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quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

PROCESSOS DE ESCRITA: ASAS DO INAUDÍVEL EM LUZES DE VAGA-LUME, POR ELIZABETE NASCIMENTO

 



O PROCESSO CRIATIVO DE ASAS DO INAUDÍVEL EM LUZES DE VAGA-LUME 

 POR MARIA ELIZABETE NASCIMENTO DE OLIVEIRA


Bem disse a enluaradíssima Marta Cortezão (2023) ao nos provocar à escrita do processo de criação poética, é uma proposta simples, mas profunda e instigante. Sim! Profunda e instigante porque provoca a revirar o baú da memória e, esse baú, é composto de singularidades recheadas de sinestesia e profundidades. Gosto de pensar que as águas que percorrem as páginas do meu primeiro livro de poemas escorrem pelo meu corpo desde sempre porque trata-se de memórias que foram incorporadas em mim e residiram/residem no meu imaginário.

Desde a infância, embora de família pobre, sempre estive rodeada de livros escritos em diferentes gêneros discursivos, fator que contribuiu satisfatoriamente na minha trajetória porque amo estar entre a multidão contida nos livros; mas que podem ir aos passeios mais badalados pelas asas incontroláveis da imaginação criadora. Filha de um baiano que, mesmo semianalfabeto, adorava contar histórias de cordéis e de uma japonesa que, embora tenha feito apenas os anos iniciais, gostava de ler as revistas de fotonovelas, me vi desde muito cedo envolta em meio às personagens de ficção.

Fui uma criança um pouco solitária, mas feliz porque tive a oportunidade de correr no campo, subir em árvores, buscar laranja no pomar, tomar banho de cachoeira, brincar de amarelinha, chupar mangas, amoras e seriguelas no pé, jogar queimada, enfim, de vivenciar a infância com o que ela tem de banquete para ser degustado. Amava brincar com as cigarras e entre os vaga-lumes, pois morei por muito tempo na zona rural. Sou a filha mais nova de três, com diferença de nove anos de idade da minha irmã e dez anos do meu irmão; minha irmã se casou com dezesseis anos e meu irmão saiu de casa para trabalhar, ainda muito novo. Esse fator me aproximou ainda mais dos livros, pois era uma forma de me ver acompanhada. Quando adolescente, tive a oportunidade de ler muito romance, como: Sabrina e Julia. A solidão nos ajuda a observar com maior amorosidade a natureza e as belezas contidas no cosmo. Por muitas vezes, vi inúmeras constelações nas flores de um pé de flamboyant que havia no quintal da casa, lembro-me como se fosse hoje do banco de madeira e da rede de balanço, também, vermelha pendurada naquela árvore.

Os fragmentos da minha vida são importantes para fundamentar a afirmativa que o esboço de grande parte dos poemas que compõem a obra já estava guardado há algum tempo no meu imaginário, mas tomou formato escrito apenas no ano de 2015, após a aprovação no curso de doutoramento em estudos literários, em Tangará da Serra. A construção de uma casa se assemelha à produção de um livro, pois desde o alicerce ao acabamento final é preciso dispensar atenção e cuidado. Embora, às vezes, tenhamos a sensação de que tudo tenha surgido repentinamente, quando paramos para refletir o processo, percebemos que os tijolos foram construídos em nós desde sempre. Com isto, ressalto que quando me perguntam sobre o processo criativo, digo: aconteceu naturalmente! Porém, quando paro para uma ponderação mais profunda, vejo que sim e não, é um processo natural; mas resultado de uma maturação realizada dentro de mim, desde sempre.

O processo criativo de uma obra poética, na minha percepção torpe, nasce no corpo feito hera, rumina em nós até tomar proporções insustentáveis porque afeta nossos desejos e segredos recônditos, nos convocam a andarilhar pelo nosso mundo, também, na companhia de nossos avessos, ou seja, acionam o nosso lado dúbio, interno e externo. Não penso que se trata apenas de um desenvolvimento da mente e/ou da imaginação, mas, sobretudo, de um envolvimento, de uma constituição ímpar do ser no mundo. Eu cato aqui e acolá os badulaques que me constituem e, de certo modo, me construo com essas engrenagens. São elas que movimentam o meu mundo e, por isso, que tudo que sou, não pode ser igual, é singular; aciona uma essência que é só minha, que só pode correr, desse jeito, no meu corpo; mas pelas nuances do meu ser dialoga com o outro porque também sou constituída pelos outros e/outras coisas que partilham comigo do mundo.

Os textos nunca estão bons a ponto de serem publicados, mas se trata de uma análise que aos poucos cai por terra, porque a escrita, também, passa por um processo de amadurecimento, necessita brotar em algum momento, para se inaugurar. Quando falo em poesia, proponho de um jeito simples todo meu dialogar com o mundo e com as pessoas, de modo a formar uma constelação de vozes que reverberam em nós e quem sabe anunciam outra sociedade. Acho lindíssimas as diferentes formas com as quais as mesmas palavras cantam/escorrem em cada corpo.

