sexta-feira, 23 de setembro de 2022

PROTAGONISMO FEMININO EM TERRA TRAÇADOS E LIVROS: NAS VOZES DA MEMÓRIA, DE ENIVALDA NUNES FREITAS E SOUZA



PROTAGONISMO FEMININO|05 

PROTAGONISMO FEMININO EM TERRA TRAÇADOS E LIVROS: NAS VOZES DA MEMÓRIA, DE ENIVALDA NUNES FREITAS E SOUZA

POR HELIENE ROSA  

     Terra Traçados e Livros: nas vozes da memória (2021) é um livro que apresenta narrativas e relatos de quatro gerações da família da autora, Enivalda Nunes Freitas e Souza, que é professora universitária e pesquisadora na área de Literatura Brasileira, com ênfase em Poesia e Crítica do Imaginário. Sem dúvida, essa obra representa um momento de maturidade da escritora, quando ela se volta para si mesma, resgatando a história do seu clã, revisitando suas próprias origens. Ao mesmo tempo em que recupera a história recente do país, que não pode ser esquecida. 

Capa de Terra, Traçados e Livros: nas vozes da memória

Contracapa

Em sua trajetória profissional, na academia, a autora publicou diversos livros: Experimentando a vida: cotidiano, esperanças e sensibilidades (2008), Roteiro poético de Hilda Hilst (2009) e Sonho de um repentista versos do poeta logogrífico Canelinha (2009), todos pela Editora da Universidade Federal de Uberlândia (EDUFU). Pesquisadora dedicada, Enivalda Freitas fundou o grupo de pesquisa - POEIMA: Grupo de Pesquisa Poéticas e Imaginário,- onde produziu outros livros: Reflexos e sombras: arquétipos e mitos na literatura (2011) pela Cânone Editorial. Sua pesquisa de Pós-doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) resultou na publicação da obra Flores de Perséfone: a poesia de Dora Ferreira da Silva e o sagrado (2013), pela Editora Cânone, com o patrocínio da FAPEMIG. Mais tarde, no ano de 2016, organizou Poesia com deuses – Estudos de Hídrias, de Dora Ferreira da Silva, que saiu pela Editora 7Letras, obra igualmente financiada pela FAPEMIG. 

Enivalda Nunes Freitas e Souza
[foto arquivo pessoal da autora]

A leitura de Terra Traçados e Livros: nas vozes da memória nos revela uma autora sensível e atenta aos problemas sociais, econômicos e políticos da história recente do nosso país. Da trama, por onde circulam matriarcas e patriarcas, emergem fatos e relatos históricos aos quais a autora dá o devido acabamento. Então sua voz se mostra sensata e preocupada com o desenvolvimento sustentável do país e com a melhoria da qualidade de vida da população, sobretudo das classes sociais desprestigiadas. A autora comenta: Não resta dúvida de que a escola pública no Brasil sempre foi negligente para com a população menos favorecida. Acreditamos, também, que a região em que nossos pais viveram, o sudeste goiano, estava, aos olhos da capital, a caminho dos fundões do Brasil. Em suas grotas, em suas casas de pau a pique, em suas fazendas sem nenhum adorno, a pobreza era multiplicada com a falta de Educação. (SOUZA, 2021, p.52) No trecho em questão, a autora aborda uma pesquisa realizada sobre o ensino, em Goiás, sua terra natal, durante as décadas de 1940-1950. Nesse aspecto, ganha relevo a figura materna – Aldacira - e sua trajetória, como mulher que lutou por melhorias para a família. Ressalta sua inserção no mercado de trabalho: após aprimorar-se nos estudos, deixou o trabalho a partir de casa, na máquina de costura, para trabalhar como professora, no serviço público. 

Enivalda Nunes Freitas e Souza
[foto arquivo pessoal da autora]

Emocionante e bonito é o trecho em que se faz menção à luta da mãe para adquirir livros e materiais escolares para os filhos pequenos: “Resfolegante, mas não arqueada, finalmente nossa mãe entrou em casa com o pacote de livros didáticos dos três filhos menores. Como muitas vezes o fizera em Iporá-GO, adquirira o material a prestações na Papelaria Rodarte” (Souza, 2021, p.45). A trajetória de luta de Aldacira reflete a realidade das mulheres da classe trabalhadora no Brasil. Como professora, ela trabalhava em dois períodos e, ainda assim, tinha que ter “jogo de cintura” para garantir que os filhos pequenos tivessem condições materiais de permanecer estudando. A desvalorização do trabalho docente, a tripla jornada das mães trabalhadoras, a injusta distribuição de renda e outras mazelas sociais aparecem, subrepticiamente, nesse trecho da narrativa. Entretanto, tal constatação não reduz a importância do protagonismo feminino como fator determinante para as transformações positivas que levaram a família a um patamar social e econômico mais elevado. Das importantes reflexões que essa trama narrativa suscita, sem dúvida, avulta a constatação da grande relevância da Educação, sobretudo da Educação Pública para o desenvolvimento da nação. 

A obra evidencia o poder que a escolarização formal tem na transformação desse Brasil pobre e interiorano, muitas vezes esquecido, pelas elites e pelo poder público. Nesse contexto, a escritora revisita acontecimentos e cenários que envolvem a história da sua família. Evoca as matriarcas, a avó, a mãe, as tias, reavivando, no decorrer da trama, curiosidades e modos pitorescos de falar e de se comportar envolvendo pessoas do seu convívio familiar. A maneira como são apresentadas as mulheres da família revela a forte influência dessas personalidades sobre o psiquismo da autora. No capítulo dedicado à tia Almira, lemos: "Que jeito inconfundível de se expressar. Com que graça e eficiência ela usava o substantivo trambeco, que significa “coisa”: “Fulano, pegue aquele trambeco pra mim!”. Não é um neologismo seu, mas jamais ouvimos essa delícia de palavra da boca de outra pessoa. Com esse substantivo, que se aproxima do “trem” mineiro, tia Almira economizava tempo, ganhava tempo. As palavras e as pessoas... (SOUZA, 2021, p.88) O modo goiano de falar e de se expressar, aqui representado pela fala de tia Almira, aparece carregado de intencionalidades, evidencia uma espécie de consciência semântica e pragmática no uso corrente da linguagem. A tia usava um termo que poderia, talvez, ter sido cunhado por ela mesma ou ser de uso exclusivo dela, com o intuito de subverter a lógica do próprio tempo. O foco nas questões atinentes à linguagem é constitutivo do modo como atua essa pesquisadora que, há anos, trabalha com as Letras e com as Literaturas. 

