quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

LIVROS & ENCANTAMENTOS: A LIBERDADE QUE VEM DA IDENTIFICAÇÃO, POR ROBERTA GASPAROTTO



LIVROS & ENCANTAMENTOS/04

'CARTAS QUE NAO ESCREVI", DE MARIA ALICE BRAGANÇA 


POR ROBERTA GASPAROTTO


Em "Cartas que não escrevi”, da poeta gaúcha Maria Alice Bragança (Editora Casa Verde, 2019), o eixo temático de seus poemas se encontra naquele tempo espaço tão conhecido, quanto inefável, de algo que aconteceu, e se perdeu, ou, inversamente, do que não aconteceu mas fica entranhado dentro da gente. É um livro de desencontros, muito mais que de encontros; de perdas, muito mais que ganhos e, de melancolia, muito mais que alegria. E isso só faz os poemas de Maria Alice ganharem mais potência e verdade. Em meio a tantos desencontros, uma saída: a vida. Aquela comezinha, corriqueira, bem do dia a dia. A leitora e o leitor nem precisam chegar ao final do livro, para experimentarem uma incrível sensação de liberdade, que só a identificação pode oferecer: Maria Alice sabe que o constante espanto com o mundo é o nosso pão de cada dia, e cada qual que encontre o seu refúgio, sempre provisório e a ser recriado, todo santo dia.


Para ouvir o PODCAST clique AQUI.


Fotografia desbotada

No olho da menina,

retina, a imagem farta,

(retida)

da vida que ainda não vivi.


***


Teia


Onde está o meu amor?

Sonha comigo? Ou contempla o seu umbigo?

Em que cidade, em que pensamento, se perdeu nesse momento?


Teço fios para laçá-lo

Antes que o lirismo me sufoque.

Penetro o sonho do meu amor,

Pensando nele

... e lixando as unhas


***


Um sentimento/Incomunicável


Só nós dois sentimos o que sentimos.

Estamos sós.

Não há discurso possível.

A palavra é sempre passado.

Um real que não volta,

Um eu que é sempre outro.

Discurso fadado a descrever cadáveres

Do que se foi, 

Seguimos, mórbidos,

Falando sobre nós.




Um comentário:

  1. Que beleza suas resenhas das obras das manas escritoras, querida Roberta. Me sinto feliz em poder dialogar nesse espaço com mulheres acolhedoras e sensíveis como você. Dar vontade de ler mais a obra da Maria Alice, graças as suas belas observações. Beijos e flores querida.

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