Observei que a maioria das pessoas que adentra aos cursos de pós-graduação nas universidades fica muito solitária e tende a ter problemas emocionais devido à profunda carga de leitura teórica e produção de textos científicos. Assim, pensei que necessitava criar uma válvula de escape porque a maior promessa é direcionar a minha vida por um campo onde eu possa viver com responsabilidade e comprometimento todas as minhas dores e alegrias; pensando nisso criei um grupo de WhatsApp com algumas amigas, denominado Clube do Café e, posteriormente criamos o Facebook Aromas de Mulher com esse nome para nos encontrarmos, o objetivo era sair do espaço da academia para compartilhar outras coisas que fazem parte do cotidiano da mulher. Estes grupos ainda estão em vigor e contribuem significativamente para tornar a minha vida um pouco mais leve. Para além desses canais, destaco ainda que mantenho a página no Facebook Asas do Inaudível, criada por um leitor/amigo, onde publico outras produções autorais e recebo alguns feedbacks de leitores(as).

A cidade onde moro, Cáceres/Mato Grosso, fica a aproximadamente 220 km de distância de Tangará da serra, também no MT, onde faria o doutoramento e na época grande parte da estrada não era pavimentada. Então, praticamente uma vez por mês, ficava uma semana em Tangará da Serra e, como as disciplinas do curso eram ministradas durante o dia, à noite aproveitava para ler textos poéticos e escrever com liberdade. A arte sempre esteve muito presente nas minhas ações, pois ela é quem me ajuda a observar as flores existentes no caminho, assim após a defesa da tese de doutoramento organizei na minha cidade um evento com a presença da poeta Luciene Carvalho. Nesse encontro, ela teve acessos a alguns dos meus rabiscos e me incentivou à publicação, minha primeira reação foi categórica, disse não; mas numa bela manhã de segunda-feira, recebi um telefonema da autora dizendo que o prefácio do livro estava pronto e começou a lê-lo. Minha reação foi chorar compulsivamente porque era um olhar repleto de sensibilidade e de carinho que não tinha como não ser encorajada à publicação. Encaminhei o esboço para a editora Carlini e Caniato, que fica localizada na capital do nosso estado – Mato Grosso - e essa se encarregou pela produção da capa e revisão geral. Assim, surgiu à obra impressa.

O livro impresso ficou pronto no início do período pandêmico – a terrível onda do vírus COVID-19  tirando a oportunidade do lançamento presencial. Confesso! Fiquei bastante triste, pois estava eufórica para partilhar com minhas amigas esse momento de alegria; mas logo pensei em uma alternativa, lancei o livro em formato on-line pelo canal Asas do inaudível em luzes de vaga-lume no youtube, creio que se trata do primeiro livro, em nosso estado, lançado virtualmente, ainda na aprendência para vencer a timidez em aparecer na tela do computador; mas foi uma experiência enriquecedora, para não dizer engraçada, inovadora e, dado o momento, necessária. Segue abaixo, dois poemas que compõem o livro:

O silêncio


Silêncio nunca é ausência.

É plenitude, criação fetal.

Às vezes, meigo,

embala o sono,

perfuma o sonho.

Outras, selvagem,

chega galopante,

tortura a mente,

espreme o cérebro,

arrasta-nos

do/para

o cativeiro,

companheiro de redenção.

 

******

 

Manifesto


Onde estão as mulheres escritas

pela goiana Cora Coralina,

pela mineira Conceição Evaristo,

pela ucraniana-brasileira Clarice Lispector

e tantas outras que

escrevem e escreveram

com o sangue que jorrou de si?

Apagadas,

invisíveis,

sem valor...

Gritos sufocados no universo de papel,

mulher-esposa,

mulher-amante,

mulher-mãe,

mulher-sonhadora,

mulher-profissional,

mulher-sedutora,

mulher-mulheres.

Vivendo todas em uma.

Este ser múltiplo, original.

Avante! Abra as portas e as janelas,

respire o ar que, também, sai de suas entranhas.

Únicas,

desiguais.

Hoje, ao olhar o livro Asas do inaudível em luzes de vaga-lume (2019), com a identidade de pesquisadora em estudos literários, analiso que muitas questões poderiam ser repensadas se consideradas as convenções linguísticas e/ou a formatação estrutural dos textos. Mas, com o olho adoecido de poeta, sinto que não. Era exatamente assim que este livro saiu de dentro de mim e, com um vocabulário tão restrito, mas tão meu, ganhou asas com palavras que se metamorfosearam em poemas. Já com a visão heterogênea de professora, creio serem pássaros que voam livres à procura de porto e/ou de leitores sensíveis, capazes de olhar pela janela ao encontro dos mistérios do mundo. Como mulher, desejo que cada leitora sinta-se instigada a criar outros pássaros que se juntam em revoada ao meu e, com asas em movimento, redesenham na imensidão desse céu azul, a luz e a harmonia do voo coletivo, sempre a vislumbrar um horizonte possível. Atitude que poderá livrá-la das diversas formas de exílio existentes na alma feminina.