Enivalda Nunes Freitas e Souza
[foto arquivo pessoal da autora]

Enivalda Nunes Freitas e Souza é intelectual que adentra os mistérios da poesia, do mito, do simbolismo e das formas fugidias para lançar luz sobre o que é profundo e belo, motivando estudantes, professores, pesquisadores e amantes da literatura a se enveredarem pelo caminho da leitura, da escrita e da sensibilidade poética. O resgate da memória, a partir da pesquisa comprometida e da valorização das fontes vivas carrega, para a superfície de seu texto, significativos debates em favor da construção de uma nação menos desigual. Nesse aspecto, a promoção da saúde pública como mecanismo para a melhoria da qualidade de vida da população ganha relevo. 

Os enredos revelados no decorrer da narrativa esclarecem sobre o valor do SUS, Sistema Único de Saúde, principalmente para parcelas da população brasileira com menor poder aquisitivo e/ou localizadas em regiões menos estratégicas na comparação com os grandes centros urbanos. Aliada às conquistas sociais advindas com a educação, a autora ressalta a importância do SUS para a nação brasileira. Enivalda esboça um painel da precariedade da saúde em nosso país a partir das doenças do patriarca quando criança e do sonho de Aldacira, mãe de seis filhos, para ter acesso ao atendimento médico-hospitalar, objetivo alcançado com o cargo de professora. Para mostrar como era a saúde no Brasil antes do SUS, a narradora colhe, além das memórias familiares, depoimentos de autoridades na área. 

Desta forma, o livro é mais do que a história de uma família, é um registro do desenvolvimento do próprio povo brasileiro. E a autora, muito mais que uma pesquisadora comprometida, é uma intelectual antenada com os desafios sociais, econômicos e políticos do país; é uma escritora sensível e talentosa que, por meio da saga de seu clã, esboça um Brasil que precisa ser reconhecido e transformado para o desenvolvimento sustentável da nação. Enivalda Nunes de Freitas e Souza é, acima de tudo, uma mulher vencedora, protagonista de sua história, cujos traçados e livros admiráveis constituem importante legado para futuras gerações de mulheres, incentivando-as, com o seu exemplo e com o seu trabalho. Profissional competente que inspira as outras a transformarem desafios em mote para o trabalho produtivo e transformador com a docência, com a pesquisa, com o amor pela poesia e com a escrita literária. 

Heliene Rosa e Enivalda Nunes Freitas e Souza
[foto arquivo pessoal da autora]

Para conhecer melhor a autora e o conjunto de sua obra, encontre-a nas redes sociais: Eni Freitas E Souza (@enifreitasesouza) • Fotos y videos de Instagram

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REFERÊNCIA:

SOUZA, Enivalda Nunes Freitas e. Terra, traçados e livros: nas vozes da memória. Belo Horizonte: Ramalhete:Tlön Edições, 2021. 273p. 

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Heliene Rosa



Heliene Rosa é poeta mineira, professora e pesquisadora das poéticas femininas. Escreve para o Blog Feminário Conexões e publica textos em antologias literárias nacionais e internacionais. Além da produção poética, tem publicações acadêmicas sobre a produção feminina na literatura e articula projetos e eventos de leitura literária.


 

VERBO MULHER: HELENA TROUXE O AMOR, POR HELENA TERRA


 

V E R B O M U L H E R|03

HELENA TROUXE O AMOR

POR HELENA TERRA 


        Outro dia morreu a rainha da Inglaterra. E, nas minhas redes sociais, uma boa parte dos posts e comentários foram dentro do padrão afetivo que rege o Brasil de uns anos para cá, ou seja, dentro do discurso de ódio atribuído apenas à Direita do país. “A armadilha do ódio é que ele nos prende muito intimamente ao adversário”, escreveu o Milan Kundera. Portanto, o ódio não é uma boa ideia. Eu, por sorte, não tenho uma natureza convergente com hostilidades e grosserias. Apesar de vir de uma família, usando um eufemismo, barulhenta, não fui socializada por pais que queriam a cabeça de A ou o coração de B e “que tudo o mais vá para o inferno”. Queriam paz e respeito entre nós, os filhos, entre si e com a sociedade em que vivíamos, o que, de modo algum, significava cegueira, alienação ou conivência com a época. Eu nasci, fui criança durante o período militar numa cidade pequena em que havia um batalhão, e os meus pais, diferentemente de muitos outros, abrigaram em nossa casa todos os jovens chamados, pelo sistema, de subversivos que puderam. Assunto importantíssimo, mas que agora não vem ao caso, porque esse texto é para falar sobre o amor. 

      Sim, o amor, esse sentimento, patrimônio emocional, sonho tão almejado mundo afora. Não que eu o conheça e domine e não que eu não o conheça e domine. Estou, aludindo ao título da obra do Marcel Proust, ainda em busca do amor não perdido. E digo não perdido porque a ideia de tê-lo encontrado e tê-lo deixado ir me é insuportável. O amor, dizem, quando recíproco e verdadeiro, se enraíza. Não sei. Sou solteira. Não. Sou divorciada.  Vinte anos passei casada. E não foi fácil dar por encerrado esse tempo e vínculo. Mas enfim consegui. Conseguimos, mesmo que às vezes nos oferecendo um copo de cólera.

