [...] é uma ferramenta política.”

{Teresa Bendini (SP), Mesa 4 do FLENLUA, 04/12/2021}

 

“Eu trabalho com a temática das mulheres há mais de 20 anos [...] e me encontrar com esse projeto (Enluaradas), para mim foi assim uma luz mesmo no meu caminhar, porque essas produções coletivas de mulheres, elas oportunizam um conjunto de vozes silenciadas. Nós somos tantas mulheres que, individualmente, não conseguiríamos publicar [...] essas escritas que são revolucionárias, e aqui eu quero retomar, na minha fala, a fala de nosso amigo Sidnei que acho que foi muito propícia mesmo, toda vez que uma de nós constrói um verso, compõe um verso, grita esse verso para a humanidade, uma algema do patriarcado se quebra porque nós, mulheres, trazemos a revolução na nossa poesia, nas nossas vozes, somos nós com os nossos poemas, com a nossa sensibilidade que vamos construir um mundo mais humano.”

{Heliene Rosa (MG), Fechamento do FLENLUA, 05/12/2021}

         

QUANDO AS BRUXAS CRIAM ASAS

                Na Coletânea III: I Tomo das Bruxas – do Ventre à Vida, tivemos o edital aberto de 10 de fevereiro a 22 de maio de 2022. Não foi um tema muito bem aceito e nos custou mais trabalho e tempo de divulgação; mas graças à adesão de nossas parceiras poetas foi possível alcançar o número expressivo de 106 (cento e seis) participações. No entanto, esta possível resistência havia sido cogitada no decorrer do processo, pois sabe-se que houve um projeto de extermínio para que as mulheres comuns, campesinas, as que conheciam o saber curativo das ervas, as ditas bruxas, fossem expurgadas da sociedade, e que todos estes conceitos e parâmetros negativos, gestados pelo patriarcado, nos foram legados e absorvidos estruturalmente. O projeto editorial desta coletânea procura trazer para o centro do discurso esta história de dor, sofrimento e perseguição através da analogia à estrutura tripartida do livro Malleus Maleficarum (Martelo das Feiticeiras), escrito em 1.487, do diálogo com as autoras Michelle Perrot (filósofa), Maria Teresa Horta (escritora, poeta), Clarissa Pinkola Estés (psicóloga) e de todo “um compêndio poético de subjetividades e vivências, tecido pela historicidade, ativismo e progressiva visibilidade das mulheres nas suas lutas e conquistas nos âmbitos público e privado” que se fazem presente no discurso poético desta coletânea.

No percurso de construção desta coletânea, realizamos, via Instagram, 22 (vinte e dois) episódios do quadro (Com)Pulsão Poética, para os quais contamos com o apoio imprescindível das poetas Enluaradas Ale Heidenreich, Carollina Costa, Lucila Bonina e Flavia Ferrari na mediação dos encontros.  O objetivo do quadro foi celebrar o poder transformador da Poesia, aquele que nos leva à realização dos sonhos, à compulsão, ao desejo de dar vazão à palavra. Esta palavra em estado de pulsão poética, que lateja, que anseia viver e sentir-se viva, esticando as asas semânticas do verbo por campos outros para desaguar em rios profundos de ardente pulsões...

Destaco aqui dois pontos importantes que marcaram a História das Mulheres pela repressão da sociedade patriarcal: a negação ao saber, eternizada na curiosidade maliciosa de Eva que nos foi herdada como 'castigo' em todos os tempos e, a partir daí, a diabolização do corpo objetificado da mulher, seu sexo insaciável propenso a vícios e às mais cruéis violências. Michelle Perrot, historiadora francesa, em seu livro Minha História das mulheres, pergunta e responde: O que querem as mulheres? Assim como Eva, elas querem morder a maçã, mas sem serem expulsas do Paraíso.

E, em pleno século XXI, continuamos perseguindo a maçã das possibilidades e o direito de permanecer no Paraíso. E este continua sendo o nosso desejo, e o fazemos com pulsão, com força poética, com a força de todos os silêncios herdados; esse é o anelo das Bruxas, eu disse 'anelo' para contrapor a 'martelo das bruxas' (Malleus Maleficarum), uma obra, escrita no século XV que justificou o assassinato, a perseguição (planejada e calculada) de bruxas e hereges durante séculos, onde encontramos afirmações como: “Eva nasceu de uma costela torta de Adão, portanto nenhuma mulher pode ser reta”. E aqui deixo mais três anelos: mulheres, pesquisemos nossa História, involucremo-nos com pautas feministas e busquemos razões para continuar a dura luta, pois o Feminismo é a grande declaração de amor que se pode fazer à Humanidade! Vamos conferir os episódios:

1º) (Com)Pulsão Poética I: Lucila Bonina Simões, Carollina Costa e Ale Heidenreich – mediação de Marta Cortezão (06/JUN/2022);

2º) (Com)Pulsão Poética II: Dilma Barrozo, Alyne Castro e Sueli Salles – mediação de Ale Heidenreich (08/JUN/2022);