 


NASCIMENTO, Elizabete. Asas do inaudível em luzes de vaga-lume. Cuiabá: Carlini e Caniato editorial, 2019.

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Doutora em Estudos Literários, poeta, professora e mulher que sonha com equidade. Livros: Educação Ambiental e Manoel de Barros: diálogos poéticos. São Paulo: Paulinas (2012); Asas do inaudível em luzes de vaga-lume. Cuiabá/MT: Carlini & Caniato (2019), Sinfonia de Letras: acordes literários com Dunga Rodrigues. Paraná: Appris/2021. Professora, DRE-Cáceres/Mato Grosso-Brasil.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

ENLUARADAS: A POÉTICA DO ABRAÇO, POR ELIZABETE NASCIMENTO



COLETÂNEA POÉTICA: ENLUARADAS II (2021): UMA CIRANDA DE DEUSAS

SÓ PARA DIZER QUE “AGORA SOMOS NÓS QUE VAMOS DIZER O QUE [não] SOMOS”[1].

  

Por Elizabete Nascimento

 

Agrego ao título a afirmação de Lygia Fagundes Telles, por traduzir uma das essências que emana da coletânea de poesia de autoria feminina Enluaradas II: uma ciranda de deusas (2021)[2], com eus poemáticos que reafirmam a infinita tarefa de poetizar o mundo e não compactuam com o poder arbitrário que aprisiona a fala de todas em detrimento de uma. A obra é subdividida em quatro oráculos sagrados regidos pelas deusas da mitologia grega, conforme destaca Marta Cortezão (2021, p. 09):


O primeiro homenageia a deusa Gaia, a Mãe Terra que nos nutre e que nos revela a importância de recuperar nossa sacralidade e nos conectar com nosso espírito primitivo; o segundo, a Deusa Selene, La Bella Luna, a que comanda os mistérios de nossa natureza cíclica e do Sagrado que nos habita; o terceiro, a Deusa Lilith, a que controla os ventos e as tempestades, lutando pelos seus direitos, negando subserviência ao patriarcado; e o quarto e último oráculo que celebra a Deusa Afrodite, a que vem nos revelar a sacralidade do amor, alimentando-nos a força da luta coletiva pela sororidade, pelo amor que faz morada no colo do numen primitivo. 

Da estrutura supramencionada, mitológica e envolvente, pescamos quatro poemas para brincar com o tecido poético da criação de autoria feminina que compõe a coletânea, esse mar de águas inundado por sentimentos. A pescaria teve como critério trazer para o palco a percepção de que as palavras voam livres, entram por dentro do corpo e levantam em forma de poema para ressignificar a figura feminina no mundo contemporâneo. Por escolha trazemos os poemas na íntegra, a fim de que o leitor constate ou não as percepções descritas, até porque o objetivo aqui não é trazer o significado do poema, muito pelo contrário, é dizer que o poema tem mil faces e sugerir que você, caro leitor, encontre a sua e descubra como as palavras desses eus poemáticos falam em nós e nos afetam os sentidos. Eis os poemas:                                     

RESSIGNIFICÂNCIAS

                

Ale Heindenreich (p. 24)

 

Me reencontro nas palavras

Como o rio que corre seu curso.

Deparo-me com a cachoeira de

Águas mansas. Ora torrentes.

Escorrem no papel linha por linha

Verso por verso.

 

Permeiam as folhas do meu

Caderno vermelho.

Respingam em palavras formando

Choro, riso ou receio.

 

Caem como gotas de

Chuva desprentensiosa.

Tornam-se poças tímidas que

De mãos dadas se movem até

O córrego manso,

E de lá outra vez serei

Rio de águas renovadas.


O poema Ressignificâncias apresenta o poder libertador das palavras e como, por meio delas, o eu poemático descreve seu percurso: “Me reencontro nas palavras/Como o rio que corre seu curso”. Como algo que ultrapassa os obstáculos, vence as barreiras do tempo. Nota-se ainda, que as palavras simbolizam as águas e, estas por sua vez constituem o rio, rio que transforma-se no eu poemático, como um ciclo onde o ser humano e a natureza se entrelaçam numa rede constituinte de identidade: “E de lá outra vez serei/Rio de águas renovadas”. Há uma boniteza de imagem poética que se levanta do poema e clama por sentires múltiplo e que, portanto, não podem estar aprisionados em interpretações e/ou conceitos previamente definidos.