       Um Copo de Cólera foi o primeiro livro que eu li do Raduan Nassar. Para quem não o leu, fazendo breve sinopse, ele gira em torno de uma briga depois de uma trepada fenomenal. Serei eu censurada por escolher essa palavra? Julgada por trepada não soar elegante na boca de uma mulher? Não que eu não tenha sido julgada antes, mas, desde que o senhor que está ainda na presidência dessa república recebeu sua faixa, sem sombra de dúvida, os julgamentos sobre o que falo, escrevo, visto, canto, faço etc. aumentaram, duplicaram, multiplicaram-se. E esses julgamentos vieram de todos os lados, inclusive dos homens da Esquerda, os homens pelos quais nutro mais simpatia. Ou nutria. Eu já não sou a mesma. Nunca fui a mesma. Sempre vivi dentro do Livro do Desassossego, do Fernando Pessoa, ou melhor, do Bernardo Soares, apesar da minha natureza pacienciosa e estável. 

       Mas voltemos ao livro do Raduan Nassar. Ela, a protagonista, é, segundo o homem que a ama, uma “jornalistinha de merda”; e ele, segundo ele mesmo, não passa de um “biscateiro graduado”. Autodefinição que não o constrange. “Confesso que em certos momentos viro um fascista, viro e sei que virei, mas você também vira fascista, exatamente como eu, só que você vira e não sabe que virou; essa é a única diferença, apenas essa”, ele, lá pelas tantas, diz. E então aqui me pergunto se o amor aceita também raiva, humilhação, violência? E mais, como eu sei que amo alguém? Hoje de manhã, o Marcelo Branco, um amigo, aqui do Sul, "legado da não miséria" de um relacionamento que vivi, me enviou um vídeo em que a psicanalista Maria Homem fala sobre esse tema.

      Diz a Maria Homem: “se você faz essa pergunta é porque a resposta é não, você não está amando ... Por quê? Porque quando você começa a se interrogar, começa a racionalizar, começa a medir os prós e contras, os defeitos, mas também as qualidade, veja bem, não gosto muito, mas, bom, minha vida é confortável ... quando você entra nessa posição que, em última instância, é absolutamente moderna, utilitarista, que vai fazer a mensuração do maior bem possível para o menor mal possível, é que aí você já está na equação utilitária sobre as relações e os pactos sociais.” 

       E o que eu penso sobre isso? Marcelo me fez essa pergunta. De fato, estabelecer uma união pautada em benefícios causa estranheza. Sua presença me faz bem, não faz bem, faz bem, gosto disso e daquilo, não gosto, esse bem-me-quer-mal-me-quer do cérebro e do ego me incomodam e tocam um alarme. Pode ser falso, é claro. No livro O Amor Nos Tempos Do Cólera, do Gabriel Garcia Marquez, Florentino Ariza esperou pelo amor de Fermina Daza durante cinquenta e nove anos, dois meses e quatro dias depois de ter sido dispensado por ela que não o amava ou amava e não sabia. Pois é. E haja paciência! O bom é que ele não esperou sentado. Tampouco ela. Fermina, na cama do marido que não a amava, mas a queria bem. O que é esse tal de querer bem?

      “Ele tinha consciência de que não a amava. Casara-se porque gostava da sua altivez, sua seriedade, sua força e também por um tipo de vaidade, mas enquanto ela o beijava pela primeira vez teve a certeza de que não haveria nenhum obstáculo para inventar um bom amor”, o narrador revela a respeito do homem a quem ela, usando um clichê, entregou o coração. Florentino, por sua vez, esperou solteiro, conhecendo outras mulheres. Dezenas, ou terá sido centenas? Faz diferença a quantidade? Sexo não é amor embora o favoreça. E favorecer também não é o suficiente. Se não me engano, Florentino anotava em uma caderneta as tentativas de substituir Fermina, ciente de que não era possível substituí-la mesmo quando ele se entregava a pequenas paixões. Substituir. Talvez o amor desconheça esse verbo, seja exatamente essa impossibilidade. Não sei. Carlos Drummond de Andrade disse que "amar se aprende amando".

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Helena Terra publicou os romances A Condição Indestrutível de Ter Sido (Editora Dublinense, 2013) e Bonequinha de Lixo (Editora Diadorim, 2021). Organizou, com o escritor Luiz Ruffato, a antologia Uns e Outros (TAG Livros, 2017). É coautora na novela Bem que Eu Gostaria de Saber o que é o Amor (Editora Bestiário, 2020, com o ator e escritor Heitor Schmidt). 

 

 

 

quarta-feira, 21 de setembro de 2022

ELES LEEM ELAS: CARMELIANA - A FESTA DAS FLORES, DE ELIANA CASTELA, RONALDO RHUSSO



ELES LEEM ELAS|13

CARMELIANA - A FESTA DAS FLORES, DE ELIANA CASTELA



Quando a gente conhece a autora de perto pode correr o risco de comentar acerca da Obra dela e para falar de Obra, assim com “O” maiúsculo, no caso específico da Eliana Ferreira de Castela, a coisa não é simples, pois ela tem Formação em Geografia (Bacharelado e Licenciatura – UFAC - com Mestrado em Extensão Rural pela Federal de Viçosa), mas com dedicação ao Teatro, pela Associação Arquéthypo do Rio de Janeiro, por exemplo, e participações variadas no Acre e em “lives”, onde exibe sua alegria e talento de uma forma muito gostosa de constatar. É uma propagadora generosa da Arte em todas as suas formas, mas especialmente da Arte Poética que, também, produz e, juntamente com o Jorge Carlos Amaral, divulga mundo afora esse trabalho de milhares de escritores e seus poemas, grande parte no blogue Poemança e através da Folhinha Poética, um Projeto maravilhoso que mostra, desde a primeira edição em 2012, essa infinidade de autores sem se preocupar com reconhecimento, algo que é muito louvável e acrescenta muito à Literatura.

