Eu
queria ter o talento da escritora campinense Nilza Azzi para descrever o que lê
de uma forma a pintar tão bem as cenas quanto ela o faz.
Hoje
eu reli “É Tudo Ficção” (Editora TAUP – Toma Aí Um Poema - 2022)
da Flávia Ferrari. E quem é Flávia Ferrari?
A
pergunta faz sentido porque uma busca no Google vai resultar numa blogueira que
ensina as pessoas a viverem como se o planeta não existisse antes dessas tais
dicas que ela dá. Bom para ela. Péssimo para quem vive exausto dessas
futilidades.
Mas a Flávia Ferrari a quem me refiro é uma
poeta que já era poeta antes de ver a si mesma como tal, ou seja, poeta.
Ah! E
é professora, de verdade, influenciando de forma muito positiva o que a gente
chama de nova geração.
Bom
para essa nova geração ter uma influência tão necessária!
Estreou, por assim dizer, nesse momento pandêmico agudo com o livro Meio-Fio: Poemas de Passagem, Editora TAUP, 2021. Participou de Coletâneas, essa trilha que muita gente percorre, antes de brindar os bons leitores com um trabalho mais pessoal e espontâneo e eu, assíduo nessas redes antissociais, acabei por ter o privilégio de me deparar com suas participações generosas nas “lives” cujas participações são restritas a mulheres que escrevem e pleiteiam pela justa equidade, não só no Mercado Editorial, mas, também, na vida. E vejo a Flávia, principalmente, em vídeos onde ela lê outros poetas sempre com um sorriso de luz e o brilho no olhar que mostra uma alegria sincera, uma dorzinha contida, uma vontade de dizer o quanto o texto lido lhe tocou e não é que diz, mesmo? Ela, também, é publicada em Revistas digitais, mas vamos ao É Tudo Ficção?
Antes eu quero frisar que não sou analítico como os resenhistas e críticos textuais. Se fosse estaria muito ferrado porque só leio o que quero ler e entendo o que quero entender, sendo, assim, independente e livre para depor e não julgar o íntimo do escritor, que, por ser escritor, não é ser humano usual.
Esse segundo livro da Flávia Ferrari a expõe, como disse outro dia a Jalna Gordiano numa live da Banzeiro Conexões sobre essa característica nas escritoras viscerais. Ele, o livro, a desnuda como ser humano que tem a sorte infinita de saber descrever isso juntando palavras e isso requer uma coragem tão necessária nesse mundo hipócrita!
“É Tudo Ficção” foi dividido em oito partes. Parece uma carta (se eu fosse fodástico teria escrito “Epístola” para ficar mais fofo) e pode nem ter sido conscientemente, contudo é uma carta de amor.
“Se tivesse mais tempo
Viveria as ilusões
De quem atribui ao tempo
Os impedimentos” (Kairós)
“Se pudesse mesmo criar algo
extraordinário
As plantas teriam voz” (O estado das coisas)
Reparem como esses dois trechinhos poderiam fazer um leitor atento parar para meditar na estultice humana de se acorrentar ao tempo e fingir que ele existe de tal forma a restringir a existência de quem nele acredita?
E se as
plantas falassem? Ah! Sim, elas falam, mas e se a gente as entendesse ou se
elas tivessem voz? A Flávia vem com essas ideias doidas de poeta pra cima da
gente e agora eu, que ando ressentido com meu pé de maracujá, gostaria muito
que ele me desse algumas explicações verbais.
Em “Partir” ela me chama a atenção para o
fato de ser ambidestra em quase todos os textos, mas só nesse foi que percebi e
acabei relendo todos os poemas mais uma vez. Vejam:
“Eu queria acabar com esta sensação
De que sempre há algo
esquecido
Seja palavra ou coisa ou gesto
Esta falta insistente que não
tem letra
Eu queria”
Eu não planejei citar fragmentos de textos, mas como não fazê-lo se esses fragmentos me fazem um bem danado de dar um tempo a mim mesmo e ficar pensando os pensamentos da Flávia que vão inundando o meu pensar de leitor que pensava que era doido sozinho?
“Todos esses poemas que
escrevemos
Não dizem nada de relevante
Meu plano é jogar fora tudo o
que você já escreveu
Se penso ser capaz de fazer
isso
Certeza que você já pensou em
fazer pior
E passo a noite acordada
pensando o que seria”
Agora que me liguei estar dando “spoilers” nessas
citações, mas e daí? Aqui vai mais um:
o amor tem a consistência de
um guarda-chuva
em algum momento será
insuficiente
e quando estiver toda nua
sem as minhas roupas ensopadas
estarei sozinha (Tempo)
Onde é que essa escritora estava engavetada nesse tempo todo? O que ela escreve desce macio na garganta do cérebro e se espalha pelos capilares dando aquela ondinha gostosa de sentir...
Eu
pensei em falar sobre a parte em que ela chamou de “Diário” e dividiu em quatro partes/poemas, mas é tão íntimo e tão
bonito que eu prefiro não tirar esse gostinho dos próximos leitores.
“É Tudo Ficção” descerra essa fricção
gostosa de corpos, de pensamentos, de acasos e descasos, das ternuras que foram
interrompidas... Essa fricção entre existência e vida e que você, se for raso,
pode chamar de redundância, mas experimenta ler esse livro e ao final pergunte
a si mesmo, entre aquela tentativa de respirar devagar após o gozo, se foi bom
para você, também.
Eu
gostei.
O
Projeto Gráfico? É um luxo a mais nesse livro fascinante.
Flavia Ferrari. Poeta e professora da rede pública de São Paulo. Lançou, em novembro/2021, o seu primeiro livro de poemas, intitulado “Meio-Fio: Poemas de Passagem”. A obra foi editada pelo Toma Aí Um Poema. Flavia Ferrari escreve desde a adolescência, mas começou a publicar seus poemas no início da pandemia, compartilhando seu trabalho nas redes sociais, participando de antologias e contribuindo com diversas revistas literárias digitais. Desde o princípio, os seus poemas foram muito bem recebidos pelos leitores e pelos periódicos digitais
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Ah, sua análise é visceral, Ronaldo! Isso nos aproximar ainda mais de Flávia Ferrari, poeta que aprendemos a admirar!
ResponderExcluirLinda apresentação Ronaldo! Ela não aparece no Google sabe porque?? porque ela está brilhando no cantinho quente dos nossos corações! Flavinha é encantadora! ❤👏🏻👏🏻😍
ResponderExcluirParabéns Flávia e Ronaldo ! Que apresentação magnífica , que texto maravilhoso! Encantada com sua poesia Flávia, já sou fã ! Bravo!!!
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