A PALAVRA QUE ME FALTA


Dani Espíndola (p. 71)

 

Onde se esconde

A palavra que procuro

A que me estancará as feridas

Me guiará no escuro

Que é viver só de vontades

De inventar realidades

Onde estará a palavra

Que me falta

Para terminar o poema

A palavra que condena

E liberta

Impunemente

Onde se esconde

A palavra

Que me desmente.


Ainda no seguir a tessitura da rede iniciada pelo poema Heindenreich, A palavra que me falta – de Dani Espíndola, metaforicamente também apresenta a incompletude da palavra e do ser, ambos em via de fazer-se: “Onde se esconde/A palavra que procuro/A que me estancará as feridas”. Por mais que a procura seja incessante, sempre haverá uma lacuna para ser preenchida. Essa artimanha do signo verbal lembra-me Carlos Drumonnd de Andrade: “Trouxeste a chave?”. Espíndola apresenta um eu poemático consciente de suas limitações e vontades, à procura da palavra definitiva, que contraria o eu poemático e que, ao mesmo tempo, possa completá-lo: “onde estará a palavra/Que me falta/Para terminar o poema/A palavra que condena/E liberta/Impunemente./Onde se esconde/A palavra/Que me desmente.”

Ao considerar o exposto, o eu poemático de Espíndola enche-se de questionamentos a respeito da completude da palavra como se sabedor de que “um escritor pode amontoar frases e mais frases, adjetivos e mais adjetivos, para capturar a essência esquiva de alguma coisa. Mas, quanto mais usa a linguagem para descrever um personagem ou situação, mais tende a soterrá-lo sob uma montanha de generalidades” (EAGLETON, 2019, p. 63)[3]. Nesse sentido, ainda de acordo com o autor, na e pela palavra, podemos fazer sangrar tudo que existente aprisionado em nós e, é por esse motivo que a poesia: “não trata apenas do sentido da experiência, mas também da experiência do sentido” (EAGLETON, 2019, p. 196).


CHÃO ANCESTRAL


Margarida Montejano (p. 148)

 

Às vezes, mora em mim uma loba

 que uiva como louca quando sente que o perigo ronda.

Defende a cria, sobe as paredes e as unhas afia.

Mora em mim, às vezes,

uma ovelha desgarrada de olhos mansos

que tece, nas rugas do tempo  e nos fios de lã,

 o cachecol do dia que aquece nossas noites insanas.

 

Às vezes, mora em mim

uma bem-te-vi que vive a cantar a esperança.

Que não desiste. Insiste no voo que aquece o ninho.

Enfim, mora às vezes em mim uma louca,

que grita insana nas noites insones, que existir é muito mais que viver.

Que eu posso ser amarga, azeda,

macia, árida e áspera, sem deixar de ser doce.

 

Que eu possa ser lua, estrela, constelação.

Deusa, musa, menina, princesa e bailarina.

Posso ser meretriz, caipira, doutora do lar, poeta e atriz...

Habita dentro de mim um ser inconcluso,

Confuso, difuso, mas tomado de essência divina

Sábia, intuitiva, santa e humana inconformada!

Mora em mim um anjo sagrado e profano,

Uma boneca de pano que às vezes me chama e me diz

 - você é o que você quiser!

Sorrio de mim, requebro e sigo, agora na versão mulher.

 

Chão ancestral, de Margarida Montejano, exibe o movimento das diversas identidades da figura feminina que busca na complexidade das relações viver com intensidade seus paradoxos: “Habita dentro de mim um ser inconcluso,/Confuso, difuso, mas tomado de essência divina/Sábia, intuitiva, santa e humana inconformada!”. Um eu poemático consciente da potencialidade da alma humana que caminha por múltiplas direções: “Que eu possa ser lua, estrela, constelação./Deusa, musa, menina, princesa e bailarina”. Ou seja, capaz de ultrapassar as linhas da objetividade e peregrinar pelo campo da ficção. Nesse sentido, é interessante atentar para o fecho do poema: “Sorrio de mim, requebro e sigo, agora na versão mulher”, como o ser livre e múltiplo estivesse apenas na palavra porque o ser mulher, nessa sociedade, exige o cumprimento de regras, de imposições que limita seus fazeres.  

Ao dizer o que queria no poema, o eu poemático afasta-se do texto, segue a vida real, na versão mulher. Nesse sentido, convoca-nos à necessidade de olhar para o texto, deixar-se ser provocado por ele, pois: “A linguagem em poesia é uma realidade em si mesma, e não um mero veículo pra algo diferente dela. A experiência que importa é a experiência do poema. As ideias e os sentimentos pertinentes são aqueles que estão ligados às próprias palavras, e não a algo dissociável delas” (EAGLETON, 2019, p. 142).