Enquanto eu respirar

Em 2017 ela lançou dois livros Pelos Rios ao Sabor da Fruta (Independente - Rio Branco/Acre) e Da Escrita Rupestre à Era Digital - Alguns Poemas (Chiado Editora). Livros de conteúdo riquíssimo e que me deram alegria ao lê-los...

Mas aqui eu quero falar do livro Carmeliana – A Festa das Flores (Íbis Libris Editora 2019). Ilustrado de uma forma muito bonita e diferente pelo Jorge Carlos, o Mané do Café, com direito a uma gravura da Clara R.

Logo na Apresentação a Eliana dá uma concisa aula acerca das Estações do Ano e justifica a familiaridade que Carmeliana tem com a Primavera, esse momento lindo em quase todas as partes do nosso planeta e a Estação que nós humanos costumamos usar como paralelo com o limiar da vida ou nascimento...


Contracapa do livro Carmeliana

A gente não costuma chamar o belo e o terno de “flor”? “Fulano é uma flor de pessoa”! Por que não personificar, também, as flores numa troca antropomórfica e divertida?

Carmeliana é daqueles livros agradáveis que a gente não pega, folheia e deixa de lado ou “encosta” na prateleira... Não! É um livro gostoso de ler e ficar imaginando ou visualizando as cenas... Aliás, é uma característica muito interessante de muitos dos escritores do Norte do país, esse descrever tão vivamente os detalhes e a Eliana não é diferente, pois ela conversa com a gente através de seus textos.

Neste livro todos os poemas estão vivos!

É, de fato, uma festa das flores e a gente ri, faz pequenas pausas a fim de imaginar os detalhes, quer mostrar para alguém como se faz com coisas boas...

A poética da Eliana é leve, de versos coloridos pelas palavras bem conectadas e cheias de significado. Há lições inseridas, há descrições das espécies de flores... Há um interagir com o pequeno, mas universal mundo dos insetos...

Eliana Castela
[foto do arquivo pessoal da autora]

Carmeliana é um livro que no primeiro olhar já denota um bom olor no ar e na vida; um destilar de poemas concisos, mas que brindam com alegria a mãe Natureza tão tratada com desdém há anos, porém muito mais nesses nossos dias incertos...  

O certo é que você vai ter uma gostosa experiência nessa leitura e vai cair na festa com as flores!

Que venha a Primavera!





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[foto arquivo pessoal da autora]

Eliana Ferreira de Castela – de Rio Branco, Acre, é poeta e escritora. Graduada em Geografia (UFAC), mestre em Extensão Rural (UFV). Participou de diversas antologias/coletâneas nacionais. Autora de três livros: “Da Escrita Rupestre à Era digital”, autoria própria. “Pelos Rios ao Sabor da Fruta”, Chiado Editora e “Carmeliana: a festa das flores”, editora Ibis Libis.                                


Ronaldo Rhusso: autor anual de “Meditações para o Pôr do Sol” da Casa Publicadora Brasileira pela União Sudeste dos IASD, do Compêndio poético “2016, o Dia, o Tema e o Poema” (produção independente) e de “Atos de Jesus” pelo Clube de Autores (2022), além de cordéis em parceria com membros da Academia de Cordel do Vale da Paraíba. Escreve, principalmente, no site “Descanso das Letras” e em seu blogue particular “A Sós Com a Poesia”.





UMA CARTOGRAFIA DA ESCRITA DE MULHERES: ENTREVISTA COM GABRIELE ROSA, POR GABRIELA LAGES VELOSO



UMA CARTOGRAFIA DA ESCRITA DE MULHERES |01

ENTREVISTA COM GABRIELE ROSA

Por Gabriela Lages Veloso


De acordo com Regina Dalcastagnè (2007), nosso lugar na sociedade é definido por etnia, classe social, gênero, idade, orientação sexual, e, experiências. Esses são fatores decisivos para o nosso modo de enxergar e compreender o mundo. Por esse motivo, um homem, mesmo sendo empático e solidário, não terá experienciado as dificuldades sofridas pelas mulheres, cotidianamente, tais como “ser analisada prioritariamente pela aparência física, o temor da violência sexual, o preconceito renitente nos espaços profissionais. É essa perspectiva feminina (e não um estilo ou uma temática específica) que só as mulheres podem trazer ao discurso literário” (p. 126). Nesse sentido sobreleva-se a escrita de mulheres. 

Entretanto, conforme Simone de Beauvoir (1975), em uma entrevista concedida ao programa Questionnaire, “basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante durante toda a sua vida”. Diante disso, a literatura manifesta-se como uma importante arma de combate contra as desigualdades de gênero, ao dar voz e poder às mulheres. Na intenção de mapear as margens e abrir espaço para as novas vozes sociais, nossa coluna intitulada Uma Cartografia da Escrita de Mulheres terá como principal objetivo promover a valorização de escritoras contemporâneas, através de entrevistas. Em nossa estreia, temos a honra de receber a escritora Gabriele Rosa, que entrelaça a Literatura com a História, o Teatro e as Artes Visuais.

