Por Paulo Rodrigues
“pois não sobre o solo se move,
mas sobre a cabeça dos homens ela anda”.
(Homero)
Pequeno tem origem na palavra
latina pittittus ou pittinus. Era usada para designar algo reduzido. Nada no
livro “Pequeno Ensaio Amoroso”, de Luiza Cantanhêde, busca a etimologia. São
mais de quarenta poemas distribuídos em quatro seções: Ferida, Geografia
Esquecida, Somente Boca e o Destino das Cicatrizes. Todas muito bem casadas,
reinventando o cordão umbilical da ausência.
A Editora Penalux caprichou na diagramação da obra,
que conta com uma tela de Joel DuMara como capa. Luis Henrique comenta na
orelha: “circula na areia da poesia de Luiza, uma geografia esquecida, que nos
faz lembrar o pulso da vida”. Tudo nos
versos desta poeta potente aumenta a pressão das sensações, no leitor.
O primeiro poema (Por Dentro, os Girassóis) demonstra
a capacidade que ela tem de tocar a pele da palavra:
Voo para dentro
e fecho as janelas.
Amanhã acenderei
o candeeiro.
Permanece
o silêncio que nada
pergunta e nunca
se espanta.
Colherei
todos os girassóis
que não se despediram
de mim.
As imagens conversam com a dor, na porta da casa. O
silêncio não se espanta com o acúmulo dos sacrifícios. Nem reconhece a luz do
intangível. Parece com ela e com todos nós. Uma das características da poética
de Luíza é este diálogo profundo com a humanidade. Parece que ela fundou sua
própria religião. Tem valores, gestos, certezas salvadoras.
Finaliza o texto como se quisesse tampar um vulcão:
“colherei/ todos os girassóis/ que não se despediram/ de mim”.
Eu disse na apresentação do “Pequeno Ensaio Amoroso”:
“a poeta explora agora um tema pouco trabalhado em “Palafitas” e “Amanhã, Serei
uma Flor Insana”, que é Eros”. Confirmo, pois com um aforismo dos romanos: verba volant, scripta manent.
Os muitos mitos do amor são refeitos pelas revelações
dos versos da Luiza.
Parece uma tradução poética do diálogo o “Banquete”,
de Platão. Faltam os personagens do simpósio, mas não faltam as indefinições
das mãos que se foram. As sombras no sonho das manhãs. As corredeiras na
reflexão. As perguntas no vácuo. O amor está bastante acima da ascese de
Diotima de Mantinéia como podemos comprovar em Via Láctea:
O que
se perpetuou
primeiro?
Tuas asas saltando
abismos ou o instante
que aprendi a voar?
Dize-me: em que céu
fizeste teu exílio?
Estou indo com as mãos
carregadas de estrelas.
São páginas que fazem o tempo valer tanto quanto as dores do barranco. Luiza Cantanhêde apresenta o exílio do ser amoroso. Indaga-se. Não se contém. Volta como um Orfeu “com as mãos carregadas de estrelas”. São muitas ‘plantações de horizontes’, na escrita agressiva, que ela sustenta e amadurece.
Enfim, a ‘geografia esquecida’ ajuda desenvolver o tema. No entanto, não sintetiza o distanciamento da ferida. Há um exercício de tocar o machucado, na poesia da Luiza Cantanhêde.
Fico imensamente feliz em ser publicada neste excelente espaço, com esta bela (re)leitura de Paulo Rodrigues! Muito obrigada Marta Cortezao! Tá belíssimo!
ResponderExcluirFico emocionada con suas palavras. Que nosso "Feminário Conexões" cresça forte e ganhe o mundo. Um fraterno abraço e muito obrigada, queridos amigos.
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