'A Chave Selvagem do Sonho', Anna Apolinário/05
Ao término da leitura de "A Chave Selvagem do Sonho", entendi qual foi a motivação do instigante título (ou, pelo menos, acho que entendi).
Todos os sonhos são puros e líricos, porque intrínseca e visceralmente nossos, e esse lirismo está presente em toda a escrita de Anna. Mas não só. Para a autora, apenas o lirismo não dá conta da complexidade em que nos constituímos, e eventualmente, nos consumimos (em fogo). Para acolher a diversidade de que somos feitos, Anna convoca os seres mais primitivos e naturais para habitarem sua poesia: como se, somente ao integrarmos o nosso lado animalesco e instintivo, é que pudéssemos acessar o mais íntimo em nós - e é exatamente nesse ponto que reside a chave (selvagem) dos nossos sonhos.
Não por acaso, seus poemas são repletos de criaturas ferozes: cães, serpentes, chacais, escorpiões. A autora convoca esses animais selvagens para ajudarem a dar conta da febre furiosa que nos invade a todos e, "queima a pele".
A pele, por sua vez, está bastante presente, tanto nas belas figuras que constam no livro, quanto nos poemas. A pele que queima é a mesma que cicatriza. A mesma pele que dói, também provoca imenso prazer. Nossa epiderme é o órgão das trocas, onde o mundo interno e o mundo externo se delimitam e se interconectam, ou seja, lócus do paradoxo por excelência, e Anna Apolinário se vale dessa simbologia com muita competência.
O espelho é outro elemento que aparece bastante em seus poemas. No caso da autora, seu espelho é a palavra, que, como ela mesma diz em seus versos: "transita e transborda, salta entre as páginas".
Sua palavra é feroz, lírica, incandescente, e por vezes, tudo isso ao mesmo tempo: o que constitui para o leitor um mosaico interessantíssimo de sensações, percepções e imagens.
Para ouvir o PODCAST dos poemas, clique AQUI.
Elã
Escrever.
Como quem
enlouquece
e possesso
procura Deus
dentro dos espelhos.
***
Insurreição
Um raio corrói o cerne da beleza
Fúria de quimeras calcina os céus.
Bosques suspensos,
sedução e o sussurro das feras.
Presságios do calígrafo.
O poema,
chacal ferocíssimo
farejando jugulares.
Como quem ressuscita,
subversiva,
sonha, escreve.
***
Enlevos
Teus dedos em secreta expedição
pelas minhas planícies incendiadas.
Os olhos sussurram em cobiça e tocaia
e as luzes todas deslizam ao redor de nossa dança.
Minhas ancas ondeiam em doce desvario,
as coxas envoltas em negras, sedosas,
perigosas redes arrastando-te
aos viscosos véus de minha carne acesa.
Teus lábios alvoroçado a selva de meus seios,
o corpo, em cálice e combustão,
oferecido à loucura suculenta de tua língua.
Uma serpente bailando ao sabor de meus açudes,
enquanto reviro-me escaldante,
um rio palpitante sob tuas papilas.
***
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Fiquei encantada! Bravísimo, Roberta! O podcast é outro encantamento!👏👏👏
ResponderExcluirSeguimos divulgando com muita alegria, essas mulheres talentosas 💃🏼💃🏼💃🏼💃🏼💃🏼💃🏼💃🏼
ExcluirParabéns! Por poetizar com tanto talento! Sucesosss
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