ENTREVISTA COM GABRIELE ROSA: 

Arquivo pessoal da autora

Gabriele Rosa é carioca, vive no Rio de Janeiro. Historiadora, poeta, artista visual, confeiteira, artesã da palavra e da cena, atua como dramaturga de processo e dramaturgista na Bonecas Quebradas Teatro. Bacharela em História pela UFRRJ, integra o coletivo CuidadoPoema. É autora de Fendas extraordinárias (Patuá, 2019) e de Lavínia é mais Rosa que Espinho (Motta, Carla, Libertinagem, 2022). Assina a dramaturgia do Radiodrama Tiro suas camadas de esmalte (contemplado no edital Cultura Presente nas Redes 2 – com patrocínio do Governo do Estado do Rio de Janeiro, Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa, 2022). Tem obras publicadas em mídias impressas e digitais no Brasil, Portugal e México. Colabora mensalmente com a coluna “memórias táteis, intempéries e outras derivas” na revista Ruído Manifesto.

Como você começou a escrever?

A escrita sempre foi pulso e centralidade das minhas vivências. Cresci entre o maravilhamento da leitura (iniciada na primeira infância, aos cinco anos) e o hábito da escrita diária (cartas, poemas, diários e ‘sonhários’). Um privilégio dentro das desigualdades cotidianas dos subúrbios cariocas. O acesso às bibliotecas públicas e salas de leitura foram fundamentais na minha trajetória. Segui sempre lendo muito e nunca deixei de escrever, mas desacreditei da minha escrita durante anos. Só em 2017, após uma mudança profissional, aceitei a literatura como expressividade. Abracei a minha escrita.

A sua formação acadêmica, na área de História, tem alguma influência na sua escrita literária?

Sim. De forma muito próxima. Entendo os ofícios como distintos, nos quais trabalho dissociadamente, mas que se entrecruzam de forma muito orgânica nos meus processos de criação. A minha escrita, seja a literária ou a dramatúrgica, é atravessada pelo meu olhar enquanto historiadora. Estruturada no tripé: pesquisa, leitura e imersão-experimento, o tempo da pesquisa é maior que o da escrita, na maioria das vezes. Criar estofo, embasamento teórico, perscrutar engrenagens dentro da linguagem, desenvolver métodos para transitar entre gêneros literários, investigar códigos de plausibilidade (para deslocá-los) e pensar nos vínculos implicativos entre estratos de tempo – passado, presente, futuro - são frutos de pesquisa e formam as teias nas quais construo histórias. Entendo que a pesquisa historiográfica me possibilita ampliar e refabular narrativas. Acredito que o historiador deve se autorizar a propor e perspectivar linguagens.

Quais escritoras(es) te inspiram?

Vou citar os que estão sempre na cabeceira e os que estou lendo atualmente, não necessariamente nessa ordem: Ana Cristina Cesar, Grace Passô, Roberto Bolaño, Alejandra Pizarnik, Carolina Maria de Jesus, Susan Sontag, Nina Rizzi, Lubi Prates, Julio Cortázar, Danielle Magalhães, Victor Heringer, Carla Diacov, Guilherme Gontijo Flores, Walter Benjamin, Lilian Sais, Bruna Beber, Leda Maria Martins, Guimarães Rosa, Lélia Gonzalez, Machado de Assis, Michel Foucault, entre alguns outros. Estou sempre aberta aos encontros, diálogos e espantos, com as obras de outres.

Conte-nos sobre o seu primeiro livro, Fendas extraordinárias (2019). Como foi o processo de escrita? Quais temáticas você aborda? Onde podemos adquiri-lo?

Fendas extraordinárias é um livro de contos e foi publicado pela editora Patuá, em 2019. Os contos presentes no livro foram escritos como exercícios de marginação literária durante as disciplinas optativas sobre letramento histórico crítico-genético e escrita criativa, no período de um ano e meio, ministradas no curso de História da UFRRJ pelo docente Dr. Alexander Martins Vianna. Kafka, Machado de Assis, Monteiro Lobato e Chico Buarque, são algumas das referências presentes no livro. Há um intertexto maior com peças de Shakespeare. Abordo violências de gênero, classe e raça, costuro femininos-sintoma e masculinos viciosos. O processo de escrita foi intenso, imersivo e arrebatador. Foi um período de (re)conhecimento da minha própria escrita. Atravessei o espelho. Durante a feitura dos contos percebi a necessidade de pensar uma classificação (possível) do experimento narrativo criado. Apenas necessitava nomear a narratividade tecida em camadas temporais múltiplas, que não se aproximavam dos artifícios do flashback e viagem no tempo. Desde então, passei a adotar a classificação de ‘contos regressivos’, a fim de mapear dentro do gênero como a construção de desentendimento do que se narra ocorre no tempo regressivo da consciência de quem conta, considerando um narrador em primeira pessoa que se desentende enquanto avança (regride) e o exercício constante de criar códigos de plausibilidade. O que se tornou um método de escrita, uma artesania. A classificação não me incomoda, mas está aberta, assim como as fendas cavadas no livro. Fendas Extraordinárias é um exercício de linguagens. É possível adquiri-lo no site da Editora Patuá.

Comente, também, sobre Lavínia é mais rosa que espinho (2022). Como foi a experiência de escrever um livro juntamente com outra escritora? Qual é a proposta dessa obra? Onde podemos adquiri-la?