A batalha da produção de autoria feminina é ser (re)conhecida em suas diversas facetas e qualidade de sua produção, embora já tenha algumas conquistas é preciso seguir em frente, pois segundo Octávio Paz (1954): “A liberdade do escritor não é algo abstrato, mas algo que se conquista dia a dia. Em sua obra, em seu trabalho, melhor dizendo, de revelação do homem, o escritor deve lutar contra todo tipo de limitações e imposições. Alguns pessoais e outros externos”[4]. Ainda recorrendo a Paz, vale destacar que a essencialidade literária consiste em descobrir e revelar parte do ser humano, no que ele tem de mais específico, além disso, o autor destaca que técnicas adotadas por um ou outro autor(a) podem até influenciar o caráter das produções, mas não alteram o seu valor.


SINA


 Vania Clares  (p. 199)

 

de muitas herdei pudores

e desígnios acumulados,

as células carregam dores

por caminhos atribulados.

Custei a entender essa trama

Tecida através dos séculos,

Vista por muitos como drama,

Os iguais assumidos vínculos.

Revivo a história dia a dia

Nos olhos de outras mulheres

E reconheço em todas a ousadia

De fazer valer os seus saberes.

Condensamos a força deferida,

a que rasga imperiosa o ventre,

Lembramos sem medo a ferida,

Afrontando o risco de estar entre

Aqueles que nos desconhecem.

E porque somos amor e doação

Damo-nos as mãos em sintonia,

Colhendo na luta a inspiração,

Prevalecendo o milagre da poesia.

E porque entendi como privilégio,

Exulto em canto a sina em sagração,

Em mim encontrarás eterno refúgio,

Em nós o cerne da vida em ebulição.

 

Observem que o último verso do poema Chão ancestral dialoga com Sina, de Vânia Clares que, com seu jeito peculiar, poetiza o percurso da figura feminina no decorrer da história, bem como, destaca a ancestralidade, com alguns episódios que se repetem e fazem eco no mundo contemporâneo. Invoca ao poder do trabalho coletivo para “pular o cerco”: “E porque somos amor e doação/Damo-nos as mãos em sintonia,/Colhendo na luta a inspiração,/Prevalecendo o milagre da poesia.” No poema Sina percebe-se o tom metafórico para que a mulher vá à luta, aprenda as lições deixadas por seus antepassados, toque na ferida como bandeira de redenção e, dessa forma, passa a incomodar àqueles que desconhecem a legítima voz de quem aprende com a própria história. Nos dois últimos versos há a profunda e necessária relação entre o eu e o nós como constituintes do processo de criação poética: “Em mim encontrarás eterno refúgio,/Em nós o cerne da vida em ebulição”. Uma mulher que reconhece o limite de sua individualidade e ao se reconhecer compreende-se também como um ser híbrido e, portanto, em contínuo processo de aprendizagens com as outras: “E porque somos amor e doação/Damo-nos as mãos em sintonia,/Colhendo na luta a inspiração,/Prevalecendo o milagre da poesia”. Terry Eagleton (2019) diria que o eu-poemático, na produção dessas mulheres, “surge como metáfora da natureza e povoada de fantasias da vida humana real” porque quem carrega os sonhos somos nós, humanos.

A busca incessante por liberdade percorre os poemas, de modo que metaforicamente a figura feminina concebe a escrita/palavra, como personificação de si mesma, pois:

Sua memória corre fluída no texto, embaralhada nos tempos vividos que se fundem na emoção do recordar/viver. Saberes e sabores dos mais diversos se fundem em sua escrita seivosa. Escrita sinuosa de contador-de-histórias que vê a aventura humana enredada em seus mil caminhos e veredas que se cruzam, entrelaçam e se separam. Nenhuma vida existe por si só, mas enovelada, determinada, abortada ou frutificada por outras vidas que a ela estão presas por invisíveis e irredutíveis fios. (COELHO, 1993, p. 320).

São vidas filtradas pelos sentimentos e pelos conflitos de quem, até pouco tempo, eram negados o direito à voz/escrita. Octávio Paz legitima essa proposição ao destacar que “O poema é um objeto único, permeado por uma técnica específica de cada poeta, a qual possui um estilo específico, marcado tanto pelo individualismo de seu criador quanto pela sua época, estilo literário de seu tempo e vivências sociais e históricas”[5].

Nesse ínterim, retorno ao título dessa abordagem: “agora somos nós quem vamos dizer o que somos”, trata-se de um chamamento à leitura da produção de autoria feminina, porém, sabedora de que muito pouco ainda está sendo e será dito, sempre com a palavra em falta nesse chão ancestral escrito pela diversidade que solicita coragem no mar de ressignificâncias que engendra a epifania do ser e/ou a imprescindível mudança dessa sina da mulher. Ressalto que: “a melhor maneira de ver uma obra literária não é como um texto com sentido fixo, mas como matriz capaz de gerar todo um leque de significados possíveis. Mais do que conter significados, a obra o produz” (EAGLETON, 2019, p. 149).