3º) (Com)Pulsão Poética III: Cecília Rogers, Janine Carvalho e Simone Santos Guimarães – mediação de Lucila Bonina Simões (10/JUN/2022);

4º) (Com)Pulsão Poética IV: Giselle Pretti, Lilian Rocha e Deyse Ribeiro – mediação de Carollina Costa (12/JUN/2022);

5º) (Com)Pulsão Poética V: Verônica Oliveira, Cândida Carneiro e Magalhe Oliveira – mediação de Marta Cortezão (13/JUN/2022);

6º) (Com)Pulsão Poética VI: TidaFeliz, Amanda Pereira Santos e Rozana Gastaldi Cominal – mediação de Ale Heidenreich (15/JUN/2022);

7º) (Com)Pulsão Poética VII: Fátima Soares, Hydelvídia Cavalcante e Marina Neder Monteiro – mediação de Lucila Bonina Simões (17/JUN/2022);

8º) (Com)Pulsão Poética VIII: Valéria Pisauro – mediação de Carollina Costa (19/JUN/2022);

9º) (Com)Pulsão Poética IX: Vânia Perciani, Tati Vidal e Rita Alencar – mediação de Flavia Ferrari (20/JUN/2022);

10º) (Com)Pulsão Poética X: Amélia Costa, Helena Terra e Dorlene Macedo – mediação de Ale Heidenreich (22/JUN/2022);

11º) (Com)Pulsão Poética XI: Sandra A. Santos, Tainá Vieira e Lucirene Façanha – mediação de Lucila Bonina Simões (24/JUN/2022);

12º) (Com)Pulsão Poética XII: Célia Oliveira, Fátima Sá Sarmento e Karla Castro – mediação de Carollina Costa (26/JUN/2022);

13º) (Com)Pulsão Poética XIII: Neli Germano, Amana Assumpção e Noélia Ribeiro – mediação de Flavia Ferrari (27/JUN/2022);

14º) (Com)Pulsão Poética XIV: Malu Baumgarten e Carla De Sà Morais – mediação de Ale Heidenreich (29/JUN/2022);

15º) (Com)Pulsão Poética XV: Rilnete Melo, Lisieux Beviláqua e Érika Foresti – mediação de Lucila Bonina Simões (01/JUL/2022);

16º) (Com)Pulsão Poética XVI: Giulia Nogueira, Maria da Paz Farias e Heloisa Helena Garcia – mediação de Carollina Costa (03/JUL/2022);

17º) (Com)Pulsão Poética XVII: Cláudia V. Lopes, Sandra Santos e Adriana Bandeira – mediação de Flavia Ferrari (04/JUL/2022);

18º) (Com)Pulsão Poética XVIII: Rozana Nascimento, Cíntia Colares e Aline Leitão – mediação de Ale Heidenreich (06/JUL/2022);

19º) (Com)Pulsão Poética XIX: Wilma Amâncio, Lígia Savio e Lua Lopes – mediação de Lucila Bonina Simões (08/JUL/2022);

20º) (Com)Pulsão Poética XX: Araceli Sobreira, Patrícia Cacau e Jeane Bordignon – mediação de Carollina Costa (10/JUL/2022);

21º) (Com)Pulsão Poética XXI: Aurora Castro Mourão, Marta Cortezão e Rita Queiroz – mediação de Flavia Ferrari (11/JUL/2022);

22º) (Com)Pulsão Poética XXII: Eloísa Aragão, Chris Lafayette e Rai Albuquerque – mediação de Ale Heidenreich (13/JUL/2022);

Entretanto, não paramos apenas nestas (com)pulsões poéticas, realizamos também o quadro Caldeirão Literário, via canal do Youtube Banzeiro Conexões. Neste quadro, o objetivo foi celebrar a escrita de autoria feminina, discorrendo sobre as obras autorais das poetas, escritoras convidadas. Cada episódio abraçava uma temática para temperar o caldeirão das Bruxas. Foram 4 episódios, cujos textos eram publicados, aqui, no Feminário Conexões. Vamos a eles:

1º) Caldeirão Literário I: DAS FLORES QUE PERFUMAM O CAMINHOMaria Alice Bragança, Teresa Bendini, Clara Athayde, Cátia Castilho Simon e Dani Espíndola (11/JUN/2022);

2º) Caldeirão Literário II: DA FORÇA DOS SONHOS QUE NOS MOVEIsa Corgosinho, Margarida Montejano, Elisa Lago, Maria do Carmo Silva e Tânia Alves (18/JUN/2022);

3º) Caldeirão Literário III: DAS PULSÕES SUBVERSIVAS DA LINGUAGEMLiana Timm, Cris Mesquita, Dalva Lobo, Flavia Ferrari e Lindevania Martins (02/JUL/2022);

4º) Caldeirão Literário IV: DO PEDREGO(ZO)SO CAMINHO DA ESCRITAHeliene Rosa, Marina Marino, Patrícia Cacau, Manuela Lopes Dipp e Heliana Barriga (09/JUL/2022).

          Mas a história não acaba aqui. É apenas uma pequena pausa. Estamos escrevendo!

 

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