Lavínia é mais rosa que espinho é um livro de prosas poéticas, em parceria com a escritora Carla Motta, publicado pela editora Libertinagem (2022), abordamos as violências cotidianas de gênero. Femininos diversos narram horrores banalizados e brutalidades há muito tempo enraizadas na sociedade contemporânea. A obra tem tom de denúncia. De abraço. E de troca. O livro tece respiros e enfrentamentos por meio de versos cortantes e imagens quase que fotográficas do narrado, sem lançar mão de sutilezas poéticas. Tendo a personagem Lavínia - máscara social e genética da virtude feminina - da peça Tito Andrônico, de Shakespeare, como mote inicial, expandimos nossas fabulações e experimentos artísticos-poéticos a partir de instalações performáticas homônimas ao livro; realizadas em 2017, e em 2019, na UFRRJ e no Centro Cultural Phábrika, respectivamente. Ressignificada a partir da fragmentação de vozes, despersonalizadas por vezes, entrecruzada por violências de classe, raça, sexuais, psicológicas, entre outras, Lavínia é mais rosa que espinho vestida de livro é um ajuste de olhar. Um convite à reflexão e ao ato. Um acontecimento. Luta e luto. Mergulhar nas feridas e nos silenciamentos dos femininos com fôlego de mar aberto se faz possível e urgente. Escrever com a Carla, que é uma grande amiga e parceira de experimentos artísticos desde a graduação, foi fluido e orgânico. Os processos colaborativos me interessam, as trocas, partilhas e parcerias artísticas me mobilizam. E para o Lavínia teve um fato curioso, escrevemos o livro para a primeira chamada de autoras da editora Libertinagem, e desenvolvemos um método para configurar nossa coautoria, já que escrevemos os textos separadas. A escolha por prosa poética foi um fator determinante, individualmente temos poéticas muito distintas. O livro pode ser adquirido no site da editora Libertinagem.

Além de escritora, você também é dramaturga. Na sua opinião, existe alguma relação entre a literatura e o teatro?

Sim, são áreas correlatas e distintas. Assim como história e literatura, ou história e teatro. Em cada uma atuo dentro de suas especificidades, e de forma dissociada, mas como disse anteriormente, nos meus processos de criação, independente da linguagem (artística ou não) enquanto suporte material de expressividade há o entrecruzamento de múltiplos campos. Um alimenta o outro, e juntos reverberam na minha obra.

Como é o seu processo de escrita?

Muito de caos, um tanto de cosmos e um punhado de afetos. Meu processo de escrita é imersivo, envolve experimentos em múltiplas linguagens artísticas (referenciais e práticas), cotidianas (confeitaria, meditação e outras miudezas) e muita pesquisa, tanto temáticas quanto estruturais. Minha artesania é tátil, meu corpo sempre está à disposição para os meus processos de criação. Não limito os experimentos, por vezes começa livro e cresce performance, cena ou instalação visual, assim como, são abertos, horizontais e rizomáticos. Escrevo todos os dias e sempre que possível em lugares diversos, gosto de caminhar com a minha escrita. Para as pesquisas, escrita acadêmica e dramatúrgica reservo às manhãs, e estes são processos pontuais e específicos, com maior rigor de tempo-espaço, preciso de silêncio e concentração. Já a produção literária é completamente notívaga, o período entre 22h e 5h é o meu lugar de conforto e expansão. É quando minha medula está mais viva.

Desde 2017, você integra o coletivo CuidadoPoema. Qual é a importância dos coletivos para as escritoras contemporâneas?

Os coletivos artísticos são importantes como espaços plurais de experimentos de linguagens. Possibilitam as trocas, partilhas e estudos de forma colaborativa. E para as escritoras contemporâneas fomentam e visibilizam seus trabalhos. Entendo como uma forma de organização, enfrentamento e reexistência para mulheres artistas que ao longo da história sofreram (e ainda sofrem) com apagamentos e silenciamentos.

Fale sobre os seus projetos na área da literatura, cultura e teatro, como, por exemplo, o Radiodrama Tiro suas camadas de esmalte (2022).

Desde fevereiro de 2020, sou colaboradora da Bonecas Quebradas Teatro, atuo como dramaturga de processo e dramaturgista. Estamos em processo de ensaio do espetáculo Memórias de uma Manicure. O Radiodrama Tiro suas camadas de esmalte foi um braço desse projeto, que compreende diversos produtos artísticos. Nele, temos uma experiência acústica sem componente visual que pretende desenhar pelo som a imaginação dos ouvintes. Ouvimos as manicures Danielle e Jéssica ensaiarem uma entrevista para uma peça teatral sobre manicures. O radiodrama foi contemplado no edital Cultura Presente nas Redes 2 – com patrocínio do Governo do Estado do Rio de Janeiro, Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa, 2022, e está disponível no canal do YouTube da Bonecas Quebradas Teatro. Ainda dentro do projeto Memórias de uma Manicure, também contemplado no edital Cultura Presente nas Redes 2, realizarei (novembro/2022) leituras abertas de quatro contos do livro ainda inédito Afetos Postiços, que tem previsão de lançamento para o primeiro semestre de 2023 (a sair pela Ofícios Terrestres Edições), no livro as duas personagens-manicures do radiodrama narram o cotidiano fabular do salão e suas vivências pessoais. Tenho alguns projetos de livros, performance e instalação visual, em processo. Todos para o próximo ano. Em breve, novidades.

Como convidada especial, na estreia da nossa coluna Uma Cartografia da Escrita de Mulheres, qual mensagem você deixa para a nova geração de escritoras?

Primeiramente, agradeço o convite, é uma alegria. Me sinto muito honrada por abrir os caminhos da coluna, e ressalto a importância de espaços como esse, com o intuito de visibilizar o trabalho de mulheres, escritoras e artistas contemporâneas. Que os caminhos sigam abertos. Evoé! Se posso deixar uma mensagem para a nova geração de escritoras é: acreditem nas suas escritas e estudem. O ofício da escrita é laborioso, artesanal, tátil. Demanda um tempo próprio. É pulsão de vida. Leiam muito, pesquisem, teçam diálogos com outras (os) autoras (es), experimentem múltiplas linguagens artísticas e divirtam-se.


Contatos da escritora:

Instagram: @_gabrielerosa

E-mail: gabrielerosa20@gmail.com

Linktree: linktr.ee/gabrielerosa


REFERÊNCIAS:

BEAUVOIR, Simone de. Por que sou feminista? Entrevista concedida ao programa “Questionnaire”, em 1975. Disponível em: <https://bit.ly/3zr52O9>. Acesso em: 17/09/22.

DALCASTAGNÈ, Regina. Ilusão e referencialidade: tendências da narrativa brasileira contemporânea. In: Signótica, v. 19, 2007. 