Finalizo, por ora, destacando que os poemas selecionados foram produzidos em primeira pessoa, por mulheres, talvez para que observem a transfiguração engendrada pela memória e pela arte como um apelo para que olhem de novo, de outro jeito a produção de autoria feminina, com corpos e almas que nos contrários se edificam, linguagens cingidas na experiência e nos sonhos rotineiros que, em sua maioria, recusam a linguagem burilada, às sintaxes consagradas e se levantam no jeito particular e, ao mesmo tempo, coletivo desmanchados na/pela escrita que eleva imagens e sensações plurais.

 


[1] TELLES, Lygia Fagundes. Ciranda de Pedra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996.  “Sempre fomos o que os homens disseram que nós éramos. Agora somos nós que vamos dizer o que somos”.

[2] CORTEZÃO, M.; CACAU, P.; Coletânea Enluaradas II: uma ciranda de deusas. São Paulo: Saravasti, 2021.

[3] EAGLETON, Terry. Como ler literatura. Porto Alegre: L&M, 2019.

[4] PAZ, Octavio. Fragmentos de uma entrevista à Rosa Castro, México/La Cultura, 1954.

[5] https://homoliteratus.com/poesia-e-poema-sao-sinonimos-nao-para-octavio-paz/




segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

O ABISMO SUBLIME DAS ENLUARADAS: A POÉTICA DO ABRAÇO, POR ELIZABETE NASCIMENTO

 



O ABISMO SUBLIME DAS ENLUARADAS: A POÉTICA DO ABRAÇO


 Por Elizabete Nascimento


A trajetória de vida de cada autora desta coletânea nos interessa, nos faz crescer, nos fortalece, porque toda voz que paramos a escutar se mistura a tantas outras e nos faz mergulhar, de forma particular e especial, no profundo rio da Consciência Feminina, numa conexão que vai além do humano, alcança esferas divinas outras, nos abraça, nos comove e nos enche de inspiração e paixão pela vida.

              {Marta Cortezão}

 

Pretendo apenas esboçar um desenho do movimento literário das Enluaradas, uma colcha de retalhos/mosaico, figuração das faces desdobráveis da figura feminina contida na obra Coletânea Enluaradas II: uma ciranda de deusas (2021), conduzida pela observação de que as letras podem alçar voos, regar os jardins das humanidades e, quem sabe impulsionar a escrita da mulher, de modo a plantar utopias e destilar sonhos. A coletânea conta com a participação de mulheres que residem em diversos países, como destacado no prefácio da obra, trata-se de: “[...] um movimento histórico de resistência feminina que surge das/nas margens do cânone, cuja prioridade é contribuir para a consolidação da mulher no espaço literário, divulgando a literaturas de autoras da contemporaneidade”. (CORTEZÃO, 2021, p. 08-09).

Para baixar, clique AQUI

A seguinte frase de um vídeo no facebook, dita por um homem, instigou-me à reflexão: “temos que ler mulheres porque são boas, tem qualidade, não porque são mulheres”, não pretendo discordar, muito pelo contrário, almejo, quem sabe, apenas levantar alguns questionamentos para que possamos refletir sobre o lugar/espaço da mulher na cena contemporânea: quais são os sentidos de “boas e/ou de qualidade” adotados pelo olhar convencional? Como nós olhamos/sentimos a produção de autoria feminina? Como se deu o percurso histórico/literário da mulher na trajetória da produção escrita, especialmente no âmbito da literatura. E, ao considerar, essas proposições ainda questiono: como podemos, se é que é possível, conceituar “boas” e ou “de qualidade”, sem antes realizar uma leitura criteriosa da produção?, e acrescemos ainda, “por que esconde seu bigode/na lâmina afiada dos julgamentos?” (B. Raquel, 2021, p. 175), se “sei apenas que, de tempos em tempos, me faço rosa/e nutro meus sonhos, de amor ou de vento”. (MARQUEZI, 2021, p. 184) e que “cada portal que se abre a outras dá passagem!” (PINHEIRO, 2021, p. 185).

Os questionamentos supramencionados vêm ao encontro das abordagens das mulheres que participaram do Primeiro Festival Literário de lançamento da Coletânea Enluaradas II/FLENLUA-2021, mulheres que enfatizam o poder inenarrável da poesia e ressaltaram que a mesma as salvaram de momentos de medo, de angústia, de desespero, de alegria, de saudade e de si mesmas porque permite sonhar, caminhar por outros espaços e fazerem-se livres das amarras patriarcalistas.