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Gabriela Lages Veloso é escritora, poeta e mestranda em Letras pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). É colunista da Revista Sucuru e do Feminário Conexões, editora do núcleo poético de divulgação feminina Sociedade Carolina e membro do projeto Entre Vasos y Versos, que conta com a participação de escritores de diversas nacionalidades. Além disso, colabora com coletâneas e revistas nacionais e internacionais. Em 2023, organizou a Antologia Poéticas Contemporâneas: uma cartografia da escrita de mulheres, juntamente com a Editora Brecci Books.

sexta-feira, 16 de setembro de 2022

NA TRILHA DO FEMININO: AMAR - ELO QUE FAZ A COR DAR, POR RILNETE MELO


N A   T R I L H A   D O   F E M I N I N O|04

 AMAR - ELO QUE FAZ A COR DAR

Por RILNETE MELO


"Marisa,  26 anos, universitária, teve fotografias íntimas divulgadas pelo seu ex-namorado. A jovem terminou um relacionamento de 8 meses e  Túlio, seu parceiro inconformado, chegou a ameaçá-la de morte. Marisa fez o boletim de ocorrência face à ameaça e, então Túlio vazou as fotos da sua ex-amada nas redes sociais, em sites pornográficos e perfis falsos do Instagram.  Tal fato quase leva Marisa a tirar sua própria vida."

O relato acima é matéria de jornal e os nomes são fictícios,   mas a realidade sobre a exposição imagética feminina no ciberespaço é preocupante, pois tem levado muitas pessoas ao suicídio.


Pegando carona nesses meados de “setembro amarelo", eu faço uma breve reflexão sobre o assunto,  pois a violência contra as mulheres na Internet tem gerado uma onda de suicídio e tem me  incomodado muito. Há alguns meses, a filha “trans”  de uma amiga minha, sofreu bullying e injúria através de comentários em uma rede social, chegando a cortar os pulsos.  Outra filha de uma conhecida,  teve um vídeo intimo viralizado no ciberespaço e tentou envenenar-se com medicamentos.... São muitos os casos!  Vamos fazer valer a campanha de prevenção ao suicídio que visa a conscientização sobre esse grave problema e formas de evitá-los. Fiquemos atentas para o sinal de alerta e vigiai o espaço virtual!

Sou consciente que  existe uma dificuldade de controle das novas tecnologias,  mas convenhamos que a existência de leis, como a  13.718/18 que tipifica crime de divulgação de imagens, não é uma condição para erradicação desses e outros crimes que acontecem no universo virtual feminino, pois o patriarcado machista não nos exime sequer das violências fisicas/domésticas. O que se observa é que o estigma de inferioridade e subordinação social da mulher é gritante nesse tipo de violência, e tal crime configura difamação,  violência psicológica e injúria. O que se recebe como bônus é simplesmente a retirada do conteúdo do provedor, e uma pena (se tiver) de doação de cestas para o agressor, mas a dor da vítima permanece, o estrago na honra e na alma é irreparável  e a mente fraca...  ah! Essa  é  capaz de apagar o brilho do sol!

Estejamos atentas queridas leitoras, Mães,  adolescentes,  jovens mulheres ou qualquer gênero que possa sofrer esse tipo de violência, pois a vulnerabilidade do ciberespaço é algo extremamente perigoso.

Tenho um perfil no Facebook com mais de 4.000 seguidores, por ser escritora, às vezes aceito solicitações de perfis masculinos, com interesse em comum (literário), porém já sofri vários assédios provenientes de postagem de uma simples foto da minha imagem. Ou seja, não posso me dar ao luxo da prática da auto estima? Simplesmente porque sou mulher? Sei que pode existe crimes cibernéticos contra a figura masculina, mas os maiores índices de crimes praticados no ambiente on-line são contra nós mulheres, o que tem nos levado a uma grande  insegurança ao navegarmos no ambiente virtual, onde somos vítimas de uma misoginia desenfreada.

E falando de misoginia, eu já cheguei a uma conclusão que a  Vagina é o órgão mais poderoso desse universo. Sim!  Uma simples anatomia do corpo  é capaz de trazer desigualdades, revolta, insegurança,  agressividade e por aí vai... Como bem disse Simone de Beauvoir “Ninguém, na frente das mulheres,  é mais arrogante, agressivo e desdenhoso do que o homem inseguro da sua própria masculinidade.”

É  hora de darmos um basta nessa  violência sem limites que está interrompendo vidas. Vamos tirar da teoria a   sororidade, vamos nos dar as mãos,   unir forças e lutar para fazer valer a lei ‘Carolina  Dieckmann" e muitas outras que dormem nos arquivos dos tribunais. É hora de soltar a voz, seja através da poesia, música  ou qualquer meio de comunicação e/ ou movimentos coletivos.

O nosso blog “Feminário Conexões” é um dos grandes aliados nessa luta, pois tem sido um importante espaço virtual para deixar ecoar esse grito, uma espécie de  carinho no que se refere  às  causas femininas, onde, através da poesia,  crônicas  contos e outros textos, temos abordados assuntos que traçam rotas, estratégias e articulações em torno das questões que dizem respeito às nossas vivências e pautas enquanto mulheres.  

De acordo com o relatório da Febrasgo (Federação brasileira de ginecologia e obstetrícia, o número de suicídios femininos no Brasil cresceu de 45,7% entre 2009 e 2021 e muitos desses casos foram provenientes de crimes cibernéticos. E essa dor é nossa. Essa dor é minha, pois veste a minha pele e aperta minha alma,  e embora com um misto de insegurança e impotência, eu grito e não desisto. A poesia é minha arma,    pois como escreveu Gabriel Celaya  em “ Cantos Íberos”, “A poesia é uma arma carregada de futuro”. É através da poesia que ouço meus ecos e mato os meus demônios todos os dias. A dor do suicídio sangra nas minhas entranhas,  pois já andou rondando a minha vida... Eu considero-me uma mulher gigante, embora com 1,50m de altura e uma dismetria na perna direita, eu me apoio na “esquerda”  e sigo pisando as pedras no meio do meu caminho. É sem papas na língua que alcanço essa realidade que me inquieta. Eu solto o verbo no papel por todos, todas e todes que sofrem com esse caos e essa barbárie que caminha o nosso país nesse desgoverno misógino, racista e que tenta cercear a nossa liberdade de expressão.

O momento é de expungir essa sociedade de “machos" e fazer um apelo aos  que transitam no nosso espaço presencial e virtual: Expulsem de vocês essa insanidade do patriarcado machista, tornem-se homens elegantes e lembrem-se que pelo sacrifício divino viestes ao mundo através de uma mulher, portanto deixem-nos viver em paz. Deixo para alguém, que  em algum momento possa ter tido um pensamento suicida o Poema “Eco", de minha autoria:


ECO


Presa no porão escuro

das dúvidas atormentadas,

quando em desatino

desatei o nó em palavras

desfiz  o suicídio...

 

Na ponta do lápis

o socorro em tessitura

Agarrou o papel

 

Com as lágrimas do ontem

E o pó da agonia ,

Eu fiz meu café

ferver na poesia,

Exalando o socorro

dos dias pósteros

Em que transcorria

 

Não sei em qual tempo

(Talvez setembro...)

Amarelo

Tempo que não nego

Ao ouvir em meus versos

Quase em decesso


A voz

Numa  rima atrevida

Em eco:

Vida

Vida

Vida

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segunda-feira, 12 de setembro de 2022

LINGUAGEM DO BATOM VERMELHO, POR CAROLLINA COSTA

 



LINGUAGEM DO BATOM VERMELHO|13


SORORIDADE EM QUALQUER IDADE

Por Carollina Costa


Outro dia estava relendo anotações que fiz do livro Sejamos todos feministas, da nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. Nesse livro ela conta que na Nigéria, o mais alto ponto de realização social que uma mulher pode chegar é ter um marido. Há até mesmo uma espécie de ditado popular que diz que é melhor ter um mau marido do que marido nenhum, mesmo esse "mau" podendo significar muitas coisas.


Sou brasileira, mulher, escritora, professora, estudante de pós-graduação e quanto mais eu  busco entender o porquê de ainda existir esse tipo de validação social mesmo com as mulheres já se dedicando a outras partes de sua vida,  vejo também que esse tipo de valorização se replica. Não é só na Nigéria que se alimenta a ideia de que conquistar um marido é o suprassumo da vida de uma mulher. Também vejo isso no Brasil, porém, em alguns círculos, de modo mais velado.

Sou de uma geração de mulheres que se dizem feministas em alto e bom som, vão a passeatas, compartilham postagens na internet e até têm fotografias de pensadoras penduradas nas paredes do quarto ou da casa, mas na hora de pôr o discurso em prática tudo muda de figura. É fácil fazer correntes de Facebook, WhatsApp e Instagram apoiando aquela famosa X na causa Y, se solidarizar com a realidade da moça A, festejar o sucesso da moça B, mas não é tão simples fazer o mesmo quando essa moça é sua vizinha, sua parente, sua amiga ou colega de trabalho. Uma união que deveria ser do micro para o macro fica apenas no macro, apenas na realidade aparente, pintando figuras e afetos que não se sustentam além dos 15 segundos de um stories.

Já ouvi mulheres mais velhas comentarem dessa mesma falta de união entre suas colegas de geração, porém, ao menos no caso delas, é algo mais exposto. É dito na cara, ou melhor, logo se vira a cara. É doído e triste, mas ao menos é honesto. Antes fossem todas assim, diretas e honestas em qualquer idade.

Já ouvi que sou "muito focada no que eu faço" em tom de crítica e que estaria tudo bem faltar a uma reunião de amigos se eu fosse em um casamento, mas jamais por motivos de trabalho. Acontece que nenhum dos pouquíssimos e brevíssimos relacionamentos que já tive — e não gostaria de ter nenhum de volta — chega aos pés da paixão que tenho pelo que faço. Veja bem, não sou contra ter uma companhia, de preferência uma que seja boa, mas acredito que fazer disso o centro das realizações de uma mulher já não cabe mais. Talvez alguns séculos atrás, quando ainda éramos vistas como uma propriedade passada de pai para marido e de marido para filhos, mas hoje já temos uma meia dúzia de direitos que nos garante certa autonomia. O curioso é que, de todo peso e cobrança social existente, o que as mulheres podem exercer umas sobre as outras é o mais dolorido.

Celebrar as conquistas profissionais de uma mulher tanto quanto celebram as demonstrações de afeto deveria ser algo mais comum em nossa sociedade. Mais do que isso, deveriam celebrar nossa inteireza. Celebrar a mulher que decidiu ser dona de si mesma, que traçou seu próprio caminho, que escolheu não fazer de um alguém a razão da sua vida, mas partilhar a vida que já tem com outro alguém que valha a partilha.

Desejo que a sororidade saia da teoria para a prática e que as ideias de tantas pensadoras tome forma sólida em nossa sociedade e deixem de ser só palavras. Desejo que as mulheres possam celebrar cada vez mais a si mesmas e umas às outras. E, leitora, se ninguém ainda te disse isso hoje, saiba: eu celebro você!


@cbcarollina

Feminário Conexões, o blog que conecta você!

EDITAL ENLUARADAS II TOMO DAS BRUXAS

  Clique na imagem e acesse o Edital II Tomo-2024 CHAMADA PARA O EDITAL ENLUARADAS II TOMO DAS BRUXAS: CORPO & MEMÓRIA O Coletivo Enluar...