Pensar a produção de autoria feminina a partir da coletânea consiste em descobrir os sentidos provenientes da arte de enlaçar sorrisos, versos e prosas, a partir da essência de mulheres que versam sobre suas (re)existências e, o melhor, mulheres que contam com a generosidade de umas com as outras, no sentido de serem autoras e leitoras, num círculo que aprofunda/tece, cada vez mais, a efetiva rede da sororidade.

Em As enluaradas, a poesia desprende da pele feminina e a questiona, alfineta e provoca-a a romper com o medo e com a insegurança para entrar no círculo e compor as engrenagens da ciranda poética, como um veículo mágico que permite transitar por vários espaços ao mesmo tempo, ocupar lugares que são e/ou que deveriam ser de tod@s. Ela aponta para o que está oculto/silenciado e/ou abre caminhos que precisam ser descobertos/contemplados. Constata-se que a poesia torna-se parte essencial da vida, com quem é possível confidenciar as dores e as alegrias, estabelecer uma relação amorosa que espalha sementes, pois “ser invisível não basta/preciso penetrar no impenetrável/e de lá fazer o necessário./[...] cega de sentidos/religo os pontos/dessa infantil brincadeira” (TIMM, 2021, p. 130). Aqui nos reportamos ao olhar crianceiro tão trabalhado na produção do poeta mato-grossense Manoel de Barros, ou a ver as coisas sempre como se estivesse contemplando pela primeira vez, como diria Fernando Pessoa.

A luta é, cada vez mais, necessária e urgente, não podemos retroceder, no entanto, ir avante necessita da força de nós por nós mesmas, no sentido de darmos crédito a essas produções, de juntas legitimarem nossas vozes, rasgar o cerco e conquistar espaço. É preciso nos desafiar todos os dias, na busca incessante do que acreditamos e, ao mesmo tempo, muitas vezes, nem sabemos ainda em que acreditamos, porque a vida não vem feita, é constituída de relações, que surgem todos os dias e nos indagam a todo o momento: quem somos? O que desejamos? Assim, vamos sem data marcada, não sendo... mas, por outro, lado; querendo ser. É desse desejo vivo e fecundo, que tiramos a seiva para nos manter em constante busca por superação dos limites que nos impõem para que outras mulheres possam também ir além, acreditar em si mesmas e vencer alguns obstáculos.

Vale compreender que: “[...] Somos o ventre do mundo/[...]Temos o poder que ousamos suspeitar./[...] Somos Mulheres!/A máquina da criação! Criamos tudo.../E ainda poesia para alegrar nossos dias./E quando nos sobra tempo somos apenas mulheres! (CACAU, 2021, p.171). Essas palavras estão encharcadas da intensa, profunda e específica experiência de mulher porque traz a identidade plural da alma feminina no que ela tem de mais sagrado, o poder inenarrável da gestação - “o mistério da criação habita em nós”, é algo inegável, está intrínseco no corpo da mulher - “a magia da vida”, a fina flor que perfuma todos os corpos - somos únicas e plurais. É desse lugar de mulher que falamos, que poetizamos a vida e, penso que raramente, “somos apenas mulheres!”. Com isto sendo dito, não queremos menosprezar a produção de autoria masculina, muito pelo contrário, mas lutar por equidade, conscientes dessa nossa tarefa ética e moral, lembrando de que, como disse Mário Quintana: “quem faz um poema abre uma janela/Respira, tu que estás numa cela abafada, esse ar que entra por ela,/[...] quem faz um poema salva um afogado”. 

Necessitamos do ar que entra pela janela, poetizado por Mário Quintana e, precisamos também, do vazio de Dilercy Adler (2021, p.75) porque a poesia nasce de vazios preenchidos por significações líricas que surpreendem e permitem o vi/ver que há uma mágica fusão do eu com o tu, aberta a um mundo alheio à racionalidade porque faz sonhar, caminha pelo campo da subjetividade: “cheio de ausências/e de lágrimas sentidas”. Ou ainda porque é urgente uma “Polinização por afeto [com a qual] nos meus poros/Quando tu depositas tuas estimas/Germinam-se jardins” (IANCOSKI, 2021, p.123). Portanto, “livrai-nos da crença cega/nenhuma figueira nasce cega” (GERMANO, 2021, p. 170).

Se formos à pesquisa sobre a produção feminina podemos constatar que esta surgiu de um parto bastante moroso e complexo. Ao ouvirmos as autoras da coletânea, o processo de autoria, da maioria dessas mulheres, também foi uma gestação, muitas conviveram com seus escritos por muito tempo antes de vir a publicá-los, ouvindo-as lembrei-me das palavras de Carlos Drummond de Andrade: “não forces o poema a desprender-se do limbo./não colhas no chão o poema que se perdeu./não adules o poema./aceita-o/como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada no espaço.

A coletânea: Enluaradas II, pretende coroar um tempo em que se vive o presente correndo por cima dos trilhos, pelas curvas, pelos declives, pelos abismos e pelos precipícios, como Voyeur das nuances da paisagem porque gosta é da vertigem (DIPP, 2021, p. 142), pois: “Assim, enquanto sou/encontro a mim e ao que me toca/às margens sinuosas deste rio” (BAUMGARTEN, 2021, p. 140). A vida constitui o rio que somos, portanto, “[...] Aquilo que flor, arco-íris/eu serei, nos hiatos, majestade!” (RABELLO, 2021, p. 135). “e pelas chagas das minhas mãos/passam mensagens do futuro” (SAVIO, 2021, p. 132).

A palavra não tem destinatário certo e não pode estar restrita apenas a um emissor, somos plurais e, portanto, também produzimos sentidos plurais sobre o que vemos, lemos, ouvimos e sentimos. Conceitos e afirmações são movediços e precisamos descobrir que: “As estrelas e mariposas/brilham cada uma, do seu jeito/ E eu, poeto a alma da noite/aqui, no lago do meu leito” (MARY, 2021, p.100), pois “viver entre palavras era/[é] a única boia nesse mar de incertezas” (SAVIO, 2021, p. 131). Não somos nós quem degustamos das palavras, são elas quem nos queimam a pele:

 

Corpo nu

 [Marta Cortezão]

Tateio o corpo nu da palavra

buscando tua bronzeada tez...

na solitária barca noturna

de sonhos e tolos devaneios

esfrego-me no verbo amar

com sede de conjugações carnais

sucumbo no sexo das palavras...

oh! A língua de Camões me abrasa

o âmago profundo do prazer

sêmen(te) que embriaga

quando goteja fecunda

e explode no branco do papel:

orgia poética de palavras!

 

Essa dimensão erótica e sedutora da relação do eu-poemático com as palavras nos reporta ao poema Sedução da Adélia Prado: “A poesia me pega com sua roda dentada/[...] Me abraça detrás do muro, levanta/ a saia pra eu ver, amorosa e doida”. Assim ressalto, tal qual Adélia, que a poesia é hermafrodita e, estas que compõem a Coletânea Enluaradas II são escritas por mulheres e desejam ser fecundadas por todos, para que juntas, possam romper com o silêncio, subir no palco, protagonizar histórias, virar os holofotes e desafiar a lógica social.

Permanece, tanto no poema de Marta Cortezão, quanto em muitas outras páginas da coletânea, a possível relação entre o eu e o tu, imagens que, de certa forma, conduz ao fortalecimento de uma identidade po-ética e plural, capaz de germinar outras. Portanto, “[...] respira fundo e voa/que o teu limite é infinito/ que o teu coração é o mar” (MONTEJANO, 2021, p.147) e “há sempre o que se ganhar/ao paralisada não ficar” (LIMA, 2021, p. 146). Afinal, “[...] talvez, em um futuro/ distante, alguém compreenda que a beleza/é um espelho de muitas faces” (VELOSO, 2021, p. 101).

A obra em destaque apresenta a poética de mulheres, com “desejos e feituras/que alimentam a fome” (NASCIMENTO, 2021, p. 88), no sentido de que são versos carregados de levezas que miram o recomeço (LAGO, 2021, p. 86), a busca incessante por equidade, por solidariedade, por empatia e/ou surgem na ânsia de que percebam as “insignificâncias a desfilarem/ nos dias de chuva” (QUEIROZ, 2021, p. 181) e/ou “os versos curadores/curandeiros de mim” (ALMEIDA, 2021, p.168) que nos apontam que “[...] entre os espaços das paredes, lagartas e feras se entranham/A algumas damos lábios. A outras, mistério./Mulher, quando nos cingimos entre paredes,/a larva dá voo à palavra, onde nos reconhecemos” (GERMANO, 2021, p. 169). E, assim, podemos deixar “pegadas perfumadas com cheiro de absinto” (MOTA, 2021, p. 89) porque “no silêncio e nas palavras,/a mensagem grita” (CLARES, 2021, p. 201).

Finalizo, por ora, ressaltando que estamos nessas páginas, mulheres, porque ousamos nos levantar dos abismos em forma de poemas. Mulheres gostam de coisas profundas, “E no agora com uma legião de deusas/ cirandamos como aves bailarinas/guiadas pela luz dessa galáxia menina” (MANACÁ, 2021, p. 121.) porque “na passagem de um estado/para outro [nos desenhamos, juntas, imortais] (LOPES, 2021, p. 56) e “carregamos em nossas vidas/a imensidão dos belos tecidos (ALVES, 2021, p. 192).






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